O arcebispo de Díli pediu esta terça feira desculpa pelas críticas e acusações aos envolvidos na investigação a um ex-padre acusado de pedofilia e pornografia infantil em Timor-Leste, reafirmando o apoio total às vítimas.

“A Arquidiocese de Díli tem total confiança nas autoridades judiciais e policiais do Estado, incluindo as que estão envolvidas no caso do senhor Richard Daschbach”, disse em conferência de imprensa o arcebispo de Díli, Virgílio do Carmo da Silva.

“Em nome da Arquidiocese de Díli, quero pedir desculpa pelas acusações e alegações que atingiram as pessoas envolvidas na investigação. A Igreja quer dar o seu apoio e ajuda às vítimas declaradas pelas autoridades policiais”, afirmou.

O arcebispo de Díli reagia à polémica causada nas redes sociais, na sequência do anúncio do Ministério Público (MP) de que tinha deduzido acusação contra Dashbach, com críticas e ataques a jornalistas e a organizações que têm apoiado as vítimas, em alguns casos feitos por membros do clero timorense.

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Virgílio da Silva pediu ainda desculpa pelos “comportamentos que levaram a desentendimentos neste caso”, distanciando-se igualmente de um polémico relatório da Comissão de Justiça e Paz, da Arquidiocese de Díli, sobre o caso.

O prelado anunciou a exoneração do diretor da Comissão e autor do relatório, padre Hermínio de Fátima Gonçalves, considerando que o documento “não reflete a opinião do arcebispo e vai além da competência da Comissão”.

O polémico relatório, que inclui dados das alegadas vítimas, tentou desviar todas a responsabilidade do ex-padre, procurando acusar as autoridades judiciais e policiais timorenses e as organizações que têm apoiado as vítimas de “abuso sexual coletivo” por alegadamente terem realizado exames forenses e audições às vítimas.

Várias das alegadas vítimas foram colocadas em residências de proteção, normalmente usadas pela polícia e pelo sistema judicial, mas o relatório alegou que foram “raptadas”.

O relatório acusou as organizações de apoio de vítimas de serem “uma rede” que atua de “forma estruturada” com o Governo, procuradoria, setor da saúde e a polícia e alegou que a investigação foi “um crime organizado de exploração de crianças, de tráfico humanos e de justiça máfia”.

O relatório está já a ser investigado pelo MP timorense.

A Igreja mostra a sua abertura para colaborar com todas ONG [organizações não governamentais e outras organizações da sociedade civil que dão apoio às vítimas. O Vaticano, através da Nunciatura Apostólica partilha e apoia a posição do arcebispo de dar toda a confiança às instituições democráticas e ao sistema judicial em Timor-Leste”.

Questionado pela Lusa sobre eventuais casos adicionais, o arcebispo disse que vai continuar a atuar para dar proteção e apoio às vítimas.

Desde o início, sempre manifestei a minha prontidão para que todas as vítimas declarem esses abusos. Seguimos as orientações do Vaticano que são de colaborar com a Justiça. Até agora, ainda não nos foram denunciados outros casos”.

O ex-padre norte-americano, acusado de abuso de crianças e pornografia infantil em Timor-Leste, começou a ser investigado em setembro de 2016 pelo Vaticano, mas só foi afastado do local onde alegadamente cometeu os crimes três anos depois.

Documentos a que a Lusa teve acesso mostram que a Congregação da Doutrina da Fé, do Vaticano, esteve a investigar o caso, que envolve o ex-padre Richard Daschbach, entre setembro de 2016 e outubro de 2018, altura em que decretou a “punição vitalícia” e expulsão do sacerdócio.

Os documentos indiciam que a investigação terá começado ainda antes, já que a data de setembro de 2016 é a que marca a entrada na Congregação da Doutrina da Fé de um primeiro relatório sobre o caso.

O ex-padre Richard Daschbach, de 82 anos, está em prisão domiciliária em Díli e é acusado de abusar de pelo menos duas dezenas de crianças no orfanato onde trabalhava, o Topu Honis.

“A acusação é de crime de abusos sexuais contra menores, com agravação, de acordo com os artigos 177 e 182 do Código Penal timorense. Pedimos também uma indemnização civil de 48 mil dólares [41,15 mil euros]”, disse à Lusa o procurador-geral timorense, José Ximenes.

O código prevê penas máximas de 20 anos de prisão por abusos sexuais de menores de 14 anos, agravadas em um terço se as vítimas forem menores de 12 anos.

Inicialmente, Daschbach admitiu os abusos perante a Igreja e a Congregação, mas terá recuado perante o MP, disseram fontes judiciais.

José Ximenes explicou que, além da acusação deduzida, o MP enviou ao Tribunal Distrital do enclave de Oecusse-Ambeno, onde os crimes foram alegadamente cometidos, uma ação civil declarativa a pedir ao tribunal a extinção do orfanato Topu Honis.

Questionado sobre se o MP estava a realizar investigações adicionais relacionadas com este caso, eventualmente de outras pessoas responsáveis por crimes idênticos, José Ximenes confirmou estarem a decorrer inquéritos.