O contexto à volta do Dragão este sábado tinha tudo para ser um autêntico “barril de pólvora” mas o dia foi bem mais calmo do que se poderia esperar. À tarde, enquanto continuavam a ser ouvidos no TIC alguns dos detidos no âmbito da “Operação Pretoriano”, o FC Porto recebeu no Dragão Arena o Benfica em mais um clássico de hóquei em patins que terminou com uma goleada dos azuis e brancos por 7-1 com Pinto da Costa na tribuna (tendo Vítor Baía e Lourenço Pinto a seu lado) e o setor dos Super Dragões lotado com Lipinho a fazer de Fernando Madureira no comando dos adeptos. Mais tarde, à noite, na receção ao Rio Ave para a Liga de futebol, o líder da claque esteve “presente” através de um cartaz mas o resultado ensombrou o jogo.

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Houve um momento ainda na primeira parte em que a alcunha de Madureira foi entoada com um “Allez Macaco, allez” mas rapidamente se ouviram alguns assobios no Estádio do Dragão e o cântico acabou por não ter o provável impacto esperado. A “Operação Pretoriano” continua a acontecer mas nem por isso é muito comentada no universo azul e branco em termos públicos. À reportagem do Observador, entre as pessoas contactadas para se pronunciarem sobre o atual momento do clube, apenas uma referiu que “Fernando Madureira é um sócio como outro qualquer”. Tudo o resto, “não comento”. Mas com uma particularidade que acabou por marcar também a antecâmara do nulo com o Rio Ave: algumas pessoas iam distribuindo bilhetes para a apresentação da recandidatura de Pinto da Costa, no Coliseu do Porto, este domingo.

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De forma quase natural pelo que estava em causa, a “Operação Pretoriano” entrou na campanha eleitoral do FC Porto, até pelas ligações que o Ministério Público alegou depois entre o administrador da SAD, Adelino Caldeira, e os acontecimentos da Assembleia Geral Extraordinária de 13 de novembro. Por isso, este poderia ser um momento de definição do rumo dos próximos meses até ao ato eleitoral, com algumas quase certezas entre as escolhas de Pinto da Costa, como a entrada de João Rafael Koehler, ou especulações que ganharam espaço no tempo do universo dos dragões como as possíveis saídas de Fernando Gomes e do próprio Adelino Caldeira ou a aposta em António Oliveira como administrador da SAD. José Mourinho, treinador campeão europeu pelos azuis e brancos em 2004, era outro dos nomes apontados como possível apoiante do projeto.

“Hoje é o dia em que o presidente Pinto da Costa vai apresentar a candidatura ao próximo mandato, por isso acho que é absolutamente prematuro e inadequado falar em listas. O nosso objetivo é que o presidente assuma a candidatura, anuncie o seu programa e esse é o desejo da maior parte dos sócios do FC Porto. Foi tudo preparado em contrarrelógio, porque como deve calcular Jorge Nuno Pinto da Costa é também presidente do clube, tem uma agenda ultra ocupada e a grande preocupação do presidente é que o clube vença nas diversas modalidades, mas acima de tudo no futebol. Uma agenda ultra preenchida, sendo que a prioridade dele é sempre o clube e não a candidatura, mas achávamos que o timing estava a chegar e no momento em que o presidente decidiu assumir a candidatura, organizámo-nos rapidamente. Felizmente, temos muitos recursos e capacidade de organização e aqui estamos. Acho que vai ser uma cerimónia bonita”, tinha comentado Koehler na chegada ao Coliseu, sem desvendar mais pormenores.

Ainda antes do início da cerimónia, as presenças ganhavam um redobrado peso. Rui Barros, António Folha, Capucho, antigos jogadores e atuais treinadores dos portistas, foram alguns dos primeiros nomes mais “conhecidos” a chegar, seguindo-se António Oliveira (com essa curiosidade de o irmão, Joaquim Oliveira, ter estado na apresentação de André Villas-Boas); o ministro da Saúde, Manuel Pizarro; o presidente da Câmara de Gaia, Eduardo Vítor Rodrigues; o deputado Tiago Barbosa Ribeiro; os administradores Luís Gonçalves, Vítor Baía, Fernando Gomes, Cristina Azevedo e Rita Moreira; o líder da Mesa da Assembleia Geral Lourenço Pinto; o médico Fernando Póvoas; o ex-treinador campeão europeu Artur Jorge; os antigos jogadores João Pinto, Bandeirinha, Domingos, Jaime Magalhães, Paulinho Santos, Ricardo Costa, Silvestre Varela ou Bruno Moraes; o professor catedrático José Neto; o comentador Pedro Marques Lopes; ou Lipinho, número 2 dos Super Dragões que tem “substituído” Fernando Madureira nos últimos dias. E entre as palavras quase de circunstância deixadas à entrada do Coliseu do Porto, Vítor Rodrigues visou André Villas-Boas (que foi hoje ver o voleibol feminino). Adelino Caldeira não marcou presença, naquela que acabou por ser a grande “surpresa” da tarde tendo em conta o peso na estrutura e a provável saída das listas.

