Foi no horário de máxima audiência que Oriini Kaipara fez história na televisão. A jornalista foi a primeira pessoa com tatuagens faciais maoríes — um povo indígena da Nova Zelândia — a apresentar o noticiário. “É uma grande honra. Não sei como lidar com as emoções“, declarou a apresentadora à CNN, depois de se aperceber que a sua aparição correu as bocas do mundo.

Kaipara, de 38 anos, trabalha no canal neozelandês Three e é uma das apresentadoras residentes do Newshub Live, transmitido às 15h30. Foi no dia de Natal que a jornalista se estreou como apresentadora da edição das 17h00, a hora com mais audiência do dia. “Estava realmente eufórica. Estava nas nuvens.“, comentou à CNN sobre o momento em que descobriu que iria ser ela própria a apresentar o programa.

Em 2017, Kaipara confirmou que tem ascendência maorí. Por isto, recebeu o seu “moko kauae” em 2019, ainda quando trabalhava noutro canal, a TVNZ. A decisão de fazer a tatuagem foi pessoal, “para recordar o seu poder e identidade como mulher maorí”.

“Quando duvido de mim mesma e vejo o meu reflexo ao espelho, não me vejo somente a mim. Vejo a minha avó, a minha mãe, as minhas filhas e as que vierem depois de mim, assim como todas as outras mulheres e meninas maoríes. Isso dá-me força.“, declarou.

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A sua aparição na edição com mais audiência gerou muitos comentários positivos, mas também algumas reações negativas. Um dos motivos, segundo órgãos de comunicação social locais, reside na utilização de expressões maoríes que não agradaram a todos os espectadores.

Neste sentido, a jornalista alegou que o idioma maorí é muito importante para ela e que o seu objetivo é expandir a língua que “foi eliminada na geração da avó”. “Não temos abordados muitos traumas intergeracionais sobre a colonização e, para os maoríes, isso é muito pertinente e comovente“, afirmou.

A tatuagem facial “moko kauae” faz parte da tradição maorí e apenas se faz nas diferentes partes da Polinésia. São muito simbólicas e únicas para cada pessoa, dado que contêm informação sobre a sua descendência e história familiar. As mulheres fazem-nas no só queixo, enquanto os homens, cujas tatuagens têm o nome de “mataora”, ocupam grande parte da cara.

Com a colonização, os indígenas acabaram por abandonar a tradição em grande parte devido à discriminação que sofriam. Desde os anos 90, muitos descendentes de maoríes decidiram recuperar estes símbolos para reivindicar e dar mais visibilidade às tradições do seu povo.

A comunidade maorí representa 17% da população da Nova Zelândia, segundo dados publicados em junho de 2021 pelo governo do país, mas ainda são alvo de discriminação. Por exemplo, até 2019, a companhia Air New Zeland não admitia trabalhadores com este tipo de tatuagens.

Nos últimos anos têm ganho visibilidade e têm alguns elementos em postos de renome, como o caso de Nanaia Mahuta – primeira deputada com um “moko kauae” que se tornou ministra.

Por esta razão, Kaipara vê o seu trabalho na televisão nacional como um sinal do que os tempos estão a mudar e espera que as jovens maoríes se inspirem com a sua história. “Durante muito tempo, a nossa gente, os nossos antepassados e agora nós, temos trabalhado para chegar onde chegamos. Como jovem mulher, como jovem maorí, o que fazes hoje influencia e afeta o que acontecerá amanhã. Assim, tudo o que peço é que vejam a beleza de ser maorí, a aceitem, reconheçam e façam o que puderem para ser uma mudança positiva“.