Quando Sarina Wiegman anunciou que ia lançar um livro, de forma natural e sem grande surpresa, a larga maioria das pessoas achou que seria uma interessante autobiografia sobre uma vencedora em série que como treinadora já conquistou dois Europeus femininos, chegou a duas finais de um Mundial e quebrou recordes enquanto jogadora nos Países Baixos. Wiegman, porém, apressou-se a clarificar que ainda não está pronta para contar a própria história: este é apenas um livro sobre futebol, liderança e perseverança.

“What It Takes” chega às livrarias esta semana, cerca de três meses depois da final do Campeonato do Mundo que Inglaterra perdeu para Espanha em Sydney. Aos 54 anos, a selecionadora inglesa garante que o caminho até à vitória não se faz com a simples concentração em ganhar — é preciso trilhar um percurso de desenvolvimento para lá chegar. “Não ajuda. Aquilo que é preciso é concentrarmo-nos na forma de tornar a possibilidade de ganhar o mais elevada possível. Tens de pensar em como queres jogar, como te queres comportar”, começou por explicar ao The Guardian.

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“Se eu poder contribuir e ajudar a alguém a ter esse desenvolvimento no futebol, e principalmente enquanto pessoa, isso dá-me muita energia. É disso que gosto, ligar-me às pessoas, e quero desenvolver-me também. Tenho de estar sempre a desenvolver-me, porque o jogo está sempre a mudar e o mundo também está sempre a mudar, é obrigatório. Mas gosto de dar essa contribuição às pessoas, dá-me muita alegria, muita energia. E quando alcançamos resultados e vitórias a alegria é ainda maior, porque não gosto de perder. Mas também faz parte do jogo”, acrescentou a treinadora neerlandesa.

No livro, assim como na conversa que teve esta semana com o The Guardian, Sarina Wiegman aborda um tema que ainda não tinha explorado publicamente: a morte da irmã, vítima de um cancro, cerca de um mês antes do Euro 2022 que acabou por conquistar com Inglaterra. Na altura, no momento em que a vitória inglesa ficou confirmada na final contra a Alemanha, a treinadora entrou no relvado enquanto beijava uma pulseira, revelando depois que o objeto pertencia à irmã.

“Foi a coisa mais triste que já experienciei, mas tudo começou ainda antes de ser selecionadora de Inglaterra. Ela foi diagnosticada antes dos Jogos Olímpicos de Tóquio e foi ficando cada vez mais doente durante todo o tempo em que eu já estava em Inglaterra. Todos sabíamos que tudo iria acabar em breve. Os médicos disseram que já não teria muito tempo de vida em maio de 2022 e esse último mês foi muito valioso”, desabafou.

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Wiegman lamentou ainda o facto de, por já estar muito doente, a irmã só ter conseguido assistir a um jogo de Inglaterra enquanto já era selecionadora. “Só conseguiu ir uma vez, ao Luxemburgo. Ela, o meu pai e o meu irmão foram de carro até lá e eu depois voltei de carro com eles também. Foi um momento muito especial. É muito triste que ela não tenha conseguido ir a Inglaterra. Mas é a vida, há ótimos momentos e momentos tristes. Infelizmente, não podemos ter sempre raios de sol”, explicou a neerlandesa, que também recordou o momento em que o luto a atingiu na véspera da final do Europeu.

“Estávamos a preparar-nos e de repente bateu-me. E pensei ‘ok, não é isto que quero’. E era completamente normal, tudo tinha tido um impacto muito grande, estava muito emocional. Durante aquele período, sabia que podia falar com qualquer pessoa, mas especialmente com a nossa psicóloga. Sentava-me com ela e falava sobre o assunto. E quando falas sobre as coisas sentes uma espécie de alívio. Fiz isso na véspera da final e quando cheguei ao jogo, na verdade, estava feliz”, terminou.

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