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“Nos dias de hoje, gerir qualquer coisa, seja o FC Porto, uma Câmara Municipal ou uma associação, é sempre um ato de coragem. Sou da terra do vinho do Porto, que embora se chame Porto, tem as caves instaladas em Vila Nova de Gaia e temos bem o hábito de perceber que o vinho, quanto mais envelhece, melhor fica. Se a Operação Pretoriana pode prejudicar? Não sei. Venho apoiar Pinto da Costa, não venho falar de questões judiciais. Não é isso que está em causa neste momento, o que está em causa aqui é o presidente Jorge Nuno Pinto da Costa, o presidente que durante estes 40 e tal anos fez do FC Porto um grande clube. Esse assunto é transversal a todos, porque eu já vi Villas-Boas a dançar com os Super Dragões”, referiu.

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Meia hora depois do previsto (ainda assim um atraso inferior ao de Villas-Boas no seu dia de apresentação), Pinto da Costa entrou no Coliseu com a música “Pronúncia do Norte” e gerou uma autêntica explosão entre as mais de 2.000 pessoas presentes no espaço, algo que acabou por deixar visivelmente emocionado o atual líder do clube que deixou o palco numa altura em que os Super Dragões entoavam músicas do FC Porto. A seguir houve um espaço musical, algumas mensagens como a do Cardeal Américo Aguiar, bispo de Setúbal, que apoia a recandidatura “não contra ninguém mas a favor de Pinto da Costa” e um vídeo com todas as conquistas que o futebol foi tendo nas últimas quatro décadas… sem imagens de Villas-Boas.

“Não tenho palavras para agradecer a receção, o carinho e a solidariedade que me transmitiram e que me bateram bem fundo no coração. Compreenderão como é difícil para mim este momento controlar todas as emoções, ter a serenidade para transmitir o que tenho para dizer. Entrei e cheguei aqui sem ter nenhum segurança a acompanhar-me. Não venho ler nenhum discurso nem tenho ao fundo qualquer teleponto”, começou por apontar, na primeira de várias “farpas” que foi deixando ao principal adversário. “Para mim, todo e qualquer dragão é notável. Orgulho-me de ter uma plateia cheia e de não ter aqui ninguém ressabiado. E se são todos iguais, se estão todos no meu coração, permitam-me que agradeça a presença do doutor Manuel Pizarro”, apontou, aludindo ao ministro da Saúde, que estava na primeira fila.

“Entrei para sócio a 31 de dezembro de 1953, entrei no clube em 1962”, recordou, entre o desfilar de todo o trajeto feito nos azuis e brancos. “Qualquer pessoa que se candidate a um lugar deve apresentar todo o seu currículo, este é o meu. O meu currículo está provado e por isso sou candidato à presidência do FC Porto”, apontou o presidente dos dragões, no cargo desde 1982. “Não basta dizer que sonhou com uma cadeira de sonho mas hoje está aqui e amanhã está acolá. Tive a felicidade de nos meus mandatos ter equipas nas modalidades e no futebol que vencessem 2.558 títulos e quero realçar isso para agradecer a todos os que nos ajudaram nessa luta, treinadores, atletas. Conseguimos 68 títulos no futebol, sete internacionais, mais do que todos os clubes portugueses juntos que não chegam nem perto desse número. Por isso, sou candidato à presidência do FC Porto e quero agradecer a quem me acompanhou desde 1982 nesta luta. Rigor, paixão, competência e ambição definem o que é ser FC Porto”, apontou, antes de destacar alguns dos dirigentes que partiram como Reinaldo Teles, Pôncio Monteiro ou Armando Pimental, “que podem ser exemplos”.

