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Ao longo de dois dias de debate, muitas horas de discussão e vários números atirados para cima da mesa parlamentar, os deputados dos vários partidos apresentaram algumas informações enganadoras sobre dados de emprego e carreiras públicas. A troca de argumentos entre PS e PSD sobre uma resolução do Partido Popular Europeu e a subida das taxas de juro começou no primeiro dia de debate e arrastou-se para o segundo. Os fact checks ao debate do Orçamento do Estado para 2023.

“Um em cada quatro jovens portugueses está desempregado”

A taxa de desemprego jovem ronda os 23,4%. Senhor ministro, um em cada quatro jovens não tem emprego. Repito, um em cada quatro jovens portugueses não tem emprego.”
Patrícia Gilvaz, deputada da Iniciativa Liberal

Uma das intervenções da Iniciativa Liberal durante o debate sobre o Orçamento do Estado para 2023 coube a Patrícia Gilvaz. Na interpelação ao ministro da Economia, António Costa Silva, a deputada liberal afirmou que “23,4% dos jovens estão desempregados”. E frisou duas vezes a ideia de que “um em cada quatro jovens portugueses está sem emprego”. Os números de Patrícia Gilvaz eram factuais em 2021 — mas estão desatualizados.

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O valor referido por Patrícia Gilvaz é relativo ao ano passado. De facto, segundo os dados do Eurostat, em 2021, depois dos confinamentos e restrições impostas para conter a Covid-19, o desemprego jovem em Portugal atingiu os 23,4%. Mas os dados mais recentes do mesmo organismo mostram uma redução dessa taxa para os 15,9%. O que significa que a afirmação da deputada liberal durante a discussão do OE, sendo factual, não é atual.

Quer em 2021 quer segundo os dados mais recentes do Eurostat, revelados este mês, Portugal continua acima da média da União Europeia no que diz respeito ao desemprego jovem. Se, em 2021, a média da UE era de 16,6% de desemprego jovem, atualmente está nos 13%.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

“140 anos para chegar ao topo da carreira [pública]”

O ministro das Finanças tem dito que a direita nunca entendeu ou quis entender. A direita não consegue entender, pelo menos o Chega, o que pretendem fazer com o SIADAP [Subsistema de Avaliação do Desempenho dos Serviços da Administração Pública]. Dizem que vão rever no início do ano, mas não se percebe como. Com o SIADAP, aprovado por toda a esquerda para garantir progressões de carreiras, são precisos 140 anos para chegar ao topo da carreira. É vergonhoso.”
Bruno Nunes, deputado do Chega

Numa interpelação ao ministro das Finanças, Fernando Medina, em que abordou as carreiras no Estado e a existência de vínculos precários e a prazo entre os funcionários públicos, o deputado do Chega Bruno Nunes afirmou serem necessários “140 anos para chegar ao topo da carreira”. Mas as contas não se fazem de forma tão linear.

Bruno Nunes falava na prometida revisão do SIADAP — o sistema integrado de gestão e avaliação do desempenho na Administração Pública — para 2023, mostrando o desacordo do Chega em relação ao sistema, que o deputado aponta ter sido “aprovado por toda a esquerda”.

O argumento dos “140 anos para chegar ao topo da carreira” não é novo. Foi, aliás, um dos argumentos usados pelos sindicatos em 2019 para pressionar o Governo na discussão do projeto de diploma das carreiras especiais de inspeção da Função Pública. Mas, na sua intervenção, o deputado do Chega não falava em carreiras específicas, generalizando a dificuldade em chegar ao topo da carreira na Função Pública.

Ora, os 140 anos de que Bruno Nunes falou resultam da multiplicação dos 14 níveis remuneratórios da carreira geral de técnico superior por 10 anos. Porquê? A progressão “automática” na carreira ocorre quando um funcionário acumula 10 pontos na posição em que se encontra. Por cada ano de trabalho recebe um ponto e foi apenas esse fator que o deputado do Chega teve em consideração.

