Este domingo, 10 de outubro de 2021, às 7h em Medellín, hora a que costumava ir à missa, quando ainda conseguia andar e não tinha perdido o controlo dos músculos do corpo, Martha Sepúlveda vai morrer.

Diagnosticada no final de 2018 com esclerose lateral amiotrófica (ELA), uma doença neurológica degenerativa e incurável que provoca a destruição dos neurónios responsáveis pelo movimento dos músculos voluntários e, no limite, impede ou dificulta a execução de movimentos simples como andar, mastigar, falar ou até respirar, Martha Liria Sepúlveda Campo, agora com 51 anos, vai ser a primeira pessoa a ser eutanasiada naquele país sem estar em estado terminal.

Descriminalizada no país, maioritariamente católico, desde 1997, a eutanásia só foi efetivamente legalizada na Colômbia em 2015, mas apenas para doentes em estado terminal, mentalmente capazes, com um prognóstico médico de 6 meses ou menos de vida. Desde então, 157 pessoas foram eutanasiadas.

Martha, também ela uma católica devota, será a 158ª e a primeira a beneficiar da extensão, aprovada em julho deste ano pela Corte Constitucional do país (com 6 votos a favor e 3 contra), que permite que todos os pacientes em “intenso sofrimento físico ou mental” devido a uma lesão ou uma doença incurável possam também ser elegíveis para a morte medicamente assistida.

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“Sou católica, considero-me muito, muito crente. Mas Deus não me quer ver sofrer. Com a esclerose lateral no estado em que estou, a melhor coisa que me pode acontecer é ir descansar”, disse a um canal de televisão colombiano, subitamente feliz porque a morte, que previa lenta e dolorosa, afinal poderá ser breve.

Em menos de três anos, explicou ao serviço espanhol da BBC Federico Redondo Sepúlveda, o seu único filho, de 22 anos, Martha perdeu a capacidade de andar, ir à casa de banho, vestir-se ou até comer sozinha: “A pior coisa para ela é ver como evoluiu ao ponto de não conseguir ser independente para as atividades diárias mais básicas”.

“Ela não concebia uma vida confinada à cama. O fim da esclerose lateral amiotrófica é sem poder falar, sem conseguir engolir… é algo extremamente doloroso e indigno para ela”, acrescentou ainda o jovem, que não escondeu que, no início, ficou chocado com a decisão da mãe e tentou demovê-la. “Mais tarde, porém, quando tomei consciência da condição precária em que ela estava, do seu desespero e da indignidade da situação, disse: ‘Acho que se a apoiar nesta decisão vou mostrar-lhe mais o meu amor’.”

A decisão de Martha Sepúlveda, que pediu autorização para ser eutanasiada poucos dias após a votação da Corte Constitucional que o tornou possível, tem sido muito contestada pelos setores mais católicos da sociedade colombiana. Francisco Ceballos, bispo de Riohacha e presidente da Comissão para a Promoção e Defesa da Vida do Episcopado Colombiano criticou a imprensa pela forma como tem retratado a mulher, “a caminho da morte com tanta alegria”.

Esta quinta-feira, o bispo publicou mesmo um vídeo, a pedir a Martha Sepúlveda que desista de morrer este domingo: “Martha, convido-a a refletir com calma sobre a sua decisão; espero que seja, se as circunstâncias permitirem, longe do assédio dos meios de comunicação que não hesitaram em utilizar a sua dor e a da sua família, para fazer propaganda à eutanásia, num país marcado pela violência”.