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37.5 horas semanais, cinco dias por semana, experiência prévia na área, discrição, confidencialidade e disponibilidade para cobrir “necessidades urgentes e inesperadas”. Uma breve busca no Linkedin elucida o que se tornou óbvio nas últimas semanas, para não dizer meses: procura-se uma pessoa qualificada para reforçar a equipa que gere a comunicação dos príncipes de Gales. O cargo em aberto é de Assistente Pessoal do Gabinete para esta área e o anúncio de trabalho é partilhado pelo próprio Lee Thompson, nada mais nada menos que o chefe máximo da comunicação do príncipe William e de Kate Middleton, anunciado em 2022 como o “mago” que projetaria a imagem de futuro do casal que um dia haverá de ocupar o trono – se nada se intrometer pelo caminho.

O prazo de candidaturas já terminou, houve mais de 100 aspirantes a submeter o seu curriculum, mas pode sempre consultar o perfil pretendido. (bem como a crítica de um dos utilizadores: “Tinhas uma função e falhaste. William & Kate precisam de uma nova equipa de comunicação, não apenas de um assistente pessoal”)

Nem tudo vai bem no clã e em particular entre os principais membros séniores.“Um desastre de relações públicas”, é como vem sendo classificada a atuação daqueles que gerem toda a informação associada a Kate Middleton e ao herdeiro do trono. Também lhe chamam “crise institucional”, ou mesmo “pantanosa estratégia de Relações Públicas”, uma debacle da qual se ensaiam retirar lições de moral. Até o Politico sucumbe à “anatomia de uma foto”, mostrando como a família real está conviver com as piores lições em tempos marcados pelo deepfake e pela IA.

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[Já saiu o terceiro episódio de “Operação Papagaio” , o novo podcast plus do Observador com o plano mais louco para derrubar Salazar e que esteve escondido nos arquivos da PIDE 64 anos. Pode ouvir o primeiro episódio aqui e o segundo episódio aqui]

A gota de água mediática terá sido a publicação da foto de Kate e dos filhos no Dia da Mãe, com a influência do photoshop à vista desarmada e posterior pedido atabalhoado de desculpas. Pelo caminho, e numa decisão rara, as principais agências de notícias internacionais, incluindo a Associated Press, Reuters, Agence France Press e Getty, removeram a foto de circulação, alegando a sua aparente manipulação. “Especialistas dizem que detalhes são consistentes com um amador emendando imagens diferentes da mesma sessão para fazer um belo retrato de família.”, sentencia o Wall Street Journal, que assinala ainda a dificuldade que os príncipes de Gales estarão a acusar no redesenho de uma monarquia para os dias de hoje e no exigente campeonato do digital em particular.

“Não precisei que a AP explicasse que a foto parecia manipulada — a minha filha, que não é fotógrafa, amadora ou não, apontou todos os erros com a velocidade de um utilizador experiente do Instagram. Ela também respondeu rapidamente à pergunta sobre a falta de aliança de Kate: “É difícil alterar as mãos”, ironiza Meredith Blake no Los Angeles Times. Sim, porque o tema já chegou aos EUA, onde de resto vivem os Sussex. “Quão desesperados devem estar o Palácio de Kensington e/ou Kate e William para provar que a princesa está bem ao ponto de divulgarem, como prova de que está tudo bem, uma foto tão facilmente identificada como falsa? E quão bizarro é que “Kate” responda tão rapidamente às preocupações do Photoshop (em vez de, digamos, William, que supostamente tirou a foto) e não publique antes um vídeo ou algo para provar o quão ridículo toda a gente está a ser?”, continua Blake. “Quem dirige a campanha de informação de Kate está a tornar muito fácil que nos lembremos dos transtornos alimentares da princesa Diana, problemas de saúde mental e casos de automutilação, sem mencionar a os pensamentos suicidas de Meghan Markle.

Ainda que possa denotar um grau elevado de amadorismo, a edição descuidada de imagens partilhadas pelos canais oficiais do clã real não é uma novidade. Talvez ainda se lembre do postal de Natal do ano passado, em que parecia faltar um dedo ao príncipe Louis, ou de uma foto da Isabel II em 2020 com uma estranha sombra na mão, para não falar daquele retrato da antiga monarca com os netos num sofá, que terá merecido intervenção extra.

