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Operação Babel. O “Indiana Jones”, o “Gorila” e a entrega de quase cem mil euros em notas numa casa de banho do Norte Shopping

Vice-presidente da Câmara de Gaia é suspeito de beneficiar grupo imobiliário a troco de 125 mil euros — 99.600 entregues numa casa de banho do NorteShopping — e de dois relógios de luxo.

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Alegadas contrapartidas de cerca de 125 mil euros pagas em dinheiro vivo e vários relógios de luxo no valor de seis mil euros terão sido o suficiente para alegadamente convencer Patrocínio Azevedo, vice-presidente da Câmara de Gaia, a beneficiar o Grupo Fortera liderado pelo israelita Elad Dror em projetos imobiliários que superam um investimento de cerca de 300 milhões de euros.

Pelo menos são esses os indícios que levaram o Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) Regional do Porto e a Polícia Judiciária (PJ) a avançar nesta terça-feira para a detenção do n.º 2 da Câmara de Gaia, de Elad Dror, do seu sócio Paulo Malafaia e do alegado testa-de-ferro de Patrocínio Azevedo: João Barbosa Lopes, conhecido pela alcunha “Gorila”.

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Os alegados benefícios resultaram sempre em aumentos da área de construção máxima dos projetos imobiliários para compensar percalços, como a descoberta de vestígios arqueológicos ou até mesmo a imposição por parte da Câmara de Gaia da contratação do arquiteto Souto Moura que terá custado cerca de 500 mil euros em honorários.

Contratação de Souto Moura compensada com mais área de construção

O primeiro projeto imobiliário do Grupo Fortera a ser investigado pelo DIAP Regional do Porto pela Diretoria do Norte da PJ é o projeto Skyline — que deveria ter começado a fase de construção este ano e que se localiza muito perto da Câmara de Gaia, na rua General Torres.

Estamos a falar de uma área de construção com mais de 54 mil metros quadrados que inclui a maior torre de apartamentos do país, com 28 andares, um Centro de Congressos e Cultural e um hotel. A Fortera previa investir cerca de 150 milhões de euros num projeto assente na habitação de luxo, que deveria custar cerca de sete mil euros o metro quadrado.

O negócio começa precisamente quando a Câmara Municipal de Gaia e o Fortera assinam um protocolo para a urbanização daqueles terrenos, sendo que, segundo a investigação judicial, Patrocínio Azevedo terá alegadamente condicionado a aprovação do acordo à compra e venda dos terrenos entre o Fortera e uma empresa de Paulo Malafaia — um promotor imobiliário que é detido pelas autoridades pela segunda vez em cinco meses, após a sua estreia na Operação Vórtex.

O negócio entre o Grupo Fortera e o empresário Paulo Malafaia terá gerado uma mais-valia que supera os 1,4 milhões de euros sem que um tijolo tivesse sido erigido. É a segunda vez que Malafaia é detido em menos de cinco meses pela PJ - a estreia aconteceu nos autos da Operação Vórtex, outro caso de alegada corrupção urbanística.

O acordo entre a autarquia e o grupo liderado por Elad Dror tem uma lógica de parceria público-privada:

  • A autarquia exige a construção do Centro de Congressos e Cultural, um equipamento público, a expensas do Grupo Fortera;
  • E, como contrapartida, viabiliza a construção da habitação e de serviços hoteleiros para que o parceiro possa financiar e lucrar com o projeto.

Ora, o negócio entre o Grupo Fortera e Malafaia terá gerado uma mais-valia que supera os 1,4 milhões de euros sem que um tijolo tivesse sido colocado. Tal lucro bruto subiria para 4,8 milhões de euros, caso a área de construção máxima fosse aprovada pela autarquia.

O segundo favorecimento do Fortera por parte de Patrocínio Azevedo tem diretamente a ver com a imposição do nome do prestigiado arquiteto Souto Moura para fazer o projeto do Centro de Congressos e de Cultura e do hotel. Foi a Câmara de Gaia liderada por Eduardo Vítor Marques que impôs Souto Moura, cuja contratação terá o custo de cerca de 500 mil euros.

Para amortizarem este investimento, Elad Drod e Paulo Malafaia exigiram à autarquia gaiense um aumento da área máxima de construção.

