No início da época passada, o chamado porpoising foi um problema sério na Fórmula 1. Muitos dos carros registavam pequenos saltos em pista, devido a uma ineficiência da aerodinâmica que afeta a suspensão, e a FIA decidiu convocar uma reunião com todos os diretores de equipa durante o Grande Prémio do Canadá para discutir o assunto. E discutir, precisamente, foi o que Christian Horner e Toto Wolff acabaram por fazer.

Num momento intenso da nova temporada da série “Drive to Survive”, da Netflix, é possível assistir a uma discussão acalorada entre os diretores da Red Bull e da Mercedes durante esta reunião. A dada altura, Wolff exalta-se e levanta a voz, com Horner a sugerir que o melhor seria que as câmeras deixassem a sala. “Não, eu não me importo. Se achas que isto é um jogo, que é uma atuação, digo-te já que estás muito enganado”, respondeu o austríaco.

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O episódio resume, em poucos segundos, a relação entre Christian Horner e Toto Wolff. Ou melhor: a ausência de relação entre Christian Horner e Toto Wolff. A rivalidade dos últimos anos entre a Red Bull e a Mercedes, muito exacerbada no dramático e derradeiro Grande Prémio de 2021, tornou-se também uma rivalidade muito pessoal entre os dois diretores. E Wolff, numa entrevista recente, deixou isso bem claro.

“Horner? Estou a viver na cabeça dele sem pagar aluguer, o tipo está obcecado comigo. Mas cada segundo que passo a falar dele é um segundo de tempo perdido na minha vida”, disse o diretor da Mercedes ao The Times, numa entrevista de fundo onde acabou por analisar a última temporada e o facto de a equipa ter perdido o Mundial de Construtores para a Red Bull. “O que correu mal em 2022? Entendemos a física de forma errada. Não é um mito. Interpretámos mal alguns dos regulamentos. Colocámos muito ênfase em procurar rendimento num carro que era para rodar no chão, mais baixo, mas não se pode rodar tão baixo porque estava a bater no chão. Tivemos de levantar o carro. Parece uma explicação trivial mas é a realidade”, acrescentou.

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Com ou sem Lewis Hamilton a ser campeão, a verdade é que a Mercedes conseguiu um longo reinado de oito anos consecutivos enquanto campeã mundial de construtores. Hamilton conquistou seis títulos, Nico Rosberg alcançou outro e Max Verstappen quebrou essa série em 2021 — mas a Mercedes ganhava sempre, por mais ou menos pontos. Na última temporada, então, tudo mudou. A Red Bull dominou por completo, ganhando o Mundial de Construtores como não acontecia desde 2013 e com mais de 200 pontos de vantagem. Por outro lado, a Ferrari conseguiu melhor apesar de vários erros em momentos cruciais e assegurou o segundo lugar, com mais 39 pontos do que a Mercedes. De repente, portanto, os alemães eram apenas os terceiros melhores. E esta época terá de funcionar como uma espécie de redenção.

Se Verstappen procura o terceiro título consecutivo para cimentar ainda mais uma ideia de dinastia que já começa a ser clara, Hamilton vai em busca do oitavo Mundial para finalmente ultrapassar o registo de Michael Schumacher e tornar-se o piloto mais bem sucedido da história da Fórmula 1. Pelo meio, há Charles Leclerc — que vai procurar intrometer-se na disputa entre neerlandês e britânico e garantir, pelo menos, o segundo lugar da classificação geral.

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O Grande Prémio do Bahrain deste fim de semana é o primeiro capítulo de uma nova história não só para Verstappen e Hamilton como também para a Red Bull e a Mercedes — logo, para Horner e Wolff. Os dois diretores vão enfrentar-se novamente enquanto figuras absolutas das duas principais equipas que competem pelos títulos mundiais de pilotos e construtores e já se antecipam novas discussões, debates e desavenças. Quem não se vai intrometer, porém, é Fred Vasseur: o novo diretor da Ferrari, que em 2023 substitui o italiano Mattia Binotto.

“Nunca vou fazer estas coisas. Tenho muito respeito pelo Horner e também pelo Toto mas nunca, nunca vou participar neste tipo de jogo”, atirou o francês, que na época passada era o responsável máximo da Alfa Romeo, numa entrevista recente à Motorsport.