Mas a progressão não acontece apenas pela contabilização dos anos que um funcionário permanece num determinado cargo.

Fonte: Direção-geral da administração e do emprego público

A avaliação do trabalhador é feita, de dois em dois anos, com vários níveis que correspondem também a pontuações diferentes. Caso tenha um desempenho “adequado”, recebe um ponto por cada ano trabalhado no período em avaliação; no caso de ser avaliado como “relevante”, recebe dois pontos; e no caso de ser “excelente” recebe três pontos, podendo naturalmente progredir de forma mais rápida (encurtando os 10 anos de que precisaria para avançar, se recebesse sempre apenas um ponto por ano).

Mas há ainda um fator a ter em consideração nesta aritmética. Foram estabelecidas quotas para as pontuações mais elevadas. Do total de trabalhadores, apenas 25% podem ser classificados como tendo tido um “desempenho relevante”. E para os três pontos do “excelente” apenas podem contabilizar-se 5% do total de funcionários. Anualmente, 75% do total de funcionários receberá apenas um ponto na sua avaliação de desempenho.

Mas isso não significa que todos os técnicos superiores vão precisar de 140 anos para atingir o topo da carreira, ou seja, não é válido o argumento de que o topo da carreira na função pública é inatingível, como deu a entender no debate do OE2023 o deputado do Chega.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

“O PPE pediu ao BCE para manter a determinação em aumentar as taxas de juro”

O PPE, de que faz parte o PPD/PSD, o eurodeputado Rangel e tesoureiro do PPE, apresentou no fim de setembro um documento de política que tem numa epígrafe sobre política monetária a seguinte frase: O PPE pede ao Banco Central Europeu (BCE) para manter a determinação em aumentar as taxas de juro. Esta é a política do PPE de que faz parte o PPD/PSD de que faz parte Paulo Rangel.
Eurico Brilhante Dias, deputado do Partido Socialista

A troca de argumentos começou logo na primeira intervenção do líder da bancada socialista na Assembleia da República, na quarta-feira. E atingiu de tal forma o PSD que o eurodeputado Paulo Rangel se apressou a publicar no Twitter a resposta. Esta quinta-feira, no discurso de encerramento, o deputado social-democrata Joaquim Miranda Sarmento voltou ao tema.

Estará Eurico Brilhante Dias correto quando afirma que o documento do PPE tem “uma frase” onde “o PPE pede ao BCE para manter a determinação em aumentar as taxas de juro”? Em parte, sim. Mas apenas em parte. No documento, datado de 29 de setembro, é possível ler a frase completa. Os eurodeputados que compõem o PPE escrevem o seguinte: “O PPE apela ao BCE para que mantenha a determinação de aumentar as taxas de juro enquanto as previsões do BCE se mantiverem inalteradas, tendo em conta a Avaliação da Proporcionalidade.”

Ora, consultando o texto do PPE, é fácil perceber que o deputado socialista não leu a frase do documento do PPE na sua totalidade. Ainda que os eurodeputados recomendem que o BCE continue a aumentar as taxas de juro, o pressuposto é que o façam “enquanto as previsões se mantiverem inalteradas” e “tendo em conta a Avaliação da Proporcionalidade”.

É o próprio BCE que, na declaração sobre a estratégia de política monetária, define que “o Conselho do BCE baseia as suas decisões de política monetária, incluindo a aferição da proporcionalidade das suas decisões e dos potenciais efeitos secundários, numa avaliação integrada de todos os fatores pertinentes”.

E essa avaliação tem por base “duas análises interdependentes: a análise económica e a análise monetária e financeira”, define o regulador europeu.

Ainda que a ressalva do PPE no documento possa ser vista como redundante, os eurodeputados frisam-na na recomendação, algo que o deputado socialista ignorou na intervenção que fez durante o debate desta quinta-feira.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

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