Ao longo de mais uma década, a Seleção Sub-21 de Rui Jorge conseguiu algo que era provavelmente o mais complicado de alcançar: criar, enraizar e desenvolver uma ideia de jogo. Os nomes poderiam ir mudando, as alternativas poderiam aumentar ou diminuir, mas bastava existirem 11 em campo para se perceber o que era aquela equipa – e para isso basta recordar a odisseia do técnico para encontrar jogadores suficientes para os Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, numa campanha que ainda chegou aos quartos. Foi assim que Portugal conseguiu voltar por duas vezes ao jogo decisivo da fase final da categoria (derrota nos penáltis em 2015 com a Suécia e por 1-0 na última edição da prova com a Alemanha). Não foi assim que Portugal se apresentou em 2023, mesmo perante ausências como a de Fábio Vieira que tiveram o seu peso na edição.

As regras de Tomás Araújo passaram a leis – de Murphy (a crónica do Geórgia-Portugal)

Apesar das expetativas que as provas dadas no passado levantavam, a Seleção entrava na terceira e última ronda da fase de grupos a depender de terceiros para poder ainda chegar aos quartos da competição, depois de uma derrota com a Geórgia a abrir (2-0) e um empate com os Países Baixos (1-1). Ponto comum aos dois encontros? Quando conseguia jogar em posse como gosta, faltava velocidade, critério e intensidade; quando se desviava desse padrão, não só perdia profundidade ofensiva como sobretudo somava erros defensivos que não são habituais neste conjunto, o que acabou por ditar a perda de pontos nas partidas anteriores. Ainda assim, havia uma pequena esperança no jogo com a Bélgica e era a isso que Rui Jorge se agarrava.

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Deu azar confiar na sorte e agora só a sorte os pode salvar (a crónica do Portugal-Países Baixos)

“Devemos ter muito cuidado com a profundidade defensiva, atendendo à velocidade dos jogadores belgas. Em termos ofensivos, precisamos de ter melhor qualidade com bola e aproveitar bastante o jogo interior para criar dificuldades ao adversário. Poderíamos ter estado melhores quando recuperávamos a bola. É certo que os Países Baixos fizeram uma boa pressão alta mas temos qualidade para mais. Nós e a Bélgica somos duas boas seleções, com capacidade para gerar perigo. Vai ser um jogo muito interessante e ambas têm de vencer. O primeiro jogo foi dentro daquilo que é o nosso normal. Houve mais posse de bola e domínio em termos territoriais e jogámos mais subidos no último terço. Quanto ao segundo, foi uma anormalidade em relação à nossa maneira de jogar. Nestes últimos quatro anos, creio que só a Espanha nos terá obrigado a ter tão pouca bola como se viu agora neste jogo com os Países Baixos”, comentara o selecionador.

Era mesmo preciso quase um “milagre”. E o milagre aconteceu, como e quando menos se esperava.

O encontro começou a todo o gás e com a “sorte” a sorrir a Portugal logo a abrir no minuto inicial, com Samu Costa a perder a bola numa zona proibida mas Openda a não conseguir marcar sem guarda-redes na baliza a acertar no poste antes de Pedro Neto responder na baliza contrária após uma transição rápida com um remate para defesa de Vandevoordt (2′). O jogo estava aberto, intenso e com a Seleção a ter mais uma boa oportunidade por Fábio Silva, a ganhar um ressalto na área mas a rematar fraco para o número um belga (10′). Portugal voltava a fazer um encontro muito irregular, capaz de aproximar-se do registo normal em posse mas com erros invulgares nesta equipa em termos defensivos, e foi Celton Biai que segurou o nulo até ao intervalo com duas grandes defesas a remates isolados de Openda (24′) e Balikwisha (28′).

O segundo tempo começou na mesma toada mas com outra capacidade de ligar jogo de Portugal nos minutos iniciais, criando a primeira oportunidade de perigo na sequência de um canto marcado na esquerda que teve desvio de cabeça de João Neves ao primeiro poste para Fábio Silva ficar muito próximo do primeiro golo. De seguida, e perante uma Bélgica incapaz de colocar em campo o ritmo da primeira parte, a Seleção adiantou-se mesmo no marcador com um grande remate de primeira de João Neves numa segunda bola que colocava Portugal nos quartos (56′), posição onde esteve de forma virtual durante menos de dez minutos depois do empate do recém entrado Vertessen aproveitando um cruzamento de Openda da direita (65′).

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Rui Jorge tentava mexer na equipa com a entrada de sangue novo como Diego Moreira, Henrique Araújo, André Almeida ou Paulo Bernardo mas, além de um remate acrobático de Samu Costa que passou muito perto do poste, a melhor oportunidade pertenceria a Vertessen, que isolado na área rematou por cima da baliza de Celton Biai. No entanto, o momento do jogo estava ainda para chegar e, na sequência de uma grande penalidade escusada, Tiago Dantas recolocou Portugal na frente quase no minuto 90 entre os muitos protestos da formação belga apesar da cotovelada evidente de Debast a Henrique Araújo na área.

Quando nada o fazia prever perante o que estava a acontecer nos minutos finais, a Seleção conseguiu a tão ambicionada vitória, beneficiou do empate dos Países Baixos frente à Geórgia apesar do domínio que foram conseguindo ter sobretudo no segundo tempo e vai agora defrontar a Inglaterra nos quartos do Euro.