Com uma quebra nas sondagens, Luís Montenegro deu uma entrevista à TVI/CNN Portugal em que exigiu tempo para se afirmar como alternativa ao PS (leia-se, ficar até 2026). Atacou António Costa, como seria de esperar, mas também mandou mensagens para dentro do partido, tentando condicionar adversários internos e o próprio Pedro Passos Coelho, ao dizer que será recandidato mesmo que perca as europeias. Defendeu a privatização da TAP a 100%, admitiu que o IRC pode descer nos próximos anos até 15% e assumiu a reposição do tempo integral da carreira dos professores (que quer que seja feita em cinco anos) como uma “prioridade”.

O presidente do PSD continua a definir como meta “ganhar” as europeias, mas introduziu uma ‘nuance’: independentemente do resultado que possa ter nas europeias vai ser “recandidato à liderança do PSD depois das europeias”. Com ou sem vitória. Numa altura em que Passos Coelho se mantém na “reserva”, como noticiou o Observador — mas deixa claro ao círculo mais próximo que não iria contra Luís Montenegro –, o atual presidente do PSD tenta condicionar um regresso do antigo primeiro-ministro caso tenha um mau resultado nas europeias.

Passos mantém-se na reserva, mas não para alimentar o peditório das presidenciais

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Montenegro diz mesmo que se candidatou para vencer “as legislativas“, embora também queira ganhar nas europeias. Lembrou até que se propôs a um “ciclo” longo, como eram exemplo os cartazes que diziam: “Montenegro 2026” — mesmo haja necessariamente eleições diretas pelo meio (logo a seguir às europeias).

O atual líder do PSD puxa mesmo da autoridade quando lhe perguntam especificamente se via com bons olhos Passos Coelho numa candidatura a São Bento: “O candidato a primeiro-ministro sou eu”. Mais à frente chega a dizer que o antigo líder do PSD está até a ser subaproveitado naquilo que pode dar à academia, como professor:  “O meio académico português não está a tirar partido do potencial que ele tem nessa área”.

O Chega nunca, geringonça jamais — mas “pré-coligação” com CDS é possível

O líder do PSD assegura, mais uma vez, que não fará qualquer “coligação ou acordo com o Chega”, reiterando que é uma linha vermelha que não se estende à Iniciativa Liberal. Luís Montenegro recusa ainda formar um governo de maioria à direita do PS, caso não fique em primeiro lugar nas eleições. Uma geringonça tipo ‘Costa 2015’ é algo que Montenegro não aceitará.

Na mesma sequência, o presidente do PSD foi desafiado a dizer se afasta por completamente o cenário de coligações pré-eleitorais, nomeadamente com o CDS, possibilidade que não recusou. Admitiu ainda que, a seu tempo, pensará numa solução.

Professores são “prioridade”

Luís Montenegro não só defendeu a proposta do PSD de recuperar integralmente o tempo de serviço dos professores em cinco anos, como definiu esta medida como uma “prioridade”. O líder do PSD diz que esta é uma medida necessária porque “há hoje muita instabilidade nas escolas”, ao que se junta o perigo de não haver professores”. E acrescenta: “Em 2026, mais de 50% dos professores vão ter mais de 50 anos”.

Para o líder da oposição “só se consegue atrair gente para o ensino se se valorizar a função. Nós fizemos uma escolha. E a escolha é equilibrada do ponto de vista orçamental”. Sobre a posição do PSD em 2019 — que acabou por ser oposta após uma mini-crise — Montenegro deixa a responsabilidade toda para Rio, dizendo que não responde pelo partido nessa altura.

A TAP privatizada a 100% e a turbulência no acordo do novo aeroporto

O presidente social-democrata falou sobre os cenários de venda da companhia aérea nacional para dizer que “a compra da TAP pela Iberia é muito perigosa”. Já em janeiro, em entrevista ao Eco, Montenegro tinha manifestado desconforto com uma eventual venda  da TAP ao grupo IAG (que integra a Iberia) por ser “uma companhia aérea que tem um hub em Madrid” colocando “naturalmente  em risco o interesse que a TAP tem em ter um hub em Lisboa.”

Luís Montenegro acusou ainda Costa “incompetência pura” na gestão da TAP, criticando a reversão da privatização de 2015, que classifica como “uma escolha pública, voluntária e consciente que lesa o interesse público”. O líder da oposição defendeu ainda uma “privatização a 100% da TAP”, embora assuma que possa ocorrer de “forma faseada.”

Sobre o novo aeroporto de Lisboa o vice-presidente do PSD, Miguel Pinto Luz, ameaçou recentemente rasgar o acordo para a localização da infraestrutura por duvidar da independência da comissão técnica que está a estudar o dossiê. Montenegro veio agora confirmar que o acordo está a atravessar alguma turbulência, denunciando que o Governo não está a cumprir as condições negociadas entre os dois partidos e que a comissão técnica independente está a extravasar as suas competências. Na mesma entrevista, o líder do PSD garantiu que vai analisar com cuidado as conclusões do estudo da comissão técnica independente, mas não se compromete a validar qualquer solução.

IRS jovem “melhor” que o do PS, IRC a descer para 19% agora e para 15 no futuro

Luís Montenegro defendeu também algumas das propostas do PSD para o Orçamento do Estado para 2024 e defendeu que a proposta dos sociais-democratas de IRS jovem é “melhor” que a do Governo, pois garante “maior previsibilidade” e aplica-se a todos os jovens até aos 35 anos, que “pagarão um terço [de IRS]”.

Já quanto ao IRC, Montenegro explica que uma das prioridades do PSD é descer já dois pontos, de 21 para 19%. Porém, admite ir mais longe e acredita mesmo que será possível descer ainda mais dois níveis, de 19 para 17 e, mais tarde, 17 para 15%.

Quanto à habitação, Luís Montenegro diz que “o travão das rendas tem um efeito perverso”, pois “é aparentemente uma boa notícia, mas o que acontece é: ou os senhorios não renovam os contratos, ou retiram as casas dos mercados”.  O líder do PSD admitiu ainda aumentos extraordinários das pensões mais baixas.

Sobre as sondagens negativas que teve esta segunda-feira, o líder do PSD diz que os estudos de opinião “são um bom elemento de trabalho”. Diz que não fica “deprimido” quando as sondagens são más, nem “eufórico” quando são boas e prefere ver “um desgaste enorme do PS”. Admite que os portugueses ainda precisam de confiar nele, mas diz que “para se ganhar a confiança e o conforto dos eleitores, é preciso tempo, consistência e solidez. Temos vindo a apresentar ideias para dar precisamente essa segurança.”

Luís Montenegro mostrou-se confortável a falar em pé perante os cidadãos que lhe fizeram perguntas na segunda parte da entrevista e teve, inclusive, menos sede que António Costa, que foi forçado a beber água da pivô há uma semana. A travessia do deserto até 2026, na oposição, terá de ser feita, no entanto, pelo líder da oposição.