A administração da Televisão Pública de Angola (TPA) classificou esta sexta-feira como “leonino e de caráter abusivo” o contrato que vigorou até final de 2017, com empresas de dois filhos do ex-Presidente angolano, para gestão do canal 2.

Em comunicado a que a Lusa teve acesso, o novo conselho de administração da televisão pública, nomeado pelo chefe de Estado, João Lourenço, critica a forma como os contratos, que classifica como “altamente danosos”, com a Semba Comunicação e Westside Investiments, foram implementados desde 2007, envolvendo, além da gestão da TPA 2, também o canal internacional.

Apenas de acordo com os contratos a que tivemos acesso, assinados entre a Westside/Semba, a TPA e o Ministério da Comunicação Social, e renovados em 2014, o total dos pagamentos por ano efetuados pelo Estado àquelas empresas privadas ascendiam aos 17.580.000 de dólares [14,8 milhões de euros]”, lê-se no comunicado, em que a administração da televisão pública crítica “declarações despropositadas” que nos últimos dias se têm “multiplicado”, sobre o contrato de gestão da TPA 2.

A Semba Comunicação tem como sócios os irmãos Welwitschea ‘Tchizé’ e José Paulino dos Santos ‘Coreon Du’, filhos de José Eduardo dos Santos, que deixou o poder em setembro, ao fim de 38 anos. “Apenas a título de exemplo, refira-se que uma das cláusulas do contrato referente à TPA 2 obrigava o Estado a adjudicar o canal 2 da TPA à Westside Investiments SA, por ajuste direto, em caso de privatização do mesmo”, afirma a administração da TPA, liderada desde novembro por José Fernando Gonçalves Guerreiro.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Desde o início de janeiro que a gestão do canal 2 retornou à TPA, com uma grelha provisória que tem sido fortemente criticada pela opinião pública e nas redes sociais, face à alegada falta de qualidade. Na quarta-feira, em comunicado enviado à Lusa, a administração da Semba esclareceu que no âmbito do “acordo comercial de parceria” entre TPA e a empresa privada Westside Investments, a Semba Comunicação “foi contratada pela segunda”, por 50 milhões de kwanzas (250 mil euros, à taxa de câmbio atual) mensais.

O contrato, que foi rescindido a 15 de novembro de 2017, por orientação do novo Presidente angolano, João Lourenço, envolvia “prestar serviços técnicos de produção de conteúdos, gestão de grelha, assistência técnica e formação de quadro”, o que a Semba Comunicação afirma representar “cerca de um décimo, comparativamente ao orçamento mensal da TPA”, que operam os dois canais nacionais e um internacional.

A Semba Comunicação assumia desde 2007 a gestão do canal 2 da TPA, por ajuste direto, sem concurso público, por — explicou ‘Tchizé’ dos Santos na quinta-feira, em entrevista à Lusa, –, a empresa pública de televisão ter uma gestão autónoma e como decorria do enquadramento legal vigente até 2013, quando foi aprovada a lei dos contratos públicos.

Além de referir que os pagamentos às duas empresas procediam de “diversas fontes”, a administração da TPA refere que “obrigava-se a pagar a prestação de outros serviços e custos operacionais e de exploração, incluindo o salário dos seus trabalhadores, colocados à disposição daquelas empresas privadas”, bem como o “aluguer de meios, tais como o carro de exteriores alegadamente pago pelas mesmas”.

Sem que constasse do contrato, a Westside dispôs, por vários anos, de um estúdio moderno de 1.200 metros quadrados, entregue, virgem, para exploração pela Semba, totalmente equipado com a mais moderna tecnologia, sem que para tal tenha feito qualquer pagamento”, denuncia ainda a administração da TPA, entre “outras facilidades”.

Acrescenta que a TPA “sempre assumiu as suas obrigações, apesar do caráter leonino e abusivo dos contratos em causa” e que “em contrapartida”, a programação oferecida pelo canal 2 e pelo canal Internacional “revelou-se de qualidade altamente duvidosa”, sendo alvo de “críticas e reclamações de amplos setores da sociedade em Angola e na diáspora”.

“Como consequência”, recorda, a TPA 2 quedou-se em 2017 “num medíocre 7.º lugar no ranking de audiências”, justificando o cancelamento dos contratos com as duas empresas, “em defesa dos interesses dos contribuintes e da sociedade em geral”.