Na primeira entrevista que dá depois de ser eleito secretário-geral do PCP, na conferência comunista deste fim de semana, Paulo Raimundo disse este domingo, na RTP, que Estados Unidos, União Europeia, Nato mas também a Rússia repartem responsabilidades no processo que levou à invasão da Ucrânia pela Rússia em fevereiro deste ano — mas que começou em 2014, com a convulsão política que levou à anexação da Crimeia por Moscovo. “O povo ucraniano não terá responsabilidade nenhuma nisto mas acaba por ser um instrumento deste conflito.”

A resposta a quem “saliva” pelo fim do PCP, os ataques ao PS e os alertas para dentro. O primeiro discurso de Paulo Raimundo nas entrelinhas

O PCP tem condenado o conflito em curso. E Paulo Raimundo começa por alinhar por esse discurso, ao defender que a solução para a guerra passa, antes de mais, por uma “exigência da paz” entre Kiev e Moscovo. “Não há nada que nos faça pensar que apagar o fogo com gasolina vá [fazer] ‘descalar’ [o conflito] se não houver pressão para a paz” entre Rússia e Ucrânia, começou por responder o novo líder comunista, questionado sobre as responsabilidades para o momento atual. “Andamos há mais de 3000 dias, há mais de 100 meses a levantar questões por uma escalada militar que começou em 2014 na Ucrânia”, tinha dito instantes antes.

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Mas, depois, o secretário-geral comunista remata com a ideia — que ainda não tinha sido formulada nestes termos por elementos com responsabilidades o PCP — de que vários lados com influência no conflito repartem responsabilidades para a crise que se vive atualmente. “No meio disto tudo, hoje é mais fácil perceber que as maiores responsabilidades estejam nos EUA, NATO, UE e Rússia do que propriamente no povo ucraniano. O povo ucraniano não terá responsabilidades nenhumas nisto mas acaba por ser instrumento deste conflito que está a assolar o mundo.”

A estratégia do “forte sitiado”, o legado da geringonça e o perigo do Chega. Os difíceis desafios que Paulo Raimundo herda no PCP

Há uma semana, Jerónimo de Sousa anunciou que estava de saída das suas funções, pondo fim a uma liderança de quase 20 anos dos comunistas. Dias mais tarde, o PCP anunciou o nome escolhido para lhe suceder: Paulo Raimundo. Confrontado ainda com a possibilidade de ser esse o cenário que tinha pela frente, o novo líder comunista sentiu um “enorme receio e responsabilidade”, admitiu na mesma entrevista à RTP.

Concretizada essa escolha, Raimundo chega à liderança de partido reduzido a uma representação de seis deputados e com a liderança de duas dezenas de autarquias pelo país, além de dois deputados no Parlamento Europeu. Mas é no plano nacional que talvez os maiores desafios se coloquem ao PCP, passada que está a experiência da Geringonça, com um PS auto-suficiente na Assembleia da República para ditar a política que quer implementar no país e sem que os comunistas tenham acesso direto à cúpula do poder para fazer aprovar as suas propostas. Paulo Raimundo atirou, precisamente, aos socialistas, não se afastando de eventuais “oportunidades” para negociar e fazer aprovar as suas propostas — mesmo que as opções socialistas se aproximem, na visão comunista, das “opções de fundo” dos partidos no extremo direito da representação parlamentar.

“O PS quis a maioria absoluta e fez tudo para garantir a maioria absoluta. Tendo-a conquistado, acabou por ficar, no seu pensamento, de mãos livres para aplicar a sua política”, considera. E, continua, “as suas opções de fundo correspondem às opções de fundo do Chega, do PSD e da Iniciativa Liberal. [Mas] não desperdiçaremos nenhuma oportunidade para garantir que o aumento brutal do custo de vida tenha rapidamente uma alteração”, garantiu.