Danos colaterais da opção pela informalidade que Kate e William fizeram já há algum tempo. Por outras palavras, tudo corre bem até correr mal quando se dispensam os créditos de um fotógrafo profissional (e de uma revisão atenta antes da publicação?). “Com Kate, uma fotógrafa amadora, os cartões de Natal do casal e os aniversários de seus três filhos são frequentemente marcados por fotografias tiradas por ela. É uma rutura com a tradição decorrente de quando o pai da princesa, Mike Middleton, tirou a primeira fotografia oficial de um recém-nascido príncipe George”, recorda o The Guardian no rescaldo da polémica.

Fotografia do Dia da Mãe de Kate Middleton terá sido tirada por William

Neste caso, o acontecimento ganha atenção redobrada dadas as circunstâncias e o crescente mistério em torno do estado de saúde da princesa. Especialistas sondados pelo Wall Street Journal acreditam que sobram apenas duas opções para o palácio de Kensington: publicar a foto original ou, mais eficaz até para o travão dos rumores, lançar um vídeo em que Kate possa aparecer a fazer prova de vida e tranquilizar o público sobre o seu estado atual.

O guru triatleta da comunicação

Mas afinal, quem é Lee Thompson, um dos homens que estará debaixo de fogo por estes dias? “É um trabalho que às vezes pode envolver grande desafios. Mas isso não deve ser problema para o novo chefe de relações públicas do duque e da duquesa de Cambridge, um triatleta que competiu pela Grã-Bretanha”, escrevia em 2022 o Daily Mail, dando conta da nova contratação na equipa de Kate e William. Thompson terá competido pela última vez em 2019, em Lausanne, na Suíça.

“Supervisionando marketing e comunicações para a CNBC, divido o meu tempo entre nossa sede internacional em Londres e Singapura”, detalhava em agosto desse ano, revelando ainda ser fã do desporto madrugador e do bootcamp.

Quatro anos depois, aos 34 anos, Thompson, formado pela Universidade de Leeds, era apresentado ao grande público como o “guru” que conseguira aumentar em 600% a audiência no YouTube do canal americano CNBC, para o qual trabalhava desde 2017. O novo responsável vinha render Victoria O’Byrne, que se despedia da comunicação do Cambridge por motivos “familiares”.

Descrito como um entusiasta do fitness, os níveis de energia de Thompson passaram a estar ao serviço do casal real no rescaldo de um antigo episódio do qual William e Kate também não haviam saído favorecidos. Falamos da célebre viagem do par às Caraíbas, em que enfrentaram inúmeras críticas e protestos em partes de Belize, Jamaica e Bahamas enquanto representavam a rainha. No regresso, e apesar da contestação, os Cambridge continuavam a ser os dois membros mais populares da família real depois de Isabel II. Para trás, depois desse passo em falso, pareciam ficar os fantasmas do colonialismo e outros tópicos sensíveis.

Apupos, vestidos, memórias de Diana e o “viagra das Bahamas”. A polémica viagem dos duques de Cambridge às Caraíbas

Antes de trabalhar no escritório de Londres da rede norte-americana, Lee trabalhou na Association of Chief Police Officers e na empresa de relações públicas Freuds. É daqui que terá trazido também a senior account manager Rhea Vernon, e que hoje faz parte da equipa de comunicação da “família Gales”, como se referem ao núcleo duro.

E as redes sociais?

Com a descontração de um tweet, em janeiro de 2020 a rede de palácios (incluindo Kensington) procurava alguém para gerir as suas redes sociais. “Criação e curadoria de conteúdo em 6 palácios, capacidade de resumir mil anos de história em um tweet.”, pedia-se entre as competências pretendidas. Domínio de emojis e sagacidade eram fundamentais para o cargo, lia-se ainda. Desconhe-se o resultado do concurso, mas sabemos o que aconteceu pouco tempo depois, em 1 abril de 2020.

Em plena pandemia, Kate Middleton e o príncipe William contratavam o especialista irlandês em redes sociais David Watkins para liderar a sua equipa digital. Watkins, de 27 anos, natural de Dublin, tinha a particularidade de ter começado a trabalhar com Harry e Meghan, e de ter sido responsável por impulsionar as suas redes e marca digital em 2019. Depois dessa estratégia ambiciosa, David mudou-se para a equipa dos Cambridge, com o objetivo de revitalizar as respetivas redes, fornecendo um toque mais pessoal e próximo das novas gerações, graças a legendas mais longas e sumarentas. A transição decorreu durante o confinamento, o que elevou a fasquia e a importância da comunicação feita pela família de Kate e William. Terá sido de David a ideia do vídeo viral das palmas do príncipe George, do príncipe Louis e da princesa Charlotte para o serviço nacional de saúde britânico, numa altura em que os hospitais se encontravam sob forte pressão.

