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DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

DIOGO VENTURA/OBSERVADOR

Reino Unido quer dar mais poder a farmácias para aliviar centros de saúde. Seria possível em Portugal?

As farmácias britânicas poderão vir a fazer diagnósticos e prescrever medicação. Em Portugal, os farmacêuticos veem com bons olhos medidas semelhantes, mas os médicos dizem que seria "retrocesso".

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Com a região de Lisboa e Vale do Tejo a arrastar o país para uma situação em que a falta de médicos de família (dois terços da população, 1,1 milhões de pessoas, não tem clínico) preocupa, e com muitos utentes arredados do acesso a consultas, estão já em cima da mesa soluções para minimizar o problema. Ao Observador, a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (ARSLVT) admite “encarar com preocupação o problema da carência de médicos, uma vez que a formação destes profissionais demora o seu tempo”. E adianta adianta que “tem estado a recorrer a soluções que visam aumentar a capacidade de resposta das suas unidades”.

Nessas soluções inclui-se o Atendimento Complementar, protocolos com Instituições Particulares de Solidariedade Social ou a contratação de médicos reformados, nota a ARSLTV, destacando que, no último concurso, que ocorreu em janeiro, foram colocados “37 médicos que, até meados de abril, integraram nas suas listas um total de 46.248 utentes”. Ainda assim, um reforço insuficiente para compensar as aposentações e as saídas e que não travou, nos últimos meses, o aumento da população sem médico na região de Lisboa.

E é, precisamente, neste contexto, de falta de médicos, e sem um reforço substancial de recursos humanos previsto para breve, que se equacionam outras soluções a nível nacional, que passam, por exemplo, e como há muito pedem os farmacêuticos, pelo reforço das competências destes profissionais, em articulação com os centros de saúde, respondendo às necessidades da população. Mas não um reforço tão significativo de competências, como aquele que começou recentemente a ser discutido no Reino Unido que, também a braços com a escassez de médicos, pode ir mais longe e dar aos farmacêuticos poder para fazerem diagnósticos e prescreverem medicação aos utentes em casos pouco graves.

Em Portugal, além das medidas já pensadas, seria possível implementar uma reforma semelhante à que está a ser discutida em Londres, onde infeções urinárias, por exemplo, poderiam ser tratadas na farmácia, sem recurso ao médico de família? O Observador falou com os vários intervenientes (farmacêuticos, médicos de família e Ministério da Saúde) e as opiniões dividem-se — tanto médicos como o governo mantêm cautelas quanto a este tema.

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Aqui, tal como lá, a ideia é controversa. Os representantes das duas classes profissionais envolvidas, os farmacêuticos e os médicos de Medicina Geral e Familiar, divergem quantos aos méritos de uma reforma que permite aos farmacêuticos fazerem diagnósticos e prescreverem medicação em casos considerados pouco graves.

Farmacêuticos aceitam mais competências, médicos falam em “retrocesso”

Contactados pelo Observador, a Associação Nacional de Farmácias (ANF) e a Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar (APMGF) assumem posições opostas quando questionadas sobre este tema. Os farmacêuticos defendem que Portugal deve adotar uma reforma semelhante à britânica. “Já tínhamos proposto algo semelhante. As farmácias são uma porta de entrada e podem ajudar a reduzir a pressão sobre os serviços de saúde. Há muitas situações que podem ser tratadas nas farmácias”, defende Ema Paulino, presidente da ANF.

"Há muitas situações que podem ser tratadas nas farmácias”
Ema Paulino, presidente da Associação Nacional de Farmácias

Com base em protocolos que teriam de ser discutidos, ressalva, a responsável acredita que seria possível “estabelecer situações em que o farmacêuticos fizessem uma avaliação, prescrevessem o medicamento adequado e fizessem a respetiva comunicação ao médico assistente do utente”.

Entre as situações que poderiam ser avaliadas por um farmacêutico estariam as “infeções respiratórias, infeções urinárias não complicadas, problemas dermatológicos, oftalmológicos e otorrinolaringológicos”, enumera Ema Paulino.

Já a associação dos médicos de família diz estar em desacordo e considera a possibilidade de os farmacêuticos prescreverem medicação sujeita a receita médica “um verdadeiro retrocesso”. “Colocar outros profissionais a fazer tarefas de médicos de família é claramente errado. Cada um de nós tem as suas competências”, reage Nuno Jacinto, presidente da APMGF.

Utentes aguardam por uma consulta na Unidade de Saúde Familiar Rainha D. Leonor, nas Caldas da Rainha, 24 de fevereiro de 2021. O dia a dia na Unidade de Saúde Familiar, um ano após o início da pandemia da covid-19, que obrigou a novas formas de atender doentes por parte dos médicos de medicina geral e familiar. (ACOMPANHA TEXTO DA LUSA DO DIA 28 DE FEVEREIRO DE 2021). CARLOS BARROSO/LUSA

Médicos de família defendem maior ligação às farmácias mas rejeitam que estas prescrevam medicação sujeita a receita médica

CARLOS BARROSO/LUSA

O médico alerta que, por exemplo, os farmacêuticos “não vão saber que antibiótico receitar” e deixa uma pergunta: “E depois quem é que se responsabiliza?”

