Foi uma noite de surpresas, exigências, demissões e de elevada participação eleitoral. Fechadas as urnas em França, todas as projeções davam uma vitória à coligação de esquerda, deixando o partido do Presidente francês em segundo lugar e a União Nacional de Marine Le Pen em terceiro.

Ainda antes de serem conhecidos resultados, o Palácio do Eliseu rapidamente anunciou, logo que foram conhecidas as primeiras projeções, que Emmanuel Macron não iria falar aos franceses, preferindo esperar até se conhecer a estrutura da nova Assembleia Nacional. Já o primeiro-ministro não quis esperar pela contagem e anunciou pouco depois a demissão do cargo que ocupou durante apenas sete meses: “Refleti em tudo o que me disseram. Esta noite, o grupo político que represento demonstrou uma força maior do que o esperado, mas não tem uma maioria. Assim, fiel à tradição republicana e aos meus princípios, apresento a minha demissão.”

Gabriel Attal esclareceu que, se lhe for pedido pelo Presidente, se manterá no cargo em termos de gestão até um novo governo tomar posse. E acabou por criticar Macron, ao sublinhar que não escolheu esta dissolução, e que “avisou para os riscos” de que resultasse numa “maioria absoluta dominada pela França Insubmissa ou pela União Nacional”.

Já da União Nacional, cujo resultado nas projeções ficou muito aquém do previsto pelas sondagens, chegava uma mensagem otimista. A vitória da UN “apenas foi adiada”, garantiu Marine Le Pen, defendendo que a “maré está a subir”. “Não subiu o suficiente desta vez, mas continua a subir”, disse à TF1. E acrescentou: “Tenho demasiada experiência para ficar desiludida por um resultado em que duplicámos o número de deputados.”

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A mensagem de Le Pen contrastou com a do presidente da UN, que denunciou acordos eleitorais que “atiraram França para os braços da extrema-esquerda de Jean Luc Mélenchon”. “Infelizmente, alianças desonrosas e acordos perigosos entre [o Presidente] Emmanuel Macron, [o primeiro-ministro] Gabriel Attal e a extrema-direita privaram a política francesa de uma recuperação”, afirmou Jordan Bardella, notando ainda assim que o partido está a fazer o avanço “mais importante” em toda a sua história.

À esquerda, multiplicaram-se as celebrações. O líder do França Insubmissa (partido que faz parte da aliança Nova Frente Popular) deixava uma exigência. “O Presidente deve deixar a Nova Frente Popular governar”, sublinhava Jéan-Luc Mélenchon, acrescentando que a coligação pretende aplicar “todo o seu programa” e não apenas uma parte. “Atingimos um resultado que nos disseram ser impossível (…) Esta noite a UN ficou aquém da maioria absoluta. Pelo contrário: a maioria das pessoas do nosso pais querem construir uma nova França de paixão republicana”, celebrou Mélenchon, que foi o primeiro a reagir depois do fecho das urnas.

Já Raphaël Glucksmann, uma das figuras mais destacadas da Nova Frente Popular (reeleito recentemente eurodeputado para o grupo dos socialistas no hemiciclo) apelou aos colegas que assumam a responsabilidade do momento e estejam dispostos a negociar. “Estamos em primeiro, mas esta é uma Assembleia dividida”, disse, no Canal 2. “Agora temos de nos comportar como adultos”. Por seu lado, Marine Tondelier, líder dos Verdes, que também compõem a coligação, afirmou que “os eleitores honraram a História do nosso país”. “Hoje ganhámos. E amanhã vamos governar”, garantiu.

Na ausência de uma declaração de Macron, o presidente do Renascença e atual ministro dos Assuntos Europeus dirigiu-se à esquerda para apontar como “óbvio” que Jéan-Luc Mélenchon não pode ser nomeado primeiro-ministro: “Não pode governar França”. Séjourné assegurou ainda, em nome do Presidente, que o Eliseu irá apresentar “pré-condições para qualquer negociação” com vista a formar uma maioria. Dos aliados do Renascença chegou a recusa em aceitar a vitória da esquerda, com o presidente do Modem, François Bayrou, a afirmar que “ninguém venceu esta noite”; e um apelo do líder do Horizontes, Édouard Philippe, para união de várias forças políticas, mas sem a FI e a UN.

Por seu turno, o presidente (contestado) dos Republicanos, que provocou uma divisão no partido quando anunciou uma aliança com a UN nestas eleições, sublinhou num discurso esta noite a preocupação com o país. “A nossa república foi tomada uma doença”, sentenciou Eric Ciotti, denunciando uma “aliança vergonhosa que juntou os macronistas, ambientalistas, socialistas e comunistas”.