O PS foi o responsável pela criação de “ilusões” orçamentais junto dos portugueses, num tempo que, na realidade, é de “crise social” e de “situação difícil” em vários setores, por muito que o excedente seja uma boa notícia. Estes foram alguns dos avisos que o ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Rangel, deixou na sua primeira entrevista enquanto governante, na CNN, aproveitando para puxar pela “responsabilidade” que o PS terá em permitir que haja “estabilidade”.

As declarações sobre a situação orçamental do país surgiram em resposta à entrevista de Fernando Medina ao Observador, durante a qual o ex-ministro das Finanças acusou o PSD de fazer promessas e previsões económicas irrealistas e baseadas numa “fezada”. Ora, para Rangel, isso será sinal de que Medina — como Pedro Nuno Santos — “fez de conta que não ouviu” verdadeiramente o discurso de tomada de posse de Luís Montenegro, em que este frisou que é preciso ter cautela com aventuras orçamentais.

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“A responsabilidade nas contas públicas não é uma causa do PS, é coisa que o PS aprendeu tarde e depois de os portugueses terem sofrido muito”, atirou Rangel, lembrando que Medina esteve no Governo de José Sócrates. Depois, voltou ao discurso de Montenegro para garantir que, ao contrário do que Pedro Nuno Santos veio dizer, não houve “nenhuma vitimização” ou chantagem do PSD para exigir ao PS que o deixe governar — ou que assuma a responsabilidade pela instabilidade que existirá se não o fizer: “O PS entende que devemos ser nós a governar, portanto é evidente que tem de ser responsável”.

“Se houver oposição construtiva há estabilidade. Se não houver, não há. Dizer isto é alguma vitimização?”, resumiu Rangel, argumentando que os portugueses “não esperam que os partidos entrem numa oposição destrutiva, num rolo compressor”: “Querem é que agora se governe”.

Rangel fintou a pergunta sobre se o Executivo admite governar em duodécimos caso o primeiro Orçamento do Estado não seja aprovado (uma vez que, no mesmo discurso, Montenegro só colocou um cenário de queda do Governo caso haja uma moção de censura viabilizada no Parlamento), frisando que “nenhum governo apresenta uma proposta de Orçamento do Estado para ele ser reprovado”. Como o Observador explicou aqui, o núcleo duro de Luís Montenegro até admite essa possibilidade, mas não quer explorá-la para não desobrigar Pedro Nuno Santos de tomar uma posição sobre o Orçamento, com a ameaça da instabilidade (e o ónus sobre quem a provocar) a pairar no ar.

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Governo não teria posição “negativa” sobre Costa no Conselho Europeu

Na mesma entrevista, Rangel foi questionado sobre a maior dúvida que se vai colocando sobre o futuro político de António Costa — se se vir livre do processo em que foi implicado, poderá rumar ao Conselho Europeu? — e admitiu que Costa teria “perfil” (“não é o único, mas tem”) para a função. “Se a questão se puser”, o Governo tomará posição sobre isso e “não será negativa”, adiantou. Não quis dizer mais, justificou, porque é preciso haver “cautela e prudência” nestas negociações: “Quem entra Papa sai cardeal”, avisou. “Em defesa da posição de Portugal (…), discrição é fundamental. Estou aos serviços de Portugal”.

Rangel começou ainda a entrevista a defender o alargamento da UE, garantindo que “há da parte deste governo e das forças políticas que o compõem uma posição claramente a favor do alargamento da UE, assim que seja possível”, e com a ressalva de que é preciso uma reforma institucional para que isto possa acontecer.

Ora essa posição contrasta com as “hesitações” iniciais do Governo anterior, como frisou, e que foram entretanto alteradas. “Não compreendi nunca essa posição do Estado português e acho que não nos ajudou. Depois foi corrigida”, prosseguiu Rangel. “Critiquei essa posição do governo [como eurodeputado]. Há múltiplas entrevistas de António Costa a dizer que era uma coisa muito complexa, sempre com muitas reservas”, recordou. “Essa não é a posição que acho que o Estado português devia ter”.

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E lembrou que Luís Montenegro falou da sua posição favorável ao alargamento da UE — que coincide com a que Costa assumiu nos últimos meses, reconheceu – logo no discurso de posse, frisando que viu como bom sinal o telefonema de Volodymyr Zelensky para Montenegro: “Revela que em Kiev esta mensagem foi recebida com interesse”.