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“Indecente, inaceitável, revoltante e um nojo.” À porta do Ministério da Educação, Mário Nogueira estava visivelmente exaltado. Nesta segunda-feira, 15 de maio, pouco antes de terminar a reunião que nove estruturas sindicais tiveram no Ministério da Educação, o líder da Fenprof saiu porta fora. No exterior, não lhe faltaram adjetivos para qualificar o encontro com o ministro João Costa, que acusou de ter uma postura “antidemocrática”. As declarações aos jornalistas aconteceram já na rua, onde vários professores protestavam.

O que levou o líder da maior federação de sindicatos de professores a virar costas ao ministro? O Observador explica-lhe em 12 pontos.

Por que motivo a Fenprof abandonou a reunião?

A gota de água foram as faltas injustificadas que, segundo os sindicatos, estão a ser marcadas aos professores em algumas escolas do país, depois de estes terem aderido a uma das greves de março. Segundo fonte da Fenprof, quando confrontado com esta realidade, a postura de João Costa terá sido de que as faltas são para marcar e os processos disciplinares para avançar.

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Fenprof abandona reunião, acusa ministro da Educação de atitude anti-democrática e segue para a justiça

O que diz o Ministério da Educação?

Em resposta escrita a uma pergunta do Observador, o gabinete de João Costa esclarece que “os membros do Governo não emitiram qualquer orientação no que concerne a marcação de faltas e instauração de processos disciplinares relacionados com a greve de 17 de março”. Essa matéria, defende a tutela, situa-se no âmbito das competências dos diretores de escolas. As faltas “terão decorrido do incumprimento de serviços mínimos decretados pelo Colégio Arbitral, órgão legalmente competente para o efeito, e não do exercício do direito à greve”.

Assim, lê-se na resposta do ministério, o que aconteceu na reunião é diferente do que foi descrito por Mário Nogueira: “Na reunião negocial ontem [segunda-feira] realizada, não foi confirmada a marcação de faltas injustificadas a professores em greve. Ao invés, perante a apresentação de algumas situações, apenas foi esclarecido que a reunião negocial não era o local adequado para averiguação da legalidade de eventuais processos disciplinares decorrentes do não cumprimento de serviços mínimos.”

Já depois desse esclarecimento divulgado pelo ministério de João Costa, a Fenprof veio contestar a ideia de que tivesse apontado à tutela a responsabilidade (ou a orientação) sobre a marcação de faltas. “Não é verdade que nós tivéssemos dito que houve uma orientação central do Ministério, porque senão não lhe íamos pedir para resolver. Dissemos sempre que foram decisões das escolas, decisões das direções regionais e que pedíamos que o Ministério resolvesse, porque eram 10 escolas”, disse Mário Nogueira à Lusa, na noite desta terça-feira. A declaração do líder da Fenprof surge em resposta direta às palavras de João Costa que, em Bruxelas, garantiu não ter havido “qualquer indicação” central do seu ministério a propósito das faltas marcadas a docentes, “ao contrário do que foi dito pelo secretário-geral da Fenprof”.

Essa foi a única razão para Nogueira abandonar a sala?

Não. Outro dos motivos teve a ver com as negociações suplementares em curso. O Ministério da Educação abriu um processo negocial com os professores sobre a progressão da carreira docente, que terminou sem acordo a 21 de abril. Após isso, os sindicatos fizeram o que está previsto na lei: pediram uma ronda de negociação suplementar. Contando com o encontro de segunda-feira, foram quatro reuniões, uma delas técnica, que teve a aprovação do ministro e que, supostamente, serviria para limar alguns problemas da proposta inicial do Governo.

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No entanto, quatro reuniões depois, explicou Mário Nogueira, já no final do encontro, e depois de todos os sindicatos terem perguntado pelo documento onde contavam ver algumas das alterações propostas pelos professores, a resposta do ministro terá sido de que o documento continuava a ser o mesmo de março, sem quaisquer alterações — o que levou Mário Nogueira a dirigir-se para a porta.

O que acontece a essa negociação?

A resposta a essa pergunta ficará mais clara já esta quarta-feira: o Ministério da Educação convocou uma conferência de imprensa para as 12h30. Assunto: “O diploma sobre congelamento de carreiras que vai quinta-feira a Conselho de Ministros.”

Mas uma das hipóteses é que não aconteça, nada. Isto é, sem acordo, poderá avançar a proposta inicial de João Costa, sem os contributos dos professores. A ronda suplementar chegou ao fim e cabe ao Ministério da Educação voltar a chamar os sindicatos de professores se quiser iniciar qualquer tipo de negociações, como fez em setembro do ano passado quando se discutiu o regime de recrutamento (concursos de professores).

