Quem evitou as sanções? Mais Europa ou menos Europa? Europa fechada ou aberta, Europa federalista ou não? O CDS quer “clarificações” e por isso convidou o comissário europeu Carlos Moedas para, juntamente com o eurodeputado Nuno Melo, abrir esta quinta-feira à noite a Escola de Quadros do CDS, que junta até domingo, em Peniche, cerca de 130 jovens democratas-cristãos de todo o país. Nuno Melo sugeriu que o comissário abrisse a porta dos bastidores para explicar quem é que afinal evitou as sanções por défice excessivo, mas Moedas não viria a revelar nada.

“Se hoje não há sanções não é por mérito ou esforço de António Costa, que em seis meses tem feito tudo para justificar as sanções. É porque os partidos no PPE, e o comissário Carlos Moedas, se bateram contra as sanções”, disse o eurodeputado, lembrando que outros países, como a França e a Alemanha, também registaram em 2015 défices superiores a 3%. Para o eurodeputado centrista foi apenas por causa do atual governo, “que quebrou os compromissos e deu palco a uma esquerda que era apenas de protesto” que Bruxelas quis penalizar o país. “A questão das sanções não se colocava quando governávamos”, disse ainda, afirmando que se houve pessoa que conseguiu evitar as sanções não foi António Costa.

A pior sanção que poderíamos ter era que, pela quarta vez na história deste país pela mão dos socialistas, voltássemos a ter um resgate em Portugal”, disse Nuno Melo.

O debate era sobre o futuro da Europa e serviu também para Nuno Melo — que antes de Assunção Cristas ter sido eleita líder do partido era apontado como um dos presumíveis sucessores de Paulo Portas –, endurecer o discurso sobre a Europa, e o caminho que deve percorrer: se no sentido “mais Europa”, se “menos Europa”. Numa altura em que a Europa atravessa os desafios do extremismo e da saída de países da União, Nuno Melo assumiu-se como um anti-federalista convicto.

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“Menos Europa não significa não ser europeísta, eu sou profundamente europeísta, não sou é federalista”, disse, num discurso onde sublinhou mais o que separa os vários Estados (língua, religião, geoestratégia) do que o que os une. Mas nisto, ao contrário da concórdia e troca de elogios que reinou em todo o debate, Moedas não concordou inteiramente. “Não sei se a Europa daqui a 50 anos será uma federação, mas é a diversidade da Europa que faz com que seja boa nomeadamente para a inovação, para a ciência”, disse, sublinhando que “é muito mais difícil estar num grupo com pessoas diferentes, com línguas diferentes, do que todas iguais. Mas, quando funciona, a Europa tem uma força extraordinária”.

Moedas três em linha: PSD de manhã, Governo à tarde, CDS à noite

Antes de chegar a Peniche, o comissário europeu Carlos Moedas, que foi secretário de Estado-adjunto do primeiro-ministro no Governo de Passos Coelho, já tinha estado a percorrer o país e os partidos (quase) de uma ponta à outra. De manhã, foi o “professor” de uma aula sobre as oportunidades da Europa digital na Universidade de Verão do PSD, em Castelo de Vide. Ao meio dia partiu para Lisboa, onde se reuniu com o primeiro-ministro António Costa, em São Bento, e às 20h30 já estava em Peniche para outra “aula”, desta vez com os jovens do CDS na plateia.

Moedas fez questão de agradecer o convite aos “amigos” do CDS, nomeadamente ao “amigo” Nuno Melo, que “é do CDS mas que defende Portugal [em Bruxelas] todos os dias”. Os elogios foram mútuos, com Nuno Melo a elogiar Carlos Moedas por ter sido o principal rosto a “bater-se contra as sanções” em Bruxelas. “É uma sorte e um privilégio ter um comissário como o Carlos Moedas. É um em 10 milhões e agora representa os 500 milhões da União Europeia”, retribuiu.

No início do dia, Carlos Moedas já tinha estado em Castelo de Vide, a dar uma “aula” sobre Europa Digital aos jovens sociais-democratas, onde defendeu uma Europa cada vez mais “aberta” e mais forte, que reme contra as forças “populistas”, “extremistas” e a visão “protecionista” que cada vez mais ganham terreno em solo europeu. E não foi só o eurodeputado Nuno Melo que, pela hora do jantar, mereceu elogios do comissário. Da parte da manhã já o eurodeputado social-democrata Carlos Coelho tinha recebido uma palavra elogiosa de Moedas, que o classificou como um dos nomes fortes de Portugal na Europa, a par do socialista António Vitorino.

Já depois de os jovens sociais-democratas terem arrumado os livros — em Castelo de Vide — Moedas falou aos jornalistas sobre a eventual suspensão dos fundos comunitários a Portugal, que começa a ser discutida em Bruxelas este mês. E pressionou o Governo: basta cumprir as metas para tudo correr bem. “Se Portugal continuar a cumprir em termos de orçamento, em termos de número, isso não será uma questão”, disse, deixando também uma mensagem positiva. “A missão da Comissão Europeia é ajudar os países e estar sempre ao lado dos países para que tudo possa correr bem. E Portugal merece que tudo corra bem”, sublinhou, antes de se fazer à estrada porque ainda tinha uma paragem em Lisboa — que não estava na sua agenda pública.

Era precisamente uma paragem em São Bento, para uma reunião com o primeiro-ministro. Foi António Costa que deu conta do encontro no Instagram: “No fim de uma reunião de trabalho com o Comissário Europeu Carlos Moedas. Queremos continuar o bom relacionamento e colaboração com a Comissão Europeia“, escreveu na legenda que acompanhava a fotografia.

Ao Observador, o dirigente centrista e diretor da Escola de Quadros do CDS, Diogo Feio, esclareceu que soube da dupla presença de Carlos Moedas no evento do PSD e do CDS no momento em que fez o convite ao comissário, afastando daí qualquer problema. “Não é por ter sido convidado [para a Universidade de Verão do PSD] que deixaríamos de o querer aqui”, disse.

Certo é que, quebrada a coligação entre CDS e PSD, os dois partidos aparecem nesta rentrée política sem conseguirem acertar o passo. A par da partilha de um convidado nas suas escolas de verão, é a primeira vez que o evento do PSD e o evento do CDS coincidem no calendário. Ambos se realizam esta semana, com data de encerramento marcada para domingo. A coincidência não agrada aos centristas, que terão assim de partilhar a visibilidade mediática com o PSD. “Nós sempre fizemos a Escola de Quadros no primeiro fim de semana de setembro”, diz ao Observador Diogo Feio, sublinhando que o calendário da Universidade de Verão do PSD é que não é fixo. O cenário agrava-se no domingo, já que tanto Assunção Cristas como Pedro Passos Coelho têm discursos marcados para a mesma hora.