O corte de 5% nos vencimentos de membros dos gabinetes políticos vai deixar de se aplicar. A medida de eliminação te efeitos a partir de 1 de janeiro deste ano e deverá ser progressiva até ao final de 2019, de acordo com a versão preliminar do decreto-lei de execução orçamental a que o jornal Público teve acesso e divulga esta quinta-feira. Além dos gabinetes políticos, também as empresas públicas saem beneficiadas desta nova lei. Isto porque o mesmo documento prevê ainda o fim das restrições a prémios de gestão nas empresas públicas e aos aumentos salariais nas chefias intermédias.

Esta decisão acaba assim com uma medida de restrição orçamental que estava a ser aplicada aos elementos das Casas Civil e Militar da Presidência da República, dos gabinetes dos membros do Governo, dos gabinetes dos governos regionais ou dos gabinetes de apoio pessoal dos presidentes e dos vereadores das câmaras municipais desde 2010. O corte foi alargado meses depois aos membros do gabinete do presidente da Assembleia da República, do gabinete do primeiro-ministro e do secretário-geral do Parlamento, que também deverão beneficiar desta reversão.

CDS totalmente contra…

A medida, contudo, não está a ser recebida da mesma forma entre os partidos. O líder parlamentar do CDS-PP, Nuno Magalhães, considera contraditório, imoral e irresponsável que o Governo ponha fim aos cortes salariais de 5% nos gabinetes dos políticos, como declarou no final de uma conferência de imprensa no Parlamento, de apresentação do projeto alternativo do CDS ao Programa Nacional de Reformas.

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“Penso que é contraditório, é imoral, é irresponsável e creio que os portugueses não conseguem compreender que, de um lado o Governo corte com as cativações que faz, corte no serviço público que presta aos portugueses e, ao mesmo tempo, o que se lembra de fazer é repor os cortes do ‘staff’ político”, defendeu Nuno Magalhães. “Não é uma questão populista nem demagógica, é, uma questão do ponto de vista, democrático, de higiene política”, reforçou.

Nuno Magalhães contestou essa reposição “num momento em que os portugueses pagam o maior peso de impostos na gasolina da Europa, no momento em que se assiste a cortes profundíssimos na saúde, com casos como o do hospital de São João, em que os transportes estão como estão, em que os polícias desesperam e se juntam a militares em ameaças de vigílias, no momento em que a educação está como está, em que escolas fecham por falta de pessoal auxiliar”.

…BE pede explicações

Para o Bloco de Esquerda, mais cauteloso, o fim do corte de 5% nos salários dos funcionários de gabinetes de políticos “carece de explicações”. O deputado e líder parlamentar do partido, Pedro Filipe Soares, garantiu que não teve conhecimento do documento e que não entende a medida. “A ser verdadeira a notícia, é estranha”, disse à TSF.

PS contra o populismo

O PS defendeu o fim gradual dos cortes salariais aplicados aos membros de gabinetes políticos, considerando que a reposição de vencimentos deve abranger todos os trabalhadores na esfera do setor público, e demarcou-se de perspetivas populistas. Estas posições sobre a medida do Governo foram transmitidas aos jornalistas pelo vice-presidente da bancada socialista Pedro Delgado Alves no final da reunião semanal do Grupo Parlamentar do PS.

De acordo com Pedro Delgado Alves, ao longo dos últimos anos “têm sido implementadas pelo Governo medidas de reversão de cortes salariais que estavam associadas à situação extraordinária em que Portugal se encontrava”.

“Obviamente, esses membros de gabinetes trabalham, recebem uma remuneração ao final do mês e, havendo uma política generalizada de reversão [de cortes salariais], essa medida de reposição deve ser entendida neste mesmo contexto”, alegou.

Para o vice-presidente da bancada socialista, o Governo está também nesta situação específica “a proteger rendimentos do trabalho”, estando-se “a falar de trabalhadores dependentes”.

“Exercem funções em gabinetes do Governo ou de autarcas, mas não é por isso que não se deve reconhecer-lhes a aplicação do princípio de valorização dos seus rendimentos”, completou o dirigente do PS.

Confrontado com a crítica do BE sobre a alegada prioridade atribuída pelo executivo socialista à reposição salarial de membros de gabinetes de políticos, Pedro Delgado Alves recusou que essa prioridade se verifique.

“Só neste momento é que a questão está a ser discutida, não tendo acompanhado o processo de reposição dos outros cortes. Para mais, neste caso, é um corte extraordinário. Mas, está longe de ter sido uma prioridade do Governo e é uma reposição faseada tal como todas as outras”, argumentou ainda o vice-presidente do Grupo Parlamentar socialista.

Perante os jornalistas, Pedro Delgado Alves admitiu que a qualificação de “populismo” às críticas que têm sido feitas contra esta reposição salarial talvez “não esteja totalmente errada”.

“Há que reconhecer que há aqui o toque e a ideia de tudo aquilo que esteja associado à atividade política, necessariamente, tenha de ser anatemizado, o que é um mau princípio. Os membros dos gabinetes políticos são ou não pessoas que trabalham e que viram os seus rendimentos objeto de restrição até por duas vezes?”, questionou o dirigente socialista.

Pedro Delgado Alves frisou depois que estes trabalhadores foram alvo de corte geral de 10% e também de um anterior de 5%.

“Havendo a possibilidade de se fazer reposição remuneratória, ela deve fazer-se, como se fez em relação a todas as outras pessoas que têm rendimentos de trabalho dependente”, acrescentou.

E PSD contradiz-se: Rio concorda, Negrão discorda

Já o PSD concorda, em princípio, com a pretensão do Governo de pôr fim aos cortes salariais de 5% nos gabinetes dos políticos — ou, pelo menos, Rui Rio.

O líder social-democrata, que garante também que não foi informado previamente pelo Governo sobre esta pretensão, comentou em declarações aos jornalistas que “se a política do Governo foi acabar com todos os cortes, não tenho nada a opor a que se acabem com todos os cortes mesmo”, afirmou Rui Rio, na sede do PSD, em Lisboa, no final de uma reunião com a Ordem dos Enfermeiros, integrada numa série dedicada pelo líder social-democrata aos problemas da saúde.

Uma opinião diferente da que Fernando Negrão, líder da bancada parlamentar do PSD, defendeu esta manhã no Parlamento, em que se mostrou contrário à medida.

“Eu vejo isso com preocupação, a despesa pública é que deve estar controlada, o primeiro a dar o exemplo deve ser o Governo, e portanto discordamos profundamente dessa medida. O Governo nos últimos anos funcionou com esse corte, podia continuar a funcionar assim”, defendeu Fernando Negrão, questionado pelos jornalistas no final da reunião do grupo parlamentar do PSD sobre a notícia de hoje do jornal Público.

Confrontado com declarações do presidente do partido, Rui Rio, poucos minutos antes num sentido oposto, Negrão admitiu que, então, pensa “de forma diferente” de Rio.