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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

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PS e JPP: um acordo não assinado e uma 'geringonça' minoritária que deixa Albuquerque em vantagem

Paulo Cafôfo e Élvio Sousa somaram os deputados, viram que têm mais um do que o PSD e resolveram juntar-se e apresentar uma solução. Mas faltam os parceiros que lhes dariam a maioria absoluta.

Uma mesa para se assinar um entendimento que acabou retirada, uma conferência de imprensa que virou declaração e uma entendimento sem grande convicção (e aparentemente sem apoio): “Isto pode não resultar, vai cada um para sua casa.” PS/Madeira e Juntos pelo Povo (JPP) têm 20 deputados e acreditam estar na posição certa para apresentar um “governo estável”, passando à frente do vencedor das eleições, o PSD/Madeira. O entendimento é novo, mas as linhas vermelhas a PSD e Chega mantêm-se e PS e JPP precisariam de CDS, IL e PAN para atingir os 24 deputados — o que não parece possível tendo em conta as últimas declarações dos parceiros.

Na noite eleitoral, Paulo Cafôfo deixou a teoria: “Os resultados demonstram que é possível uma mudança de Governo na Região Autónoma da Madeira”. E menos de 24 horas depois marcava uma conferência de imprensa conjunta com o JPP para demonstrar que a ambição era possível. Paulo Cafôfo e Élvio Sousa entraram juntos e sorridentes numa sala preparada para mais do que foi a realidade. Chegaram a estar montados dois púlpitos e uma mesa — onde havia duas pastas e duas canetas — e havia indicações de que as declarações começavam no púlpito, antes de os protagonistas seguirem para a mesa para assinarem os papéis. A mesa desapareceu sem explicação e não houve nenhum acordo assinado, nem sequer para a fotografia.

Em pouco menos de quinze minutos falaram os dois, prometeram ter condições para apresentar uma “solução governativa credível e confiável” e colocaram o peso em cima dos ombros dos outros partidos. “Após os sucessivos falhanços da governação social-democrata que levaram a região à ruína social e financeira, comprovando o declínio do modelo socioeconómico em vigor há 48 anos, é chegado o momento de virar a página”, afirmou Paulo Cafôfo, sublinhando que um dos primeiros pontos do entendimento serve para “encetar diálogo com os partidos com representação parlamentar à exceção do Chega e do PSD”.

[Já saiu o terceiro episódio de “Matar o Papa”, o novo podcast Plus do Observador que recua a 1982 para contar a história da tentativa de assassinato de João Paulo II em Fátima por um padre conservador espanhol. Ouça aqui o primeiro episódio e aqui o segundo episódio.]

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No estilo mais descontraído a que habituou os madeirenses, Élvio Sousa assentou a decisão numa “assunção de responsabilidade” para pôr fim a “quase meio século de hegemonia do PSD”, prometeu que PS e JPP estão “prontos para governar” e disse que está na hora de quem sempre “criticou as falhas do PSD” ajudar a criar a solução: “Estamos aqui a apelar à consciência de todos os partidos que andaram a criticar as políticas do PSD.”

Para cortar o formalismo do ambiente, Élvio Sousa ainda usou umas das expressões que o caracterizam, disse, tocando no braço de Cafôfo como que em jeito de brincadeira, que PS e JPP “não vão casar” e reconheceu que, no fim do dia, tudo pode correr mal: “Se esta solução não vingar, depois logo veremos” ou “se isto não resultar, vai cada um para sua casa”.

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A solução escorregadia por falta de comparência de parceiros

A verdade é que pode mesmo correr mal. PS/Madeira e JPP pretendem apresentar ao representante da República na Madeira uma solução de governo que lhes permita ficar à frente da presidência do governo, designadamente elaborando um programa de governo que teria de ir a votos. A conferência de imprensa tem exatamente esse objetivo, levar a proposta ao Palácio de S. Lourenço já esta terça-feira. Mas o que levaria Ireneu Barreto a aceitar uma solução sem qualquer promessa de estabilidade?