E é aqui que entra um novo personagem: o advogado João Barbosa Lopes, conhecido pela alcunha de o “Gorila”, que representa um papel de alegado testa-de-ferro do vice-presidente Patrocínio Azevedo.

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Será precisamente Barbosa Lopes quem, a partir de fevereiro de 2022, começa a diligenciar para que o objetivo dos promotores imobilários seja alcançado — o que só acontece em julho de 2022 com a aprovação pelo Executivo do PS de um acréscimo de 8.590 m2 à área de construção originalmente aprovada.

Tal acréscimo de área, no valor de cerca de 5 milhões de euros a preços de mercado, foi alcançado através da retirada de área de construção ao edificio do Centro de Congressos e Cultural, bem como do aumento do índice / edificabilidade média da habitação e dos serviços.

Projeto Riverside.  “A tratar€€€” e dos relógios de luxo à razão de três mil euros cada um

Este projeto chegou às mãos do Grupo Fortera por via da aquisição de direitos urbanísticos da Quinta de Santo António — e que eram anteriormente titulados por uma sociedade chamada Noble Faces SA que entrou em processo de insolvência.

O problema é que os terrenos tinham vestígios arqueológicos, cuja preservação é obrigatória por lei e que leva necessariamente à redução da área de construção dos projetos imobiliários.

Ora, Elad Dror e Paulo Malafaia queriam ser compensados. Ou seja, queriam recuperar os metros quadrados de construção ‘perdidos’ nos vestígios arqueológicos, o que implicava aumentar a área de construção num outro lote de terreno da Quinta de Santo António.

O que conseguiram após aturadas negociações que alegadamente terão acontecido com Patrocínio Azevedo, através do seu testa-de-ferro João Lopes.

O problema é que os terrenos tinham vestígios arqueológicos, cuja preservação é obrigatória por lei e que leva necessariamente à redução da área de construção dos projetos imobiliários. Elad Dror e Paulo Malafaia queriam ser compensados e chegaram a ponderar "falar com o Presidente (...) ele não sabe que somos nós neste negócio”, disse Dror.

A preocupação de Elad Dror e Paulo Malafia chegou ao ponto em que o primeiro terá dito por mensagem escrita que “tem de falar com o Presidente”, pois tinha ouvido dizer que havia outros interessados no mesmo projeto imobiliário. “Ele não sabe que somos nós neste negócio”, disse.

No entanto, não é claro que se estivessem a referir ao presidente Eduardo Vitor Rodrigues.

Certo é que, antes do aumento da área de construção, terão começado as exigências de Patrocínio Azevedo, alegadamente feitas através do advogado João Barbosa Lopes. Em dezembro de 2020, terá sido exigido um relógio de luxo no valor de três mil euros que alegadamente se destinaria ao vice-presidente da Câmara de Gaia — o que terá sido concretizado.

Mais tarde, seria ainda oferecido um relógio Frederick Constante, série especial e numerada com caixa de oferta no valor de 3.100 euros.

De acordo com a investigação do MP e da PJ que levaram à “Operação Babel”, que na terça-feira fez sete detidos e 12 arguidos, o alegado testa-de-ferro de Patrocínio terá exigido igualmente a entrega de dinheiro em numerário no valor de 25 mil euros.

Patrocínio Azevedo (à esquerda) e Eduardo Vítor Rodrigues (à direita) com António Costa durante as autárquicas de 2019

LUSA

Após uma primeira abertura de Paulo Malafaia (“a tratar€€€”), é no dia 21 de janeiro de 2021 que são dados passos definitivos. Patrocínio Azevedo comunica a uma funcionária da Câmara de Gaia:“[A] nossa obrigação é negociar com eles [os] achados arqueológicos [para] eles fazerem”. E Paulo Malafaia diz a Elad Dror que vai “precisar de 25.000” para um acordo “sem fatura”.

Os 25 mil euros só serão alegadamente entregues a João Lopes nas instalações da Fortera no Edifício Península, na zona da Boavista, por Elad Drod e Paulo Malafaia. Diz o MP e a PJ que João Lopes entregou esse montante a Patrocínio Azevedo.

O “Indiana Jones” e uma certeza do testa-de-ferro: “Já consegui mais um piso”

O alegado testa-de-ferro chegou mesmo a apelidar o vice-presidente da Câmara de Gaia como “Indiana Jones”, o professor de arqueologia de ficção da saga cinematográfica com o mesmo nome.

