No espaço de um ano o Chega mediu forças em dois atos eleitorais: umas Presidenciais que valeram a André Ventura 496.773 votos e umas eleições autárquicas que o partido definiu como o “dia da implantação”, após conquistar 208.232 votos, 19 vereadores e dezenas de deputados municipais. As duas têm algo em comum: um mau resultado no Porto. O líder do partido teve o pior resultado do país na Invicta e nas autárquicas nem um vereador foi eleito.
O Porto é o calcanhar de Aquiles do Chega e o partido está consciente e preocupado com isso. “O Chega não pode estar implantado só do Mondego para baixo.” As palavras são de Diogo Pacheco Amorim, o homem que decidiu trocar um segundo lugar por Lisboa — com uma eleição certa à luz das sondagens — para ser o número dois pelo Porto. André Ventura, na altura da apresentação dos nomes, fez até questão de dizer que foi um “pedido” do ideólogo do Chega, tal era a estranheza da decisão.
A tática estava montada: um cabeça de lista do Porto — Rui Afonso, presidente da distrital e deputado municipal — e dois dirigentes nacionais que refletissem a aposta no distrito, Pacheco Amorim e a vice-presidente Marta Trindade. Ambos chegaram ao Porto no início do mês, quinze dias antes do arranque oficial de campanha e por lá ficaram.
Logo à partida, uma diferença para Lisboa, em que os principais candidatos andam na caravana pelo país. André Ventura é o cabeça de lista pelo círculo da capital e, enquanto líder do partido, anda na habitual volta nacional em tempo de legislativas. Rui Paulo Sousa e Rita Matias seguem nos segundo e terceiro lugares por Lisboa e estão também inseridos na caravana nacional do Chega. Fazem parte do núcleo duro do partido que acompanha sempre o presidente e não abdicaram desse lugar para ficar pela capital. Com este cenário, é Pedro Pessanha, quarto por Lisboa, que dá a cara pelo Chega nas ruas da cidade.
No Porto viu-se o oposto: Diogo Pacheco Amorim faz parte desse núcleo duro, da carrinha dos nove lugares em que costuma viajar a equipa mais próxima de Ventura, mas não embarcou nesse périplo pelo país para se dedicar à Invicta. Desde o início da campanha oficial só foi visto uma vez fora do Porto, num jantar-comício em Aveiro e justificou-o com o facto de não haver agenda no Porto àquela hora.
A caravana nacional do Chega deu atenção especial ao distrito do Porto pela importância do círculo eleitoral e pela tal necessidade de afirmação. Num fim de semana agitado, André Ventura esteve num jantar-comício na Alfândega do Porto, almoçou com ex-combatentes e fez uma arruada na Póvoa de Varzim. Quem assistiu ao filme está longe de imaginar que aquele distrito é mesmo um quebra-cabeças para o partido.
O jantar juntou mais de 300 pessoas no Porto — todavia, o barómetro do entusiasmo esteve longe de ser comparado com o de Braga — e a arruada da Póvoa foi a maior do Norte, juntando ainda mais pessoas do que na cidade minhota (e com muito mais confusão e necessidade do aumento de força por parte da equipa de segurança de André Ventura).
Para a história da campanha fica a faltar a tradicional arruada na Rua de Santa Catarina, no Porto. Nas autárquicas, depois de a meteorologia não ter ajudado, André Ventura voltou ao Porto só para descer a icónica rua da Invicta. Desta vez, esteve ali mesmo ao lado, na Rua Fernandes Tomás, mas dispensou marcar presença por ali. Uma razão que fica por explicar e que não parece contraditória com o investimento que o partido faz neste distrito.
Do pecado original à campanha da velha guarda
Diogo Pacheco Amorim admite que o crescimento no Porto não tem sido fácil, que a implantação é, até agora, “muito relativa” e aponta um dos problemas do partido: “O pecado original de André Ventura ser do Benfica.” Em causa está não apenas a escolha futebolística do líder do Chega, mas o facto de ter tido grandes confrontos com o clube enquanto comentador desportivo e de haver uma relação quase umbilical entre o FC Porto e a cidade.
Outro dos grandes problemas é a constante instabilidade vivida na distrital do partido, que teve três lideranças diferentes em dois anos, uma delas bastante atribulada com a saída de José Lourenço, que acabou até suspenso do partido.
Com um cenário difícil à partida para as eleições, a campanha no Porto dividiu-se em três partes: plano institucional, arruadas e visitas a empresas e fábricas. No primeiro, a necessidade de tocar em setores fundamentais: educação, religião e futebol. A comitiva do Chega foi recebida pelo reitor da Universidade do Porto, pelo bispo da Diocese da cidade e por Pinto da Costa, presidente do Futebol Clube do Porto.
No terreno, a estratégia foi olhar para a velha guarda e reproduzir: as redes sociais ficam para o o partido a nível nacional. O Porto apostou no “sistema das antigas campanhas da Aliança Democrática (AD): muito cortejo automóvel e arruadas pelo distrito fora”. Um regresso aos “velhos tempos”, com campanha a começar de manhã nos mercados e a seguir para as capitais de concelho, entre arruadas e automóveis com som e slogans.
Os objetivos para o Porto estão definidos, conseguir dois deputados seria bom para o partido, mas a ideia é de que o segundo (a acontecer) já será à tangente. Ainda assim, no meio da arruada mais frequentada do Norte, em Póvoa de Varzim, André Ventura admitiu sonhar com o terceiro pelo círculo do Porto.
Diogo Pacheco Amorim confessa que estava à espera de uma receção “pior” e notou que ao longo das últimas semanas a atitude das pessoas tem “melhorado”. Contudo, sublinhou uma diferença entre os concelhos periféricos e com grande componente rural, em que a caravana do Chega é “bem recebida” e os concelhos dormitório que há uma “receção mais fria”.