Nenhum acionista privado aceitará ficar com o risco de a ajuda de Estado vir a ser considerada ilegal no Tribunal Geral da União Europeia no quadro da próxima privatização da TAP, defendeu Sérgio Monteiro esta quinta-feira. O ex-secretário de Estado das Obras Públicas do PSD/CDS, que trabalha na banca de investimento, admite que existe esse risco de reversão das ajudas que foram aprovadas pela Comissão Europeia.

Por queixas apresentadas pela Ryanair já foram anuladas várias ajudas de Estado dadas na pandemia, incluindo a da Lufthansa (que já tinha sido, entretanto, devolvida). A TAP viu a primeira ajuda de 1.200 milhões de euros anulada pelo Tribunal. A situação foi ultrapassada em 2021 com a aprovação do pacote de apoios após uma investigação aprofundada, mas a Ryanair tem um recurso pendente. Bruxelas aprovou ajudas públicas de 2,5 mil milhões de euros, mais 680 milhões de euros de compensação por danos da pandemia à TAP.

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Para Sérgio Monteiro, o Estado terá de compensar esse risco se a vontade é privatizar neste contexto e adianta que não critica, apenas reconhece, que será inevitável imunizar esse risco.

O banqueiro confirma ainda, em resposta ao deputado Hugo Carneiro do PSD, que o ponto de partida para a venda da TAP são 1.100 milhões de euros que são passados para os novos acionistas, e que resultam das fatias de ajuda pública de 660 milhões de euros que estão por concretizar até 2024 e dos ativos por impostos diferidos de mais de 400 milhões de euros. Entre 2019 e 2020, quando Neeleman negociou a venda à Lufthansa, a TAP foi avaliada em 1.000 milhões de euros.

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Sem VEM, a TAP valia entre 360 e 641 milhões em 2015

Ainda sobre números de avaliações da TAP, mas agora do passado. Sérgio Monteiro revelou que as avaliações feitas para a privatização de 2015 davam um valor positivo entre os 360 a 365 milhões de euros e um intervalo entre os 462 milhões e os 641 milhões de euros positivos, mas apenas considerando a empresa de transporte aéreo, respondendo a uma pergunta de Guimarães Pinto da IL. Com a integração da operação de manutenção do Brasil, a VEM o valor da TAP afundava para o negativo. As duas entidades contratadas antes da privatização atribuíram à TAP SGPS uma valorização negativa de 124 milhões no caso da PwC e de entre 512 e 140 milhões (negativos) na avaliação da Deloitte.

A TAP foi vendida por 10 milhões de euros, mas os privados comprometeram-se com uma capitalização de mais de 300 milhões de euros.

TAP comprada por grupo com Humberto Pedrosa “traria muito conforto ao Estado”

O tema já tinha sido levantado na audição ao próprio Humberto Pedrosa, e voltou à comissão de inquérito pela voz de Filipe Melo, do Chega. A possibilidade de a TAP ser adquirida por um grupo de empresários portugueses, do qual Pedrosa admite fazer parte, é vista com bons olhos por Sérgio Monteiro. Que se mostra, no entanto, cético quanto a esta possibilidade pelos valores envolvidos.

“Tenho a melhor impressão de Humberto Pedrosa, pessoal, profissionalmente e é um empreendedor com responsabilidade social. Tive várias interações com ele por vários motivos, e fiquei com a impressão de ser um empresário preocupado com responsabilidade social. E sei-o desapontado com o fim que a sua participação na TAP teve, pela vontade que tinha em transformar a TAP numa companhia maior”, começou por afirmar.

Já sobre a questão do Chega, o ex-secretário de Estado tem dúvidas sobre o potencial de “transformar o valor sentimental em valor económico”. E considerando os 1.100 milhões de euros como a barreira inferior para a venda, esse é um montante “muito significativo”, e “não haverá grupos de empresários nacionais para olhar para a operação com essa ordem de grandeza”.

Sérgio Monteiro defende que Humberto Pedrosa “traria muito conforto para o Estado”, mas “os montantes em causa tornam difícil que um grupo de empresários se junte para uma empreitada destas”.

O ex-governante sugere que, se houver essa vontade, “se juntem a empresários da indústria”. Terminou a fazer genuínos votos para que a privatização corra bem, precisamos que corra bem, que a dívida e os juros que pagamos sejam amortizados, que a TAP encontre o caminho que desenhámos e que foi interrompido”.

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