Com o apoio de menos estados do que o adversário e sem tantas das maiores zonas populosas consigo, Lula da Silva conseguiu, ainda assim, garantir o seu regresso ao Palácio do Planalto, por uma magra margem de votos (50,90% contra os 49,10% de Jair Bolsonaro). Na radiografia aos resultados, fica claro que a dinâmica de voto não mudou radicalmente de estado para estado — e que Lula acabou por confirmar uma tradição eleitoral.

É na análise aos resultados nos maiores estados que se vê que esse costume continua vivo: a ideia de que quem ganha em Minas Gerais costuma conseguir ganhar o país continua a confirmar-se. Foi o que aconteceu desta vez, quando Lula, já a noite ia avançada — com os resultados de mais de 90% das secções de voto apurados — conseguiu conquistar uma pequena vantagem que já não largaria mais: 50,20% contra 49,80% em Minas Gerais.

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Foi, de resto, o único dos maiores estados onde conseguiu ganhar, à semelhança da primeira volta: mais uma vez, Bolsonaro conseguiu o apoio da maior parte dos eleitores de São Paulo (55,24% contra 44,76%) e Rio de Janeiro (56,53% contra 43,37%). Mas, dada a quantidade de eleitores que cabem em cada estado, uma percentagem renhida já pesa e contribui bastante para o resultado final.

De resto, na primeira volta o facto de Lula ter conseguido conquistar Minas Gerais já tinha sido lido como um bom augúrio, uma vez que em 2018 Bolsonaro tinha conquistado os três maiores estados e, com Lula, Minas virou.

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Além disso, o peso da História continua a contar: a última vez que não se cumpriu a tendência de vitória no país do candidato que venceu o estado foi em 1950. Ou seja, Minas é visto como uma espécie de modelo do país, pelas diferenças sociais que ali se encontram — e conta com quase 21 milhões de habitantes, pelo que uma vitória no estado é sempre significativa.

Além disso, tal como na primeira volta, Lula conseguiu ganhar no quarto maior estado, a Bahía, somando mais uma boa fatia de votos.

O domínio nordestino e o estado que mudou

Como seria de esperar, Lula domina no Nordeste — a região onde se sucederam ao longo de todo o dia queixas de eleitores relativamente às operações rodoviárias que a polícia decidiu fazer e que dificultaram a chegada às urnas em zonas mais afetas a Lula. Nas redes sociais, generalizou-se o lema “Deixem o Nordeste votar”. Entretanto, nas urnas, o Nordeste votava mesmo em Lula — como nota a Folha de São Paulo, os nove estados que integram a região deram a maioria a Lula.

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Feitas as contas, e tal como já acontecera na primeira volta, Lula acabou por ganhar a maioria dos votos em 13 estados, que se somam ao círculo do Exterior — contra 14 estados conquistados por Bolsonaro, num mapa muito semelhante ao da primeira volta.

O único estado que mudou de tendência e ‘virou’ foi o Amapá, onde Lula tinha ganhado, com 45,64%, na primeira volta, contra 45,64%; desta vez, Bolsonaro conseguiu 51,39% e Lula, apesar de uma votação superior à da primeira volta — 48,61% — não conseguiu vencer.

Na zona do Sul e do Centro-Oeste o preferido foi Jair Bolsonaro. Como nota o mesmo jornal, a Norte, Amazonas, Pará e Tocantins votaram maioritariamente em Lula; Bolsonaro ganhou em Acre, Amapá, Rondônia e Roraima.

As maiores margens — e os empates

A análise mais fina aos resultados disponíveis traz outras curiosidades, também apontadas pelo Povo: a maior margem a favor de Lula registou-se no Piauí, o estado do Nordeste em que o Presidente reeleito conseguiu 76,82% dos votos, que se traduziram em cerca de 1,5 milhões de votos (contra apenas 459 mil para Jair Bolsonaro).

Na Bahía a margem também foi considerável, de 72% contra 27%, assim como no Maranhão, de 70% contra 29%, mantendo-se assim o padrão nordestino (a região a que Lula falou diretamente nas primeiras declarações de vitória, dedicando uma “palavra especial” ao povo do Nordeste).

Segundo os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, é também possível ter uma noção de quais foram, pelo contrário, as margens mais curtas entre Bolsonaro e Lula. Há até cidades onde se registaram empates, caso de Guará, em São Paulo, Irati, Santa Catarina, e Nanuque, Minas Gerais. Em Cerro Largo, Rio Grande do Sul, venceu com apenas 0,02% de diferença; já em Novo Lino, Alagoas, foi Bolsonaro quem ganhou com apenas 0,03% de vantagem em relação ao adversário.

Esta é a lista completa dos estados em que cada candidato ganhou:

Lula da Silva: Alagoas, Amazonas, Bahía, Ceará, Exterior, Maranhão, Minas Gerais, Paraíba, Pará, Pernambuco, Piauí, Sergipe, Tocantins.

Bolsonaro: Acre, Amapá, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Rondônia, Roraima, Santa Catarina, São Paulo.

Ouça aqui o episódio do podcast “A História do Dia” sobre a vitória de Lula da Silva.

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