Os sindicatos dos médicos e o Governo não chegaram a acordo na reunião desta quinta-feira, e voltam a reunir-se na próxima terça-feira, adiantou o Sindicato Independente dos Médicos (SIM), que regista, ainda assim, “uma evolução” na proposta da tutela.

Sindicatos dos médicos voltam esta quinta-feira às negociações com o Governo

O secretário-geral do SIM, Jorge Roque da Cunha, à saída da reunião no Ministério da Saúde, em Lisboa, adiantou que o Governo propôs um aumento no valor pago por hora aos médicos, mas que fica ainda longe da reivindicação de aumento de 15%, que representa já “uma cedência” face às exigências iniciais.

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Os sindicatos, que deveriam ter tido esta quinta-feira a última reunião negocial com a tutela, voltam a reunir-se com o Ministério da Saúde na próxima terça-feira, véspera da votação final do Orçamento do Estado para 2024. A reunião desta quinta-feira acontece após ter sido cancelada a ronda negocial de 8 de novembro, na sequência da demissão do primeiro-ministro.

As negociações decorrem há 19 meses, com a Federação Nacional dos Médicos (Fnam) a exigir aumentos de 30% e um horário de 35 horas semanais, as 12 horas de serviço de urgência e a atualização do salário base que reponha o poder de compra para os níveis anteriores à ‘troika’ para todos os médicos. O SIM levou para a reunião uma proposta de aumentos de 15%, uma cedência face aos 30% anteriormente exigidos. O Governo propõe um suplemento de 500 euros mensais para os médicos que realizam serviço de urgência e a possibilidade de poderem optar pelas 35 horas semanais. A proposta iguala o salário base dos médicos (3.025 euros), representando um aumento de 5,5%, contra os 3,6% apresentados na última proposta e que mereceu a contestação dos sindicatos.

Sindicatos dos médicos esperam “vontade política” do Governo para obter acordo

“Além de ser insustentável do ponto de vista orçamental, criaria novas injustiças”

No final da reunião, o ministro da Saúde defendeu que o Governo subiu a proposta até ao limite. “É uma proposta que representa um enorme esforço orçamental, no limite daquilo que é possível respeitando o equilíbrio das contas públicas”, afirmou Manuel Pizarro, em declarações aos jornalistas, no final da reunião negocial com o Sindicato Independente dos Médicos (SIM) e a Federação Nacional dos Médicos (Fnam).

De acordo com o ministro, o Governo subiu a proposta anterior de 8,5% e propõe agora um aumento salarial diferenciado de 12,7% para os médicos em início de carreira, acima de 11% para os assistentes graduados e de 9,6% para os médicos no topo da carreira. Ainda assim, longe do valor exigido pelos médicos. “Além de ser insustentável do ponto de vista orçamental, criaria novas injustiças”, comentou o ministro da Saúde, contrapondo que a proposta do executivo “corrige desequilíbrios que existem em várias carreiras médicas”.

“Estou a trabalhar muito seriamente e de absoluta boa-fé para que se chegue a um acordo e um acordo exige duas partes”, disse Manuel Pizarro, considerando que o facto de os médicos pedirem 15% e o Governo responder com um aumento até 12% torna “claro quem é que se aproximou”.

Além da grelha salarial, as negociações, que se prolongam há 19 meses, incidiam também sobre outras questões relacionadas com a reposição das 35 horas de trabalho semanais, das 12 horas em serviço de urgência e dos dias de férias, sobre as quais parecia haver já um entendimento para uma implementação faseada ao longo da legislatura. No entanto, esses temas já não foram tratados na reunião de hoje, devido ao atual crise política, que levou à decisão do Presidente da República de marcar eleições legislativas antecipadas em 10 de março de 2024, na sequência da demissão do primeiro-ministro.

“Essas alterações eram faseadas ao longo da legislatura, que terminará em março e não no final de 2026”, recordou o ministro, considerando que as medidas em discussão “só podiam ser tomadas por um governo que depois fosse capaz de promover a reorganização do Serviço Nacional de Saúde”.

Aumento intercalar de 15% para médicos “é dificilmente recusável” pelo Governo

Para o Sindicato Independente dos Médicos (SIM), a proposta de um aumento intercalar de 15% nos salários dos médicos “não é pedir a lua” e “dificilmente é recusável por parte do Governo”. “Achamos que não é pedir a lua, sabemos que muito dificilmente é recusável por parte do Governo. O Governo ficou de analisar esta situação e cá estaremos na terça-feira para, de uma vez por todas, (…) o Governo perceba que é preciso fazer alguma coisa para antes da tomada de posse do próximo Governo se consiga mitigar o gravíssimo problema que o SNS atravessa”, disse Jorge Roque da Cunha, secretário-geral do SIM, aos jornalistas, à saída da reunião no Ministério da Saúde, que voltou a terminar sem acordo.

A marcação de uma nova ronda negocial é, segundo o dirigente sindical, “um sinal que ainda é possível” chegar a acordo. “Infelizmente o Governo não aceitou essa proposta, ficou de a analisar. Apesar de tudo houve uma evolução, que foi passar de 16,61 euros à hora para 18,61 euros à hora. É aquilo que o Governo hoje nos apresentou como aproximação àquilo que tem sido a nossa proposta de grelha salarial”, referiu, sublinhando que a proposta representa um aumento de 7,8% no valor/hora pago aos médicos, aquém da contraproposta de 15%, e insistindo que o SIM quer “chegar a um acordo responsável”, que os seus associados queiram assinar.

Para Roque da Cunha, se não houver acordo na próxima reunião “quem irá perder são os portugueses”, desde logo no acesso ao Serviço Nacional de Saúde (SNS), com as condições a agravar-se, e com a saúde a servir de “arma de combate político” na campanha eleitoral “em vez de se procurar um consenso essencial entre os partidos” para valorizar o trabalho dos médicos. “Não exigimos efeitos retroativos, podíamos ter feito, não entrámos nesse populismo. Não somos um sindicato de populismo, de alimentar o descontentamento, de aumentar a gritaria, de propor situações que o Governo de maneira nenhuma poderá aceitar. Estamos aqui com ponderação e com sentido de responsabilidade, porque, de facto, o problema é grave. Poderíamos aproveitar esta situação de fragilidade do SNS para criar ainda mais problemas. Nós não. Queremos mesmo muito, muito, muito, chegar a um acordo”, disse, sem se referir à Federação Nacional dos Médicos (Fnam), também na mesa negocial, e que se tem mantido intransigentemente na reivindicação de aumentos de 30%.

Roque da Cunha recusou divergências com a Fnam “em relação ao que é essencial” e sublinhou a “convergência na discordância da proposta do Governo”. “Com certeza que se houver capacidade da parte do Governo de fazer uma aproximação a estes valores, não falarei pelos nossos colegas da Fnam, mas seria muito pouco razoável junto dos nossos associados rejeitarmos uma proposta que se aproximasse dos 15%”, disse, recusando também greves nacionais com o Governo em gestão, uma vez que sem interlocutor o SIM considera que “não faz grande sentido”.

Roque da Cunha lamentou ainda o tempo decorrido desde o início das negociações: “Naturalmente que este tempo que foi perdido na negociação durante o Governo socialista, nos entristece, nos indigna, mas é como é a vida e não estamos aqui para estados de alma, estamos para defender os nossos colegas e o SNS”.