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Depois de cinco meses de negociações, a 16 de março, o Conselho de Ministros aprovou o novo regime de gestão e recrutamento de professores, sobre o qual nunca se chegou a acordo com os sindicatos.

Quando se fala de faltas, de que greve se está a falar?

O dia de greve em questão foi o 17 de março. Nesse dia, havia duas greves agendadas: a do STOP (sindicato de professores), uma greve por tempo indeterminado, e para a qual tinham sido decretados serviços mínimos. O outro protesto era convocado pela Frente Comum (afeta à CGTP, assim como a Fenprof) e abrangia todos os trabalhadores da Função Pública, onde se incluem professores.

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E por que motivo foram marcadas faltas aos professores?

A 17 de março, como dissemos, havia duas greves. Uma direcionada aos professores e outra, mais geral, que abrangia toda a Função Pública. O entendimento de muitas direções de escolas, explicou um diretor ao Observador, foi de que as regras da greve dos professores (convocada pelo STOP e que exigia serviços mínimos) se sobrepunha às regras da greve da Função Pública, sem a mesma exigência.

Outro diretor, Manuel Pereira, que é presidente da ANDE — Associação Nacional de Dirigentes Escolares, acrescenta um ponto a esta explicação. “O que diz a lei, concorde-se ou não com a greve, é que se um professor falhar os serviços mínimos exigidos deve ser-lhe marcada falta injustificada. E os diretores, gostem ou não, concordem ou não, têm de cumprir a lei.”

A ideia de que pudesse ter vindo uma ordem do Ministério da Educação no sentido de marcar faltas aos professores é posta de lado. “A decisão é das direções”, esclarece Manuel Pereira.

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É conhecida a lista de escolas onde foram marcadas as faltas?

A Fenprof, para já, não tem uma lista de escolas, mas está a fazer esse levantamento que deverá entregar no DIAP a 18 de maio. Na Rádio Observador, Mário Nogueira apontou as regiões do país onde já surgiram problemas: Braga, Esmoriz, Covilhã, Serpa, Portimão, Silves, Montemor-o-Novo e Faro.

Ouça aqui o Explicador com Mário Nogueira.

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Há algum caso concreto?

Sim, um dos exemplos apontados pelo líder da Fenprof foi o do Algarve. Naquela região, na maioria das escolas foram abertos processos disciplinares aos professores que fizeram greve — e não apenas faltas como noutros estabelecimentos. Mário Nogueira deu como exemplo paradoxal o da Escola Básica 2,3 Dom Afonso III, onde foram instaurados processos aos professores apesar do estabelecimento de ensino estar fechado e de não haver alunos na escola.

O motivo que levou à não abertura de portas foi a grande adesão à greve dos assistentes operacionais, sem os quais é impossível abrir uma escola com garantias de segurança.

Por que motivo se diz que há discriminação entre greves?

O argumento de Mário Nogueira é que o Ministério da Educação tinha decidido — “e bem”, segundo o dirigente sindical — não avançar com processos contra os professores que aderiram à greve do STOP por tempo indeterminado, em que alguns contornos foram considerados ilegais. Na altura, o ministro terá considerado que os professores agiram de boa-fé, seguindo os conselhos que lhes foram dados.

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O que vai acontecer a seguir?

Ainda antes de apresentar queixa ao Ministério Público — como pretendia fazer —, a Fenprof foi notificada pelo DIAP, explicou ao Observador fonte da federação de sindicatos. Na notificação, a Fenprof surge na qualidade de denunciante e é-lhe pedido que entregue as provas de que dispõe de que estão a ser marcadas faltas injustificadas aos professores no Departamento de Investigação e Ação Penal.

É isso que Mário Nogueira pretende fazer até 18 de maio, estando a equipa da Fenprof a fazer o levantamento necessário.

Como é que se resolve a situação das faltas injustificadas?

Neste momento, nos tribunais, já que esse é o caminho que a Fenprof decidiu seguir.

A segunda maior federação de sindicatos de professores, a FNE, não recebeu quaisquer queixas até ao momento. No entanto, João Dias da Silva recordou que a organização que lidera não é afeta à CGTP, mas antes à UGT. Assim, os seus sindicatos não emitiram pré-avisos de greve, sendo normal que eventuais queixas sigam para quem convocou a paralisação da Função Pública.

Os professores já colocaram o Ministério da Educação em tribunal alguma vez?

Várias vezes. Ainda em março, a plataforma de nove sindicatos — em que a Fenprof se inclui — apresentou queixa em tribunal contra o ministério por terem sido solicitado serviços mínimos para os dois dias de greve convocados para o início do mês.

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