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“Tinha condicionado a minha recandidatura a três factos. A passagem aos oitavos da Champions, que nós conseguimos. A arma de arremesso às minhas direções que era a questão das contas e dos capitais positivos. Pela lei e pela CMVM não posso revelar mas dentro de uma ou duas semanas vamos apresentar um saldo de dezenas de milhões de euros e capitais próprios positivos. Explicámos que era uma estratégia para podermos resistir ao ataque que nos foi feito para levarem o Diogo Costa e o Pepê. Optámos por manter, sabendo que no final do ano estaria a situação invertida com capitais próprios positivos. Não me lembro nunca de ter tido um momento de desafogo financeiro. Em 1982, tive de abrir uma conta na Farmácia para que pudessem dar ligaduras. Pedi uns meses depois para debitarem ao FC Porto, ou podiam achar que tinha uma fábrica de múmias, e assim foi. Tínhamos de pagar as viagens a pronto mas com muita luta fomos passando todas estas dificuldades. Li que um ex-membro da minha Direção que está na outra lista se preocupava com a situação financeira. Ninguém se preocupa mais do que eu. O tempo em que Angelino Ferreira foi responsável foi o mais complicado para mim porque estivemos meses sem pagar. Estejam sossegados…”, salientou.

“Os troféus que enchem o nosso belo Museu, que alguém disse que ia ser um tufão que ia passar pelo FC Porto. É um orgulho ver que todas as personalidades que o visitam ficam encantados. Mas temos que olhar para a frente, para o futuro. Temos que ganhar mais do que até hoje. Não é amanhã, nós estamos a prepará-lo e foi por isso que renovámos contrato com Galeno, Danny Namaso e contratámos Otávio. Tinha uma proposta para ir o Dubai mas teve palavra e veio para o FC Porto. Queremos esse futuro, rejuvenescendo a minha equipa, os meus serviços, a modernização e rentabilização do estádio para concluirmos o nosso centro de estágio na Maia, apesar de muitos terem tentado boicotar. Este vai ser sem dúvida o meu último mandato mas vou cumpri-lo até ao final. Não é para ir a meio e abrir a porta. Não serão os lóbis, grandes construtoras ou grupos económicos nem os que querem ter o preço ao desbarato da TV”, prosseguiu.

“Não vejo ninguém que veja nisto uma oportunidade. Aqui, o FC Porto será sempre o dono da SAD. Quando se criaram as SAD, o FC Porto tinha apenas 40% do seu capital. Hoje, passados tantos anos, temos 74%. E não, não conseguirão vender o lote de ações com agentes da Arábia, do Iraque ou do Irão para entrarem no nosso capital. Temos que ser ambiciosos. Nós sabemos quão difícil é, ser e estar no FC Porto. Temos uma comunicação social que nos hostiliza. Ouvi um comentador dizer que mantinha o discurso contra a imprensa lisboeta e que o meu adversário era para combater isso mesmo. Basta ouvir alguns programas para se sentir a vontade com que querem ver-me daqui para fora. Sou afrontado, atacado, até insultado mas isso só me dá força. Enquanto sentir isso, fico e digo ‘Vamos em frente FC Porto’”, apontou Pinto da Costa, numa fase do discursos de maiores críticas à imprensa que coincidiu com o arremesso de dois isqueiros para a zona onde estavam concentrados os jornalistas, que foram atingidos pelos mesmos sem ferimentos.

“Não vou deixar que façam do FC Porto um entreposto para andarem a fazer negócios com os árabes. Era fácil dizer 42 anos depois, basta. Eu não fui no canto da sereia, estou aqui para levar o FC Porto em frente. Não sou o presidente dos presidentes porque muitos já não existem entre nós, sou o presidente do FC Porto, o presidente de todos vós porque pretendem que continue. Fico orgulhoso por ver tantos atletas que não passaram, estiveram no clube. Que fixem bem, não como slogan mas como estado de alma: todos pelo FC Porto. Se todos estivermos assim, o FC Porto, o Porto e o próprio país estará melhor. Viva o FC Porto”, concluiu Pinto da Costa, agradecendo o apoio de um Coliseu que aplaudia de pé a intervenção e dando alguns abraços como a Sérgio Conceição, técnico que entrou durante a cerimónia da sala apesar de inicialmente se ter tentado “evitar” que fosse filmado mas que deixou o líder em lágrimas com um abraço.