Pouco mais de dois meses de ter subido ao poder, o governo de Pedro Sánchez começou a cumprir a sua promessa de trasladar ex-terroristas da ETA para o País Basco, naquilo que é uma medida há muito exigida pelas associações dos familiares dos presos daquele grupo separatista e que merece as críticas da direita.

Os presos em questão — Olga Sanz Martín e Javier Moreno Ramajo, condenados a 71 e a 74 anos de prisão, respetivamente — estavam detidos na prisão de Villabona, nas Astúrias, desde 1998. Os dois formam um casal e têm uma filha pequena.

Essencial para esta tomada de decisão foi o afastamento dos dois ex-terroristas da ETA, após terem escrito cartas onde demonstravam o seu arrependimento e pediam desculpas pelos seus atos. De acordo com as autoridades prisionais, os dois reclusos “renunciaram à violência, pediram o perdão das vítimas, pagaram a totalidade da responsabilidade civil derivada do seu crime e demonstraram vontade de colaborar com a justiça e com as restantes autoridades”.

Em 2002, foram condenados por terem planeado o homicídio de dois políticos bascos: Juan María Atutxa, à altura dos crimes conselheiro do Ministério do Interior e mais tarde presidente do parlamento basco eleito pelo Partido Nacionalista Basco; e Carlos Iturgaiz, então presidente do Partido Popular no País Basco.

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De acordo com o El Correo, jornal basco sediado em Bilbao, Olga Sanz Martín será colocada em prisão domiciliária mediante o uso de um dispositivo de vigilância. Já Javier Moreno Ramajo vai poder sair de casa e procurar um emprego.

A 26 de junho, à margem de uma cimeira com Angela Merkel, Pedro Sánchez já tinha admitido esta possibilidade, até agora negada pelos anteriores governos centrais espanhóis. Para o Presidente de Governo, é necessário “normalizar ainda mais a convivência no País Basco” e referiu que “o governo vai trabalhar por essa perspetiva”.

Além de admitir a transferência de ex-terroristas da ETA, Pedro Sánchez já permitiu que políticos presos da Catalunha fossem levados para prisões daquela região

Não foi por acaso que o fez. Na véspera, a 25 de junho, esteve reunido com o presidente do governo regional do País Basco, Iñigo Urkullu, que lhe terá feito a exigência de começarem a ser transferidos para aquela região os presos da ETA.

No início de julho, durante uma visita oficial a Portugal, Pedro Sánchez admitiu também a possibilidade de transferir os políticos presos da Catalunha para prisões daquela região, uma vez que estão, na sua maioria, no Centro Penitenciário de Estremera, a cerca de 100 quilómetros de Madrid. À altura, Pedro Sánchez referiu que não havia nenhuma “implicação política” nesse ato. Dias depois, Oriol Junqueras, Raül Romeva, Jordi Turull e outros políticos independentistas presos preventivamente foram levados para prisões da Catalunha.

O PSOE, que governa desde 2 de junho deste ano, subiu ao poder após conseguir aprovar uma moção de censura que derrubou o governo de Mariano Rajoy e permitiu a Pedro Sánchez substitui-lo no governo de Espanha. A moção de censura foi apoiada pelo PSOE, pelo grupo parlamentar do Unidos Podemos e também por várias forças independentistas — como o Partido Nacionalista Basco, o PdeCAT e a Esquerda Republicana da Catalunha.

Sánchez justifica medida com o fim da ETA, Casado opõe-se

A ETA suspendeu a atividade armada em 2011, declarou o desarmamamento de forma unilateral em 2017 e em 2018 anunciou a sua dissolução total. Neste novo contexto, Pedro Sánchez tem falado a favor de uma nova abordagem a esta questão. “A ETA já não existe. A ETA foi derrotada pela democracia e por isso peço ao conjunto das forças políticas que isto não seja um elemento de divisão, porque foi a democracia que derrotou a ETA”, disse, igualmente em junho.

Ainda assim, as autoridades recusam que este desenvolvimento se trate de uma acercamiento (palavra traduzível para “aproximação” utilizada para referir a transferência de presos para as zonas da sua proveniência e onde estão as suas famílias). No entanto, esta distinção prende-se por questões técnicas: a lei não prevê condições nem requisitos para que seja cumprido um acercamiento e, no caso dos dois ex-terroristas da ETA, há um conjunto de condições a cumprir no tempo que lhes resta de pena de prisão, mesmo que domiciliária.

Esta política conta com a oposição do Partido Popular. O recém-eleito presidente daquele partido, Pablo Casado, está neste momento a fazer uma visita ao País Basco, onde tem sido seguido por alguns manifestantes e opositores daquela região. O périplo pelo País Basco acontece depois de Pablo Casado ter estado reunido pela primeira vez com Pedro Sánchez. Nesse encontro, terá reforçado a sua oposição à transferência dos prisioneiros da ETA para o País Basco.

“Não vamos tolerar [os acercamientos] porque a ETA não tem direito a qualquer benefício, nem antes de ter deixado de matar, nem agora, porque não tiveram a decêcia de sequer ajudar a esclarecer os assassinatos pendentes”, disse.

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