A REN Gasodutos transferiu, até 30 de junho, 68,6 milhões de euros, de um total alocado de mil milhões de euros, para apoiar as empresas face ao aumento do preço do gás natural, disse fonte oficial da empresa.

Em resposta à Lusa, a mesma fonte recordou que, em dezembro do ano passado, “para ajudar as empresas a fazer face ao aumento do preço do gás, o Estado português estabeleceu através do Decreto Lei n.º84-D/2022 um regime transitório de estabilização do preço do gás natural para consumos realizados em 2023”. Assim, “a REN Gasodutos, enquanto Gestor Técnico Global do Sistema Nacional de Gás, ficou responsável pela transferência das verbas devidas aos comercializadores que solicitem o apoio e que cumpram os requisitos para o mesmo”, indicou. Segundo a REN, estes montantes “são estabelecidos através de uma fórmula constante no mencionado decreto-Lei, que incorpora a evolução do preço de mercado grossista de Gás Natural (MIBGAS)”.

A empresa disse que o valor total do apoio, mil milhões de euros, “foi transferido pelo Estado português no dia 29 de dezembro de 2022 para uma conta dedicada, com separação contabilística relativamente a outras atividades exercidas pela REN Gasodutos, que apenas é responsável pelas transferências, efetuadas com base nas informações de consumos e cálculo de ajuste de preços recebidos da ERSE e dos comercializadores”. A empresa sublinhou ainda que “não recebe qualquer remuneração pela gestão deste fundo”.

Assim, à data de 30 de junho de 2023, a REN registou no seu relatório e contas do primeiro semestre de 2023, “quer no ativo quer no passivo, 931,4 milhões de euros, o que resulta da transferência de 68,6 milhões de euros para comercializadores que cumpriram com os requisitos referidos no DL”. A empresa assegurou ainda que “a verba que não for utilizada até ao final de 2023 será devolvida ao Estado português, acrescida dos eventuais juros vencidos sobre o saldo da conta”.

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A principal razão para um uso tão escasso do fundo que foi anunciado no final do ano passado está na acentuada queda dos preços de gás natural verificada desde então numa amplitude que poucos anteciparam.

Governo diz que mecanismo é um seguro para situações de preços altos e volatilidade

O Ministério do Ambiente e Ação Climática esclarece que “o regime transitório de estabilização de preço do gás natural para consumos realizados em 2023 funciona através do desconto sobre o preço do gás natural quando este ultrapassa o valor de referência do MIBGAS (de acordo com a fórmula prevista no no n.º 1 do artigo 3.º do DL 84-D/2022). Os valores do apoio de gás natural têm vindo a diminuir devido à redução dos preços no MIBGAS. De facto, o valor do apoio de gás natural é nulo desde o dia 12 de abril (com exceção de 16 de junho, em que o valor do apoio de gás natural foi de 1,74 EUR/MWh). Com a estabilização do preço de mercado grossista de gás natural, o mecanismo não foi acionado, mas continua como um importante instrumento de seguro para situações de volatilidade e de preços elevados”.

Esta queda é justificada sobretudo pelas temperaturas moderadas do último inverno que levaram a uma redução da procura de gás para aquecimento no centro da Europa. As medidas de redução do consumo de gás adotadas pelos países da União Europeia para acomodar a substituição de parte do fornecimento russo também ajudaram — em Portugal e até junho o consumo encolheu 23,6% face ao valor médio dos cinco anos anteriores — mas o principal fator foi mesmo a temperatura.

Como vai ser pago e gasto o super pacote de apoios à energia para as empresas? As famílias ficam a perder?

Desde os recordes de 2022, em que as cotações do gás chegaram a negociar entre os 140 euros e os 150 euros por MW hora — levando os governos de Portugal e Espanha a avançarem com o mecanismo ibérico que colocou um teto ao gás de referência para o preço da eletricidade — o gás natural baixou para menos de 30 euros por MW. E a recente valorização é vista como um movimento sazonal normal em altura de recomposição de stocks para o próximo inverno.

Com uma utilização limitada, os mil milhões de euros acabaram por servir como um seguro para as empresas mais expostas à fatura do gás que teria sido muito mais usado se tivesse sido disponibilizado logo em 2022 quando várias indústrias suspenderam a sua atividade devido à subida e instabilidade na contratação de gás natural.

No seu relatório e contas, publicado no site da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), a REN recordou que são beneficiários do regime transitório de estabilização de preço “as pessoas coletivas regularmente constituídas, consumidoras de gás em alta, média e baixa pressão nos pontos de entrega com consumos anuais superiores a 10.000 m3”, com algumas exceções.

O desconto é aplicado diretamente pelos comercializadores “no mês seguinte ao da faturação do respetivo consumo, uma vez realizado o pagamento da fatura pelo cliente, devendo o desconto ser expressamente identificado na fatura em que é refletido”. O apoio para as empresas relativo ao gás natural foi anunciado em outubro passado pelo Governo, no âmbito de um pacote de ajudas no valor global de 3.000 milhões de euros, dirigido também ao mercado de eletricidade e estava previsto no acordo assinado na Concertação Social com as confederações patronais e a UGT.

Dos 3.000 milhões de euros previstos no pacote de apoio à fatura energética, 2.000 milhões foram destinados ao mercado de eletricidade e 1.000 milhões ao do gás natural.

Atualizado às 11h20 de sexta-feira com resposta do Ministério do Ambiente e Ação Climática.