Antes e depois da noite eleitoral, os três partidos com quem PS e JPP se podiam sentar à mesa foram-se afastando de Paulo Cafôfo, quer pela postura na campanha quer pela preferência por uma alternativa que não inclua o PS. Ao longo da campanha, o PAN foi-se mostrando desconfiado de Paulo Cafôfo. Mónica Freitas chegou a dizer ao Observador que o líder do PS/Madeira tem “sido um bocadinho incoerente porque uma hora diz que não está disponível para dialogar com determinados partidos, outra hora já está disponível, parece que não sabe muito bem o que é que quer”. A deputada do PAN sugeriu ainda que “a única coisa” de que tem a certeza é que “quer chegar ao governo”.

Por parte da IL, Nuno Morna já tinha dito que o líder do PS sabe que não vale a pela ligar-lhe para procurar qualquer tipo de entendimento e, na noite eleitoral, Rui Rocha, presidente dos liberais, foi exatamente no mesmo sentido para aconselhar Cafôfo a que não perdesse tempo com o partido.

Pela voz do CDS, o deputado e líder regional, José Manuel Rodrigues, admitiu ao Diário de Notícias da Madeira que os entendimentos “dependem mais do PSD do que dos outros partidos” e considerou que “os partidos têm de se entender para garantir um governo com alguma estabilidade”. Ao Observador, dias antes, tinha reconhecido que preferia uma solução à direita.

Mesmo que algum destes partidos acabasse a ceder ao entendimento entre PS e JPP, os dois partidos precisavam de mais: é preciso que todos os astros se alinhem e que CDS, IL e PAN estejam ao lado de Cafôfo e Élvio Sousa pelo menos para lhes aprovar um programa de governo. Desde logo, IL e PAN confirmaram ao Observador que não foram contactados nem pelo PS nem pelo JPP antes do anúncio — o que mostra que avançaram para a solução sem qualquer tentativa de perceber,  a priori, se tinham condições de governar.

Ora, sem uma solução sólida, o que levaria o representante da República na Madeira a preferir o PS/JPP ao PSD, que ficou em primeiro lugar nas eleições e que, no mesmo sentido, até pode acabar por avançar com um governo minoritário?

Costa e Bolieiro conseguiram, mas tinham promessas

Os exemplos de geringonça com que Paulo Cafôfo sonha e que até chegou a dizer que se estava a desenhar na Madeira existem, mas não nestes termos. Tanto na República com António Costa como nos Açores com José Manuel Bolieiro havia uma razão para que fosse permitido aos perdedores governarem: a maioria. Nos dois casos foi dada posse a um governo do partido que ficou em segundo nas eleições, mas nos dois casos existia um acordo de incidência parlamentar que permitia uma governação estável.

Paulo Cafôfo e Élvio Sousa resolveram apresentar-se à Madeira e ao país como uma solução capaz de dar governabilidade à região, mas precisam de mais quatro deputados e para os conseguirem têm de negociar com mais três partidos — e até ao momento não chegaram a nenhum entendimento com nenhum deles. Isto  torna praticamente impossível que Ireneu Barreto possa sequer tirar o tapete a Albuquerque, vencedor das eleições, quando — sem linhas vermelhas ao Chega — o presidente do PSD/M tem uma probabilidade mais elevada de ver o programa de governo passar na assembleia legislativa.

Miguel Albuquerque, em declarações à RTP pouco tempo após o anúncio, considerou o entendimento um “ato de desespero, uma fuga para a frente em vez de assumir a responsabilidade da derrota”. “A partir da derrota, tenta-se construir algo que é utópico”, referiu o líder do PSD/Madeira assumindo que “possivelmente” vai optar não por acordos governamentais, mas sim por “soluções parlamentares”.

Esta opção pode acabar por ser um trunfo para Miguel Albuquerque, que tem sido pressionado por vários partidos que não querem acordos formais por ter sido constituído arguido num processo que investiga um alegado esquema de corrupção, mas que podem viabilizar-lhe um governo na assembleia legislativa, principalmente por comparação ao entendimento entre PS e JPP e à forma como foi feito.

No dia seguinte às eleições regionais antecipadas há dois cenários em cima da mesa e nenhum deles parece capaz de assegurar estabilidade quando forem apresentados ao representante da República na Madeira. Perante este cenário, a opção tradicionalmente recai por ser chamado a governar o partido vencedor — neste caso, Miguel Albuquerque parte em vantagem.

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