O mapa da Organização Mundial de Saúde (OMS) para o Turquemenistão aparece a branco: zero casos de infeção com SARS-CoV-2 e zero mortes com Covid-19. Não é caso de faltas de dados (muitas vezes representado a cinzento ou num padrão distinto), são mesmo zero casos reportados. Os médicos não se atrevem a chamar a doença pelo nome e o Presidente diz que a ausência de casos é resultado de políticas eficazes de prevenção.

O Presidente Gurbanguly Berdymukhamedov nega que existam casos de Covid-19, apesar de praticamente todos os países do mundo já terem tido mais do que uma vaga — a Coreia do Norte é outra exceção. Além disso, o país faz fronteira a sul com o Irão, onde já se registaram mais de 5,5 milhões de casos de infeção.

Covid-19. Presidente do Turquemenistão assegura que não registou casos desde início da pandemia

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Jornalistas e ativistas também contestam as afirmações do Presidente e afirmam que o Turquemenistão está agora a enfrentar a terceira vaga. A diretora do grupo Direitos e Liberdades para os Cidadãos Turquemenos, Diana Serebryannik, refere que os hospitais estão à beira da rotura: o número de casos de doença compatível com a Covid-19 está a aumentar, não há ventiladores e oxigénio para dar resposta às necessidades, e alguns doentes são mandados para casa sem tratamento.

Um jornalista turquemeno, exilado na Holanda, reportou que uma investigação permitiu identificar mais de 60 óbitos compatíveis com a Covid-19, , mas Diana Serebryannik diz que, segundo os médicos no Turquemenistão, haverá milhares de mortes com Covid-19.

Os cidadãos têm medo de falar, mesmo sob anonimato, e os jornalistas que expõe informação sobre a pandemia são presos. No Turquemenistão o regime autoritário não permite a liberdade de imprensa, nem escrutínio livre — pior mesmo, só a Eritreia e a Coreia do Norte, segundo o 2021 World Press Freedom Index.

Presidente do Turquemenistão bane a palavra “coronavírus”

A análise dos certificados de óbito também não ajuda a identificar a causa de morte, reporta a CNN, em vez de Covid-19 ou mesmo pneumonia, os certificados podem ter uma causa paralela, como ataque cardíaco. Foi o que aconteceu com um diploma turco, Kemal Uchkun, que deu entrada no hospital com sintomas de Covid-19 — confirmados pelos raios X enviados aos médicos turcos —, mas a quem foi negada a possibilidade de ser transportado para o país de origem. Morreu a 7 de julho. Causa de morte no certificado de óbito: paragem cardíaca.

As organizações internacionais que interagem com o Turquemenistão, como a OMS, têm obrigação de ser honestas em relação ao que se passa no país, defende Rachel Denber, vice-diretora da Europa e Ásia Central da Human Rights Watch. Berdymukhamedov, por sua vez, disse na Assembleia Geral das Nações Unidas, na semana passada, que a pandemia de Covid-19 não deveria ser politizada.

Gurbanguly Berdymukhamedov é dentista, mas está ligado ao poder desde 1997, quando exerceu funções de ministro da Saúde. Em 2001, assumiu o cargo de vice-Presidente e desde 2006 é o Presidente do país. A principal mensagem da propaganda estatal é a de uma nação saudável. Mas se já é normalmente difícil receber um tratamento adequado, pior se torna para os doentes Covid-19, conta um dos doentes à BBC.

Máscaras para evitar a poluição pelas poeiras no ar, um estojo de primeiros socorros obrigatório para cada pessoa e um frasco de xarope de raiz de alcaçuz para possíveis doenças respiratórias, estão entre as medidas de prevenção no país. Vale a pensa dizer também que o Turquemenistão deu, pelo menos, uma dose a cerca de 42.000 dos seis milhões de habitantes do país.