Durante a carreira passada de Watkins como coordenador global de redes sociais na sede da Burberry em Londres, liderou ainda parcerias comerciais lucrativas com a Apple Music. Mas entretanto, já não colabora com os Cambridge. De resto, em maio de 2023, a casa real abria um anúncio em busca de um novo Head of Digital and Social Media. “Esta função fará parte de uma equipa multidisciplinar que trabalha em conjunto para comunicar o trabalho do Príncipe e da Princesa de Gales. O candidato vencedor liderará a estratégia e a gestão dos canais oficiais do príncipe e da princesa de Gales (Instagram, Twitter, YouTube, Facebook). Nada de novo, já que em novembro de 2021 também procurava reforçar a equipa.

Foi ainda em 2021 que William e Kate lançaram um canal no YouTube. Nesse primeiro vídeo, William brincava com a mulher. “Tem cuidado com o que dizes agora porque estes tipos estão a filmar tudo!” Desde então, recordava a Town and Country em 2023, o príncipe e a princesa de Gales partilharam apenas mais 32 clipes — mas as suas publicação em torno da coroação de Carlos III marcavam uma transição para a presença do casal real nas redes sociais. Até 664 mil subscritores deste canal poderão ter visualizado o último vídeo protagonizado por Middleton, lançado no Natal, em que a princesa promove a iniciativa Banco do Bebé. Depois disso, esta ruidosa ausência do espaço público.

Outros passos recentes em falso

Qual desastre disseminado, a gestão das redes sociais da realeza britânica voltou a ser notícia esta semana, e mais além dos príncipes de Gales. O link do vídeo com o discurso do Rei Carlos III a propósito do Dia da Commonwealth, celebrado esta segunda-feira, foi partilhado com erro. Ia ter à conta pessoal de Youtube de Emma Goodey, Head of Digital Engagement, em vez de estar linkado ao canal oficial da Casa Real, notou a People.

“Desde tweetar sobre os preparativos para um Banquete de Estado até trabalhar com os Arquivos Reais para comemorar os eventos do Centenário da Primeira Guerra Mundial, a minha equipa cobre muitos elementos diferentes do trabalho da Casa Real. Como somos uma equipa pequena, todos fazem um pouco de tudo. Partilhamos um escritório e passamos bastante tempo a trocar ideias criativas uns com os outros, o que pode ser muito divertido.”, lê-se na bio de Emma divulgada no site oficial da Casa Real britânica, que não fica imune a piadas no X (antigo Twitter).

“Além de lançar e desenvolver contas sociais bem sucedidas para a Família Real, aconselhei várias organizações de alto perfil sobre os riscos e benefícios de lançar perfis nas redes sociais. Geri projetos na construção e lançamento de sites de alto perfil (…) e gostei de gerir uma equipa pequena e unida no Palácio de Buckingham. Dedico-me à escrita criativa no meu tempo livre, e isso alimenta o meu prazer de escrever para a internet e redes sociais.”, apresenta-se Emma no seu Linkedin. Há 20 anos que trabalha com a Família Real Britânica, tendo começado como Deputy Web Editor.

Conseguirão os braços direitos dar uma mão?

Lee Thompson não é o único nome decisivo na entourage do casal, que se vai movendo nos bastidores. Ainda que outros rostos não sejam responsáveis pela comunicação, a proximidade com os príncipes sugere que não sejam alheios ao desnorte atual.

No caso da princesa de Gales, é impossível contornar o seu braço direito, Natalie Barrows. Secretária particular de Kate, raramente surge em primeiro plano, como manda o cargo que desempenha, mas aqui e ali é possível avistá-la em algumas situações públicas. Barrows não falhou, por exemplo, a presença na Royal Box do torneio de Wimbledon, em julho passado. À entrada do All England Club vemo-la discretamente a passar a carteira Mulberry branca a Middleton, uma das presenças habituais no evento de ténis.

