O futuro da convivência num restaurante poderá ser bem diferente do que era. Os tempos das mesas grandes e cheias de pessoas, da troca de pratos e partilha de talheres, foi posto em causa pelo fantasma do possível contágio com o novo coronavírus e os restaurantes — à semelhança de muitas outras áreas do dia a dia –, terão de se adaptar. Como dizia o chef Ljubomir Stanisic em entrevista recente ao Observador, os restaurantes são espaços de hospitalidade mas não são hospitais, daí ser importante encontrar um equilíbrio entre eventuais medidas de proteção e distanciamento e a preservação do ambiente e decoração que também são importantes no ritual de ir comer fora.

“É necessário recriar uma arquitetura de interiores com as mais elegantes e leves barreiras de proteção disponíveis, isto de forma a evitar que a alma de um espaço acabe por morrer”, diz o designer francês Patrick Jouin ao Le Monde. Com vinte anos de trabalho com o ilustre chef francês Alain Ducasse, Jouin desenhou praticamente todos os restaurantes que o cozinheiro tem espalhados pelo mundo e esse currículo fez com que Emmanuel Macron o tenha convocado — a ele e a Ducasse — para saber que soluções podiam estar na calha para manter a segurança dentro de espaços de restauração sem que todos se tornem num lugar esterilizado e sem identidade.

Esboço daquilo que Jouin e Ducasse propuseram a Macron como possível solução de segurança nos restaurantes. Patrick Jouin

“Não havemos de voltar ao tempo anterior à Covid-19. Quando a pandemia terminar e for descoberta uma vacina haverá um longo e obscuro período de tempo que teremos de saber gerir. Teremos de reformar muitas coisas da nossa maneira de ser e isso aplica-se aos restaurantes, também”, afirma. Novos rituais serão criados, defende, entre eles a “receção dos clientes com o uso de gel desinfetante”, mas telas de plástico e divisórias farão também parte do arsenal de luta contra o vírus, “até nos transporte públicos”. É por isso que se torna necessário apresentar medidas concretas para a proteção da saúde pública que não comprometam a índole dos espaços. Foi isso que este designer e Ducasse fizeram.

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“Propomos a delimitação clara dos espaços para os clientes com recurso a telas ‘caseiras’ que sejam amovíveis e translúcidas. Tudo de forma a que sejam respeitadas as dimensões impostas pelas autoridades de saúde”, explica. Uma das grandes preocupações do setor é com os gastos que estes eventuais requisitos possam acarretar mas é por isso mesmo que Patrick ressalva a importância destes serem “muito baratos e fáceis de manipular pelo pessoal”. Mais concretamente, sugere que estas tais telas sejam feitas “com molduras de quadro” nas quais é aplicado algum tipo de “película transparente como as que as floristas usam para embrulhar os bouquets“. Mas não tem de ser só assim, cada espaço pode ter liberdade para “usar a sua criatividade”.

O “essencial”, diz, é uma coisa simples, apenas “algumas linhas no espaço” que formem um acessório essencial: “O design ligado ao distanciamento social tem de ser pragmático” e “o designer deve ser humilde e colocar a utilidade acima de tudo”, remata. Com material como o pexiglass a tornar-se cada vez mais caro e escasso, dada a sua importância para a construção de viseiras protetoras, por exemplo, são precisas alternativas. A impressão 3D também “não é suficientemente rápida e eficiente”. A alternativa torna-se clara: “Recorrer, em particular, a esses rolos de película de acetato usados ​​pelas floristas.” É claro que esta solução levanta “um problema ecológico” mas é por isso mesmo que a acompanhar esta lógica seja necessário “envolver a indústria de reciclagem”, já que tudo isto envolve “uma enorme quantidade de plástico que teremos de deitar fora regularmente, por razões de higiene”.

O conceituado designer Patrick Jouin trabalha com Alain Ducasse há mais de vinte anos. AFP via Getty Images

Limitações deste género impõem também mudanças no tipo de serviço que se pode fazer neste contexto e sobre isso Patrick também se pronunciou. Como ponto de partida importante, tanto ele como Ducasse defendem que a capacidade de um restaurante terá de ser calculada de acordo com a área disponível e as distâncias de segurança entre pessoas — tudo mediante “a evolução da pandemia”, claro. “A distância mínima a ser respeitada” deverá ser  de “cinco metros quadrados por pessoa”, espaço que permita que cada pessoa “possa virar-se com os braços abertos sem tocar em ninguém”. Mas há exemplos mais concretos.

“Para mesas de duas pessoas pensámos na introdução de uma mesa lateral que permitisse a manutenção da distância para com o empregado”, explica. O profissional deverá colocar os pratos nesse suporte “e cada um pegará no seu”. Se um garfo cair, por exemplo, “talheres de substituição serão entregues”. Os menus reutilizáveis também deverão desaparecer e, se os clientes assim pretenderem, poderá ser colocada “uma tela transparente entre os dois.” O designer francês diz ter desenhado uma peça central, “composta por uma moldura vazia” onde se pode aplicar “uma folha de película”, à semelhança daquilo que se poderá fazer para as divisórias maiores.

A utilização de mesas maiores passa a ser naturalmente mais complicada. Nesse departamento, Patrick afirma ainda não haver uma sugestão final mas, entre as soluções que estão a testar, está a possibilidade das pessoas ficarem “alinhadas lado a lado”, por exemplo. Seja como for, esses testes só acontecerão em maio, num restaurante de Alain Ducasse. “A instalação de protótipos vai tornar possível organizar melhor o ‘bailado’ dos empregados e os gestos que terão de fazer”, explica. Tudo isto, diz, é um método que nascerá a partir do design definido como mais seguro, tudo sempre numa ótica de “tentativa e erro”. Até os gestos naturais terão de ser bem pensados, “de forma inteligente e prática”.