E terá sido após “Indiana Jones” (leia-se Patrocínio Azevedo) ter atuado sobre os vestígios arqueológicos, que foi a vez de João Lopes dar “tudo” no aumento da área de construção de outros lotes de Quinta de Santo António.

Depois de ter conseguido “mais um piso” e um aumento de área útil de construção — “para vos tentar beneficiar” justificou —, o alegado testa-de-ferro de Patrocínio garantiu aos promotores imobiliários um aumento do índice de edificabilidade aplicável aos lotes do projeto Riverside de 0,4 para 0,8.

Depois de ter conseguido "mais um piso” e um aumento de área útil de construção — “para vos tentar beneficiar”, justificou —, o alegado testa-de-ferro de Patrocínio garantiu aos promotores imobiliários um aumento do índice de edificabilidade aplicável aos lotes do projeto Riverside aumenta de 0,4 para 0,8

Tal aumento de edificabilidade seria viabilizado através de pedido de informação prévia que, após ser deferido, dá direitos adquiridos ao promotor imobiliário.

Daí que o testa-de-ferro tenha feito novas exigências de alegadas luvas que levam Paulo Malafaia a 12 de abril de 2021 solicitar a Dror uma conversa para falar “$$$, gorila, adiantamento, etc.” O pagamento seria de 12.000 euros para a família e de 25.000 euros para o “Gorila”.

Metro discutido em sede do PS e bolsa com 100 mil euros trocada em casa de banho

Enquanto o PIP (Pedido de Informação Prévia, pedido dirigido à Câmara sobre a viabilidade do empreendimento) não era deferido, surgiu o problema da nova linha Rubi do Metro do Porto, que vai ligar o Porto a Gaia. É que a linha rubi iria passar pelo Lote 7 da Quinta de Santo António e iria diminuir a área de construção do empreendimento Riverside.

A 22 de junho de 2021, Malafaia e Dror encontraram-se e acordaram transferir um total de 110 mil euros para um conta bancária nacional, sendo que 100 mil euros seria para entregar a Patrocínio Azevedo, diz o MP. O alegado testa-de-ferro bem dizia a Malafaia: “Pode ir tratando do resto… há fome… por ele e para ontem!”

A 22 de junho de 2021, Malafaia e Dror encontraram-se e acordaram transferir um total de 110 mil euros para um conta bancária nacional, sendo que 100 mil euros seria para entregar a Patrocínio Azevedo, diz o MP. O alegado testa-de-ferro bem dizia a Malafaia: “Pode ir tratando do resto… há fome… por ele e para ontem!”

É no dia seguinte que a transferência se concretiza. Paulo Malafaia e João Lopes encontraram-se no conhecido centro comercial Norte Shoping. Malafaia levava uma bolsa com 100 mil euros em dinheiro vivo que lhe tinha sido entregue por Elad Dror mas ainda teve o cuidado de ir a uma loja Tiger comprar uma segunda bolsa, transferiu para a mesma a quantia de 99.600 euros e reservou para si 400 euros.

E é numa das casas de banho do Norteshoping que Malafaia entrega a bolsa da Tiger recheada com notas de euros a João Lopes. Segundo o MP e a PJ, essa quantia é uma contrapartida pela manutenção da capacidade construtiva do projeto Riverside.

A 11 de agosto de 2021, Patrocínio Azevedo encontrou-se com o presidente do CA do Metro do Porto, Tiago Braga, na sede de campanha do PS de Gaia para abordar a passagem da linha rubi pela Quinta de Santo António.

Novo veículo da frota do Metro do Porto,11 de fevereiro 2023. O novo veículo vai ficar em exposição na estação da Trindade até dia 14 com visitas abertas a toda a população. ESTELA SILVA/LUSA

ESTELA SILVA/LUSA

E é já em outubro de 2021, que após novas reuniões com o Metro do Porto, Patrocinio Azevedo decide manter a capacidade construtiva do Riverside, mesmo que a nova linha do metro também passasse pelos lotes 1 e 2.

E isso é garantido para vários lotes, nomeadamente através da construção de “três torres” para ganhar área de construção em altura. Certo é que até hoje, o PIP ainda não foi deferido.

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