Nas vésperas de a Grécia começar a aplicar o programa definido entre a UE e Ancara e começar a reenviar refugiados para a Turquia, há registos de manifestações, violência e motins por parte daqueles que recusam voltar atrás. A partir de segunda-feira a Grécia vai reenviar um refugiado para a Turquia por cada um que um país da União Europeia receber.

Esta nova política não está a ser bem recebida pelos próprios refugiados, por várias ONG e até pelas Nações Unidas.

Turquia e Grécia: “Falhas graves nos dois países”, diz o ACNUR

O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) suspendeu os seus trabalhos nos antigos centros de registo de refugiados — que entretanto se transformaram em campos de detenção — evocando “a sua política global de promover alternativas à detenção”. O ACNUR apelou ainda a que as “partes do recente acordo entre a União Europeia e a Turquia sobre refugiados e migrantes garantissem que todas as condições estão asseguradas antes de quaisquer reenvios serem feitos”, dizendo que há “falhas graves nos dois países”.

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A Amnistia Internacional (AI) também criticou a medida aplicada a partir de segunda-feira. “Na sua desesperada impaciência de bloquearem as fronteiras, os dirigentes da UE ignoraram intencionalmente o mais simples dos factos: a Turquia não é um país seguro para os refugiados sírios e torna-se cada vez menos em cada dia que passa”, considerou John Dalhuisen, diretor da AI para a Europa. Em declarações à AFP, o investigador da AI em Istambul Andrew Gardner acusou a Turquia de estar a reenviar refugiados para a Síria. “Por exemplo, três crianças de menos de 12 anos, que brincavam num parque, foram detidas e reenviadas com o seu tio, deixando na Turquia o seu pai e a sua mãe”, disse. Ancara negou: “As alegações não refletem, de todo, a realidade.”

Protestos de refugiados fazem feridos na Grécia

No sábado, cerca de 300 requerentes de asilo fugiram de um centro de detenção (os centros de registo passaram a servir como sítio para deter refugiados) na ilha grega de Chios, situada a apenas sete quilómetros da costa turca. Os relatos na imprensa grega referem que o edifício está sobrelotado. Os refugiados, incluindo mulheres e crianças, conseguiram escapulir-se pelo arame farpado que circunda aquele centro de detenção e caminharam em direção ao porto.

Antes disso, na quinta-feira, houve confrontos no centro de detenção de Chios entre refugiados sírios e afegãos, resultando em 10 feridos ligeiros. A polícia usou petardos para dispersar a multidão, causando ferimentos nalguns dos refugiados.

Esta semana também foram registados três esfaqueamentos numa manifestação de refugiados na ilha de Samos e oito feridos num protesto no porto de Pireu, próximo da capital grega.

Números oficiais referem que neste fim de semana há 52.147 refugiados ou requerentes de asilo na Grécia. Em 2015, mais de 850 mil dos 1,1 milhões de refugiados que chegaram à Europa passaram pela Grécia.

Em 2016, os números já apontam para que tenham chegado 151.104 refugiados à Grécia vindos pelo mar a partir da Turquia. Desde que foi anunciado o acordo entre a UE e a Turquia, a 20 de março, o número de pessoas a chegar por esta via diminuiu. Por outro lado, subiram as ocorrências de pessoas que chegam à Europa por Itália, a maior parte partindo da costa da Líbia. Em 2016 já foram 18.784 e o ministro do Interior da Alemanha, Thomas de Maizière, já admite a aplicação de um programa entre a UE e os países do norte de África semelhante àquele firmado com a Turquia.

Governo grego: “Pessoas desesperadas têm tendência a serem violentas”

“Estamos à espera de violência. As pessoas em situação de desespero têm uma tendência a serem violentas”, disse ao Observer o porta-voz para assuntos migratórios do governo grego, Giorgos Kyritsis, que ainda assim defende o acordo firmado entre a UE e a Turquia a 20 de março. “A filosofia do artigo é a de prevenir o tráfico de seres humanos [para a Europa] a partir da costa turca, mas vai ser muito difícil e vamos ter de fazer uma abordagem suave. Estas pessoas fugiram de uma guerra, não são criminosos.”

O Governo grego queixa-se da falta de meios para dar resposta ao fluxo sem precedentes de refugiados que chegam vindos da Síria, do Iraque e de outros países em confronto. Kyritsis aponta o dedo aos restantes países da União Europeia, que prometeram enviar 2.300 agentes para facilitar a tarefa mas que só tinham enviado 200 até então. Entretanto, Portugal enviou 34 peritos do SEF para o local.

“Ainda estamos à espera dos peritos e dos tradutores que eles disseram que iam mandar”, disse o porta-voz grego ao Observer. “Até o pessoal da Frontex [agência europeia de controlo de fronteiras] ainda não chegou cá.”