Em pouco mais de 24 horas o PSD passou do oito para o oitenta: de acabar com os cortes nas subvenções dos partidos e fazer regressar, já no próximo ano, os 10% retirados em 2013, para avançar já com uma proposta para os tornar permanentes. No PS, também havia uma posição pública favorável à reposição, mas já se admite que a discussão tenha lugar, desde que fora do Orçamento do Estado. Até porque aí não há vontade de ter mais exercícios de equilibrismo do que os já necessários entre PS, PCP e BE. É que os dois partidos à esquerda do PS são contra o fim da austeridade para os partidos nesta altura. E o CDS também.

A sensibilidade do tema e o impacto junto da opinião pública que poderia ter uma reposição de rendimento os partidos ao mesmo tempo em que se fala de novos impostos, desencadeou uma sucessão de declarações ao longo desta quinta-feira, com o dia a acabar bem diferente do que tinha começado.

21 de setembro

O jornal Público noticia a vontade do PSD em acabar com os cortes de 10%, instituídos em 2013, às subvenções públicas recebidas pelos partidos. E até cita o secretário-geral do partido, Matos Rosa, que é claro: “Os partidos não estão de fora do princípio que é a restituição dos rendimentos, senão transformavam-se os cortes temporários em permanentes. Chegou a hora de devolver os rendimentos também aos partidos“.

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A TSF fez a mesma pergunta ao responsável financeiro do PS, Luís Patrão, que foi igualmente claro: “Se a lei prevê determinada subvenção para os partidos políticos, ela deve ser praticada, exceto em caso de situação de crise. Foi essa situação de crise que foi resolvida. Estamos em condições não de aumentar os partidos mas de lhes voltar a dar aquilo que a lei prevê“.

Conclusão deste dia: o bloco central concordava finalmente num ponto que passava por repor aos partidos a parte da subvenção que tinha sido cortada — no caso do PSD e PS isso significaria um valor à volta de meio milhão de euros, por ano. Bloco de Esquerda, PCP e CDS estavam contra e admitiam avançar com uma proposta para manter o corte no próximo Orçamento do Estado.

22 de setembro

13h00 – Carlos César sai da reunião do grupo parlamentar do PS e, confrontado pelos jornalistas, diz que a matéria das subvenções não tinha sido tratada no encontro dos deputados. “A questão ainda não está em cima da mesa, mas sobre ela seguramente teremos de decidir”.

15h45 – Catarina Martins aproveita o debate quinzenal para confrontar António Costa a dizer se “acompanhava” a posição do BE, contrária ao fim dos cortes para os partidos: “Acho muito difícil explicar ao país que pode haver devolução de financiamento aos partidos quando ainda temos muita gente a viver com tão pouco”.

16h00 – O líder socialista e primeiro-ministro respondia parcialmente, prometendo considerar rever o financiamento dos partidos para campanhas eleitorais. Já sobre as subvenções, o socialista chutou para canto ao dizer que “a democracia não vive sem partidos”, “o debate deve ser feito sem demagogia e com seriedade” e “o custo da democracia não é um peso”. Indiciava não concordar com a manutenção dos cortes, tal como tinha indicado no dia anterior o seu secretário nacional para os assuntos financeiros.

17h30António Filipe dizia nos Passos Perdidos (no Parlamento) que o PCP estava contra “qualquer aumento às subvenções dos partidos no Orçamento do Estado”, porque “os partidos não devem depender do Estado mas do esforço dos militantes” e o “poder de compra dos portugueses ainda não foi totalmente reposto”.

17h45 – Luís Montenegro convoca os jornalistas para uma declaração à porta do grupo parlamentar do PSD para dizer que a posição do partido é “simples”: o corte de 10% que vigora para a subvenção dos partidos e das campanhas eleitorais foi pensado para vigorar até ao final deste ano. Caso a Assembleia da República queira tornar este corte “temporário” em “permanente”, então é preciso alterar a lei de financiamento dos partidos. “Se a Assembleia da República tiver interesse em fazer deste corte temporário um corte permanente não é introduzir uma norma no Orçamento, é mudar a lei. Estamos abertos a fazer esse debate”, disse. Comentava a forma, mas evitava comprometer-se com o conteúdo, ficando apenas pela admissão da discussão, mas fora do Orçamento. A esta hora ainda valia a declaração de Matos Rosa do dia anterior ao Público. Montenegro ainda dizia que sozinho não podia fazer muito, por precisar dos votos do PS e dizia aos jornalistas: “Perguntem ao PS”.

18h05Carlos César, que de manhã atirava a questão para as calendas, é forçado a entrar no debate e, no corredor do Parlamento, dá um passo para o lado: podia-se discutir o assunto, mas fora do Orçamento do Estado. O PS admite “refletir” sobre o financiamento partidário mas no âmbito da Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas, que os socialistas propuseram e que tem estado a funcionar no Parlamento. A Comissão tinha até outubro para chegar a conclusões sobre matérias na área das incompatibilidades, lobbying, enriquecimento injustificado. Mas o prazo pode vir a ser prolongado, por causa da interrupção do funcionamento da Assembleia da República no período de discussão do Orçamento do Estado (que vai durar até final de novembro).

Mas o qual é a posição do PS sobre o conteúdo propriamente dito? Os cortes são para manter? Será esse o ponto de partida do PS neste debate? Carlos César só garantiu não estar a desmentir Luís Patrão, que tinha dito haver condições para retirar os cortes. “Não venho desmentir ninguém, o que eu vim dizer é que esta reflexão será centrada no âmbito dos trabalhos da comissão eventual”. Ou seja, não respondia à pergunta e de várias formas: “O ponto de partida do PS para essa reflexão é refletir justamente sobre esse tema e ter em consideração as opiniões que são colocadas, o momento do país e o valor que devemos ou não atribuir aos partidos políticos na democracia”.

20h45 – O PSD envia um comunicado às redações, assinado pelo mesmo Matos Rosa que, no dia anterior, tinha dito ser “hora de devolver os rendimentos também aos partidos”. “O PSD esclarece que não se revê na posição tornada pública pelo Partido Socialista”. Qual? Discordava de passar o debate para a comissão eventual? Não. Agora o PSD já queria tornar os cortes permanentes. “Os partidos políticos devem ser os primeiros a reconhecer a realidade e atuar em função da sociedade em que estão integrados”. Era isto que dizia o comunicado que anunciou a alteração à lei dos financiamentos dos partidos para tornar permanentes o corte de 10% nas subvenções e de 20% nas campanhas eleitorais.