Acredita-se que Barrows trabalhe como secretária particular assistente de Kate desde 2017 e, ao longo de seis anos, tornou-se uma figura de extrema confiança, escreve a revista Tatler. “Em uma função semelhante à do chefe de gabinete, o cargo de secretário particular adjunto é fundamental para ajudar com as agendas do príncipe e da princesa de Gales, coordenar diários, organizar viagens e gerir correspondências. O trabalho supervisiona a organização de programas e compromissos oficiais, bem como garantir que Kate seja informada sobre quem encontrará. Em eventos públicos, Barrows estará sempre a poucos metros de Kate, pronta para entrar a qualquer momento para carregar as flores, cartões e outras fichas que ela pode receber de pessoas bem intencionadas. Barrows também será fundamental para informar a princesa sobre quaisquer dignitários que ela encontrará.”

Nos últimos anos, outra saída de cena a registar: Catherine Quinn, que também foi secretaria de Kate, iria abandonar o cargo depois de uma curta passagem. “Embora as razões por trás de sua renúncia não sejam claras, é relatado que ela deixa a casa da duquesa em bons termos, mesmo que dois anos seja pouco tempo para estar nesse tipo de papel.”, escrevia a Elle. Já em 2017 fora a vez de Rebecca Deacon anunciar a sua partida. Uma séria de mexidas no âmbito da “Operação Passagem de Testemunho”, quando a então rainha passava a fasquia dos 90 anos e se tornava imperioso ir cedendo algumas pastas às gerações seguintes.

A dança de cadeiras, outro sintoma da inconstância nos corredores de Kensington, também se estendeu a William. Em julho de 2018, ao fim de dez anos, Miguel Head deixou de ser secretário particular do então duque de Cambridge. Para o seu lugar entrava um nome associado ao Brexit, Simon Case.

Em fevereiro de 2021, Clive Alderton passava a pasta de secretário particular do príncipe a Jean-Christophe Gray, que de amador terá muito pouco. Afinal, foi porta-voz do antigo primeiro-ministro David Cameron entre 2012 e 2015. Mas até aqui as águas  se agitaram. Em outubro do ano passado, soube-se que Gray apresentou a demissão e que deveria ocupar este lugar apenas até à primavera de 2024, devendo regressar a Whitehall. A decisão estaria ligada com a preferência pela criação de uma nova figura: a de CEO.

Um CEO com um “ego pequeno”

Chegados a setembro de 2023, os media britânicos davam conta de um novo processo de recrutamento, e desta feita com uma nota de extra de novidade. “O casal real quebra a tradição ao procurar um diretor executivo para administrar a sua casa real, valorizando qualidades como “inteligência emocional” e humildade no candidato.”, anunciava a Sky News.

Tradicionalmente, alguém com formação militar, muitas vezes um ex-oficial sénior, supervisionaria as operações do escritório de um membro sénior da Família Real na qualidade de “mestre da casa”. Mas este CEO irá reportar diretamente ao casal, refletindo uma abordagem mais moderna para gerir os seus assuntos reais.”, enquadrava aquele meio sobre a expectativa em relação a esta figura, que ficaria ao leme da estratégia a longo prazo dos Cambridge, sobretudo após a morte de Isabel II e as naturais movimentações no trono. A empresa Odgers Berndtson estava então encarregada de identificar o candidato mais adequado para assumir o leme da Fundação Príncipes de Gales.

Depois de 23 anos na associação BAFTA, Amanda Berry era a escolhida, passando a ocupar o lugar desde junho de 2022.

A modernização da Casa Real parece assim seguir dois caminhos distintos. Se Carlos III também sempre manifestou a vontade de introduzir alterações, continua a permitir que a sua corte seja administrada como tem sido há séculos —  a figura do secretário particular sempre foi o protocolo padrão tanto para o monarca reinante quanto para o herdeiro ou herdeira do trono, atuando como ligação oficial entre o soberano ou herdeiro e vários funcionários do governo e da Commonwealth.

A contratação mais recente poderá apontar para o facto de que William e Kate querem eliminar muitos desses cargos em favor da tal CEO, com a respetiva centralização da burocracia. Ou então William e os que lhe são próximos já terão percebido que o melhor é reativar o esquema seguido até aqui. Já em fevereiro, depois do diagnóstico de cancro de Carlos III, o príncipe de Gales recrutava um novo secretário particular, adiantava o The Guardian. Depois de Gray, cabe agora ao antigo diplomata Ian Patrick, que foi secretário particular do antigo líder dos Liberais Democratas Lord Ashdown, acompanhar de perto os passos do herdeiro do trono neste seu regresso à agenda oficial de compromissos.

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