Esta sexta-feira assinala-se precisamente um ano desde que Evan Gershkovich, correspondente do Wall Street Journal na Rússia, foi detido. O jornalista, que trabalhava com um visto oficial concedido pelas autoridades russas na cidade de Ecaterimburgo quando foi detido, está preso a aguardar julgamento por um alegado crime de espionagem há um ano. É o primeiro caso de um jornalista norte-americano a ser acusado desse crime no país desde o fim da Guerra Fria.

Gershkovich está a aguardar julgamento na prisão de alta-segurança de Lefortovo, onde estão também neste momento os suspeitos de terem participado no atentado à sala de espetáculos Crocus City Hall. Na passada terça-feira, o seu período de detenção foi estendido por mais três meses, sendo que o julgamento nunca terá lugar antes de julho.

O caso do jornalista do Wall Street Journal é particularmente delicado porque a publicação garante que Gershkovich estava apenas a fazer o seu trabalho como repórter — as autoridades russas, contudo, acusam-no de espionagem a favor dos Estados Unidos. A detenção de Gershkovich terá sido pessoalmente aprovada pelo Presidente Vladimir Putin, segundo uma notícia da agência Bloomberg. O caso ganha, por isso, contornos políticos claros.

Na prisão, Evan Gershkovich, de 32 anos, não pode receber qualquer visita a não ser dos seus advogados, com quem se encontra uma vez por semana. Num artigo publicado esta sexta-feira pelo seu jornal, conta-se como ocupa o seu dia-a-dia lendo as cartas que recebe de amigos e família e jogando xadrez por correspondência com o pai. “Ele devora os clássicos russos e os livros de História que estão na biblioteca da prisão”, acrescenta o jornal.

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O pai de Evan Gershkovich, que emigrou da União Soviética para os Estados Unidos em 1979, descreveu ao The New York Times as condições da cela em que o filho está: “É um lugar muito pequeno e isolado, com uma pequena janela. Ele tem [direito a] muito pouco tempo no exterior”, contou, destacando a “coragem e esforço” do filho, que mantém a sua rotina de exercício físico, meditação, leitura e escrita de cartas para amigos e familiares.

Para assinalar a data, a edição do Wall Street Journal desta sexta-feira publicou uma manchete em branco, apenas com o título “A história dele deveria estar aqui”. No editorial, a diretora Emma Tucker denuncia as “alegações falsas e sem provas” do Estado russo, mas traça um cenário negro para Gershkovich no futuro: “Tendo em conta as lições da História e do poder arbitrário do Estado russo, se houver julgamento devemos esperar um veredito de ‘culpado’ — algo que encararemos como Justiça travestida.”

Em fevereiro, o comentador norte-americano Tucker Carlson falou do caso de Gershkovich na entrevista que fez ao Presidente Vladimir Putin em Moscovo. Putin confirmou que há conversações em curso com os Estados Unidos para uma possível troca de prisioneiros que venha a permitir a libertação do jornalista — “espião” para Putin.

O processo, contudo, tem sido complicado. A Rússia quer trocar o jornalista por Vadim Krasikov, coronel dos serviços secretos russsos que está preso na Alemanha por ter assassinado um rebelde checheno naquele país. O chanceler alemão, Olaf Scholz, envolveu-se por isso nas negociações e levantou a possibilidade de o opositor Alexei Navalny, que estava também preso, ser incluído na troca.

Na noite em que renovou o seu mandato como Presidente, Vladimir Putin acabou por confirmar que essas negociações estavam de facto a decorrer. Mas não é claro em que ponto se mantêm, dado que Navalny morreu entretanto na prisão da Sibéria onde estava, em circunstâncias pouco claras.

O caso de Evan Gershkovich tem tido o condão de unir toda a classe política norte-americana. Ainda esta sexta-feira, os líderes republicanos e democratas do Congresso emitiram um comunicado conjunto onde criticam “as tentativas de silenciamento do Kremlin” e exigem a libertação do jornalista. “O jornalismo não é um crime e os jornalistas não são moedas de troca”, afirmam Chuck Schumer, Mitch McConnell, Mike Johnson e Hakeem Jeffries.