Pode ser o fim de uma dinastia do tráfico de droga na Galiza. Manuel Charlín Gama, o mais antigo barão da droga galego conhecido como “o avô” do narcotráfico naquela região, foi detido esta quarta-feira em conjunto com um dos filhos numa mega operação da Brigada Central de Estupefacientes da polícia espanhola. Charlín, de 85 anos, e Melchor, de 57, eram os dois principais objetivos da missão.

A operação estava relacionada com um carregamento de cocaína de pelo menos duas toneladas e meia que não chegou a desembarcar em Espanha: o barco de transporte, que tinha içada uma bandeira do Panamá, foi capturado pela polícia a 400 milhas dos Açores. De acordo com o El País, para além de Charlín e Melchor foram detidas outras 20 pessoas, incluindo Jacinto Santos Viñas e Jose Andrés Bóveda Ozores, outros dois conhecidos traficantes de droga.

Esta é a quinta detenção de Manuel Charlín Gama, que foi preso pela primeira vez em junho de 1990. Nessa altura, no âmbito da Operação Nécora, o barão da droga foi condenado a 24 anos de prisão. Cumpriu 20. Saiu em 2010 e ficou em liberdade condicional.

Manuel Charlín Gama no momento em que saiu da prisão, em 2010.

Manuel Charlín foi durante décadas o líder do clã familiar que surgiu na Galiza no anos 70 e que resistiu a 20 anos de prisão do cabecilha para depois voltar a tomar o controlo do narcotráfico na região. A larga atividade de Charlín nos negócios ilegais começou em conjunto com o irmão, José Luis, e juntos elevaram o grupo até ao mais alto nível do crime organizado e do tráfico de cocaína e haxixe. Ainda assim, a grande parte da fortuna da família tem origem no contrabando de tabaco e na venda de pequenas doses de heroína.

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O clã Charlín – conhecido como Los Charlines – foi o precursor de todos os outros grupos organizados de tráfico de droga na Galiza. Tinham os melhores contactos na Colômbia e em Marrocos, não precisavam de intermediários e sua frota de barcos foi a primeira a operar no Oceano Atlântico. Seria a prisão a separar os dois irmãos: José Luis foi preso em Portugal no âmbito da investigação que viria a colocar Manuel atrás das grades durante duas décadas.

Charlín foi denunciado por um dos membros da organização, responsável pelo transporte dos estupefacientes. A confissão saiu-lhe cara: Manuel Baúlo foi assassinado em 1994 na casa que tinha em Pontevedra por dois colombianos. Ainda que nunca tenha ficado provado que o líder do clã Charlín foi o autor moral do homicídio, as declarações de Baúlo chegaram para o condenar pelo tráfico de 600 quilos de cocaína.

Desde que saiu da prisão, em 2010, Charlín juntou-se aos seis filhos e a alguns dos netos para recuperar o património que perdeu. Só conseguiu salvar uma parte das empresas que foram apreendidas pelo Estado ao licitar em leilões e muitas dessas operações estão ainda dependentes de decisões judiciais, já que as investigações a Charlín descobriram 15 milhões de euros em contas offshore na Suíça. Este revés financeiro terá, com toda a certeza, motivado a continuação do negócio do tráfico de droga.

Este é o terceiro barão da droga da Galiza a ser detido desde 2015. Em janeiro desse ano, Rafael Bugallo, conhecido como Mulo, foi apanhado em flagrante a transportar uma tonelada de cocaína; em fevereiro deste ano, a polícia espanhola deteve José Ramón Prado, Sito Miñanco, devido ao seu envolvimento em dois carregamentos de cocaína que somavam mais de quatro toneladas e tinham sido desembarcados no final de 2017.

A detenção de Charlín, Bugallo e Prado prova uma teoria que a polícia espanhola tem explorado nos últimos anos: o tráfico de droga na Galiza voltou a ser feito da forma como começou, nos anos 70. O clã Charlín – assim como todos os que seguiram o exemplo – não tinha intermediários e comprava os estupefacientes diretamente ao fornecedor, na América do Sul, transportando depois para Espanha nas próprias embarcações. “Um regresso que os coroou novamente como o número um do transporte marítimo de cocaína”, garantiu uma fonte policial ao El País.