Vasco de Mello, 67 anos, é: bisneto de Alfredo da Silva, filho de José Manuel de Mello, herdeiro da CUF (um dos maiores impérios industriais do Estado Novo), presidente da Brisa e da José de Mello, e ainda da Business Roundtable Portugal, associação que junta as 40 maiores empresas portuguesas. Seja pelos cargos, pela fortuna, pela influência, mas sobretudo pelo apelido da família, tem tudo para ser um dos alvos predilectos de Mariana Mortágua, líder do Bloco de Esquerda, que esta semana falou em campanha nos “rios de dinheiro que correm de cofres milionários” para partidos como o Chega e a Iniciativa Liberal.

Depois de esta quarta-feira ter recebido, enquanto presidente da Business Roundtable, uma comitiva da Iniciativa Liberal liderada por Rui Rocha ao lado do ex-líder João Cotrim de Figueiredo, Vasco de Mello respondeu indiretamente à coordenadora bloquista, sem a nomear, e à forma como o financiamento partidário é usado como arma de arremesso político: “Faz muito pouco sentido. Há uma lei de financiamento dos partidos, que tem de ser cumprida. Sendo cumprida, é transparente e clara. Os apoios que qualquer cidadão possa dar ao partido que apoia são aceitáveis e justificáveis. Não tem de haver nenhuma preocupação nem ser objeto de ataque político.”

“A contribuição de cidadãos para a vida dos partidos é algo perfeitamente justificado”

Em declarações ao Observador, o empresário preferiu não revelar se tinha contribuído pessoalmente para algum partido nesta campanha: “Não vou responder a essa pergunta. Considero que a contribuição de cidadãos para a vida dos partidos é algo perfeitamente justificado.” Apesar de a informação vir a ser conhecida através do Tribunal de Contas, Vasco de Mello preferiu não desvendar para já. E tentou desvalorizar o tema: “Não me sinto incomodado pessoalmente. A batalha política leva a que se utilizem argumentos que não fazem muito sentido. Existe uma lei, a lei é cumprida e tem de ser vigiada.“

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O argumento é semelhante ao que foi usado no domingo por Rui Rocha, que também invocou a lei para responder ao ataque do Bloco, acusando o partido de Mariana Mortágua de difundir “imputações completamente falsas”.

O encontro entre a Iniciativa Liberal e Vasco de Mello surgiu por convite da Business Roundtable, que desafiou ainda PS e AD, por entender que são “os que defendem uma maior ambição para Portugal, um maior crescimento, e onde a iniciativa privada tenha um papel relevante a desempenhar.”

Criação de riqueza, diminuição de burocracia e retenção dos jovens: “Não nos conformamos”

A associação das 40 maiores empresas portuguesas é “apartidária”, frisa Vasco de Mello, que recusa tomar posição sobre os programas eleitorais dos partidos em concreto, mas fica contente por vários dos temas que suscita estarem contemplados nas agendas de vários políticos. (A título pessoal, o presidente da Brisa também não tenciona tomar nenhuma posição pública de apoio a um partido).

O empresário põe o foco no crescimento económico e na criação de riqueza: “Não nos conformamos com um país que cresce em duas décadas menos de 1%.“; na diminuição da burocracia e num funcionamento mais eficaz da justiça; e na atração e retenção de talento: “Não nos conformarmos com a saída dos nossos jovens para o exterior. Está muito ligado também ao tema do custo para as empresas para contratar essas pessoas. Aquilo que recebem líquido é um aspeto primordial”. Nem de propósito, horas antes Rui Rocha tinha estado a usar um tablet com um simulador, numa arruada no Saldanha, para mostrar a um jovem quanto receberia de salário líquido com as propostas da Iniciativa Liberal. Mas todos os outros temas e expressões usadas por Vasco de Mello já foram ouvidas a Rui Rocha nesta campanha de forma bastante vívida.

A Iniciativa Liberal foi para já o único partido a aceitar o desafio de Vasco de Mello para uma reunião. Apesar dos baixos números do crescimento nos últimos anos, Vasco de Mello justifica o convite ao PS: “O PS é um partido de governo, governou Portugal em 20 dos últimos 29 anos e é um partido com quem a Business Roundtable Portugal não podia nunca deixar de falar” — isto já é algo que mais dificilmente ouviríamos Rui Rocha dizer.