É já esta noite que o mundo ficará a saber quais os planos da administração Obama para enfrentar a ameaça crescente do Estado Islâmico no Iraque e na Síria. Mas pouco se sabe sobre o conteúdo do discurso de Barack Obama, que acontece na véspera das comemorações do 13º aniversário do 11 de setembro pelas 21h (horário da costa leste; 2h em Lisboa). O anúncio do Presidente está a ser alvo de inúmeras análises nos meios de comunicação dos Estados Unidos e não parece haver certezas relativamente aos detalhes da operação, como escreve o Washington Post.

Se o USA Today afirma que Obama não vai pedir autorização ao Congresso para recorrer à força militar, tendo já informado que tinha “a autoridade necessária” para avançar, a CNN diz que o presidente já pediu ao mesmo órgão o aval para armar e treinar rebeldes sírios moderados para lutarem contra o EI. O site da NBC News assegura que o presidente dirá aos norte-americanos que vai dar início a uma estratégia abrangente para enfraquecer e derrotar o Estado Islâmico. Tanto a CNN como o Washington Post estão a avançar que essa estratégia vai incluir ataques aéreos a pontos estratégicos dos jihadistas na Síria.

Depois de ter autorizado ataques ao EI no Iraque, Obama está a ser pressionado para fazer o mesmo na Síria — ainda assim, nada parece indicar que estes estejam iminentes, uma vez que a administração de Obama tem indicado que o primeiro passo no combate ao EI passaria por um esforço gradual e em conjunto com forças internacionais e regionais, escreve o Washington Post. Segundo o Telegraph, o Presidente norte-americano deverá repetir que não pretende enviar tropas terrestres para a Síria e para o Iraque.

Uma questão ainda por responder é saber quais os países que estariam do lado dos EUA. De acordo com o Telegraph, o secretário de Estado norte-americano, John Kerry, e o ministro da Defesa, Chuck Hagel, estão neste momento no Médio Oriente a tentar reunir o apoio de países da região para a luta contra o Estado Islâmico. O mesmo jornal escreve que a Turquia não parece estar muito contente com o armamento das forças curdas. Por outro lado, a Arábia Saudita está preocupada que uma ação contra os jihadistas sunitas do EL possa inflamar os ânimos dos sunitas radicais sauditas. Do lado ocidental, não é claro se os EUA pedirão ao Reino Unido, à Austrália e à França para se juntarem aos ataques aéreos. E apesar de, na Síria, Obama e Assad enfrentarem agora um inimigo comum, os EUA afastaram uma cooperação com o presidente sírio e estão convencidos que os rebeldes moderados podem ser mais úteis no terreno.

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Segundo o Washington Post, todo este frenesim em torno do discurso de Obama pode significar que os meios de comunicação já deram início ao processo de “exagerar o desejo público de uma ação militar”, o que por sua vez pode acelerar o processo político, acabando por tornar inevitável uma atuação mais agressiva. Brian Stelter, da CNN, já levantou essa questão, tendo expressado a sua preocupação relativamente ao “pânico provocado” pela imprensa relativamente ao EI. Uma sondagem divulgada esta quarta-feira pelo Wall Street Journal mostra que quase dois terços dos norte-americanos apoiam um ataque aos jihadistas. Entre os inquiridos, 61% consideram que “uma ação militar” contra o EI é “de interesse nacional”. O Telegraph escreve que depois da decapitação dos dois jornalistas pelo EI, 76% dos americanos apoiam novos ataques aéreos contra os terroristas.

Dois artigos de opinião em dois dos principais jornais norte-americanos mostram perspetivas contrárias relativamente à forma como Obama deveria resolver a crise no Médio Oriente. No New York Times, Vali R. Nasr, reitor da Johns Hopkins School of Advanced International Studies, defende que a solução encontrada por Obama para mostrar a sua força assenta de tal forma numa solução militar que coloca o risco de a situação escalar para uma “confusão militar”. Segundo Nasr, o erro da política externa norte-americana está na forma fragmentada como vê o mundo, sem perceber que as duas crises em que está envolvida – na Ucrânia e no Médio Oriente – têm em comum uma mesma origem: ambas tiveram início na fragmentação de estados fracos em fronteiras pouco definidas. “Esses estados ficaram vulneráveis à contestação interna e a postura minimalista norte-americana permitiu que estes problemas se transformassem em crises”, escreve. Na opinião deste académico, as sanções à Rússia e os ataques aéreos no Iraque limitam-se a punir “as transgressões”, mas não apontam um caminho para a resolução dos conflitos. O que Obama precisa de fazer, diz Nasr, é “ajudar os estados fracos a reconciliarem-se, chegarem a um compromisso e unirem-se, evitando desta forma que as fações inimigas possam começar uma guerra civil”. Trata-se de um esforço de “nation building”, continua o académico, que não está certo de que Obama – “um presidente que se retirou dos problemas do mundo” – seja capaz de carregar no botão “reiniciar”.

Na segunda-feira, o editorial do Washington Post defendeu que “os Estados Unidos querem, e devem, destruir o Estado Islâmico”. Tomada a posição, os editores do jornal aplaudem Obama por “finalmente ter uma postura séria”, mas avisam que o Presidente tem de estar determinado em vencer os jihadistas. Isto porque, “até aqui, Obama tem tido uma tendência infeliz de fazer as coisas ao contrário: olhar para o conflito militar como algo que deve ser seguido de acordo com uma agenda, pela qual as forças norte-americanas devem ser retiradas numa data específica, tenham ou não atingido os seus objetivos”.