Assumindo a escassez de médicos de família, Nuno Jacinto defende que passar a responsabilidade para as farmácias em alguns casos não é uma forma de resolver o problema. “Se um dia não tivermos juízes vamos colocar professores a fazer julgamentos?”, questiona Nuno Jacinto, defendendo, apesar disso, que deve “existir uma maior ligação entre as farmácias e outros setores de saúde”.

Países anglo-saxónicos inauguram o debate

A verdade é que começam a surgir, em alguns países, como o Reino Unido, o Canadá ou a Austrália, projetos para implementar este tipo de reformas. No caso do Reino Unido, o objetivo é aliviar os centros de saúde já a partir do próximo inverno, uma vez que, tal como Portugal, aquele país enfrenta uma escassez de médicos de família. E, acredita o governo, as farmácias podem assumir um papel importante para melhorar a resposta assistencial.

O executivo britânico quer que as farmácias prescrevam medicação, inclusive aquela que neste momento só pode ser dispensada com receita médica — como antibióticos –, para problemas de saúde comuns. Desta forma, e segundo o projeto apresentado, os farmacêuticos poderão prescrever medicação, que atualmente só pode ser receitada por um médico, para sete patologias: dor de garganta, otite, sinusite, infeção urinária não complicada, impetigo, picada de inseto e herpes zoster.

No caso do Reino Unido, desde 2015 que o número de médicos de família tem vindo a diminuir, havendo neste momento mais de 4000 vagas por preencher. Embora numa escala menor, é o mesmo problema de Portugal — aqui faltam mais de 1000 clínicos nos centros de saúde e quase 1,7 milhões de utentes não têm, neste momento, médico de família.

Número de utentes sem médico de família volta a aumentar, são quase 1,7 milhões. “Nada tem sido feito para inverter o rumo”, acusam médicos

No entanto, o executivo britânico, liderado por Rishi Sunak, dificilmente vai obter um consenso entre farmacêuticos e médicos para avançar com a medida, que, defende, permitiria aliviar os centros de saúde do país, pressionados por uma elevada procura de cuidados de saúde e sem médicos de clínica geral suficientes para dar resposta a todos os pedidos.

“Colocar outros profissionais a fazer tarefas de médicos de família é claramente errado"
Nuno Jacinto, presidente da Associação Portuguesa de Medicina Geral e Familiar

O objetivo seria libertar os médicos de clínica geral da realização de 15 milhões de consultas nos próximos dois anos. Isto numa altura em que milhões de pessoas já esperam mais de duas semanas para ter uma consulta depois da marcação. Trata-se de uma evolução negativa e que vai em sentido contrário à promessa que o primeiro-ministro britânico tinha feito no início de 2023: a de reduzir as listas de espera no NHS (o serviço nacional de saúde do Reino Unido).

Segundo a proposta que vai ser apresentada para discussão, passaria também a ser permitido às farmácias passarem receita para contracetivos orais, uma medida que pode vir a beneficiar cerca de meio milhão de mulheres britânicas, que deixam de ter de consultar um médico ou enfermeiro para aceder à contraceção.

Já no Canadá, desde o início deste ano que os farmacêuticos da província de Ontário, a mais populosa do país, podem prescrever medicamentos para 13 problemas de saúde sem aprovação prévia de um médico. Entre estas estão as infeções urinárias, mas também as entorses, hemorróidas, cólicas menstruais, urticária, conjuntivite ou refluxo. E a partir do outono deste ano a lista estende-se à acne ou a infeções fúngicas, por exemplo. O Observador contactou o gabinete do ministro da Saúde canadiano, Jean-Yves Duclos, para perceber que ganhos o sistema de saúde poderá retirar da medida, não tendo recebido resposta atá à publicação deste artigo.

Já na Austrália, o governo de Camberra deu, no início de 2022, luz verde a um projeto semelhante no estado de Queensland, em que os farmacêuticos comunitários podem avaliar doentes e prescrever medicação para 23 condições médicas. No entanto, os profissionais que quisessem participar teriam de realizar um curso pós-graduado, que incluía 120 horas de treino de prescrição supervisionada por médicos.

Ministério quer melhorar acesso à medicação mas medidas tardam a chegar ao terreno 

O Observador questionou o Ministério da Saúde sobre a possibilidade de Portugal introduzir uma reforma semelhante à que está a ser discutida no Reino Unido, tendo perguntado ainda se a tutela está atenta ou a analisar outros modelos ou medidas destinados a combater a falta de acesso dos utentes aos serviços de saúde (por exemplo, já implementados noutros países). No entanto, o organismo liderado por Manuel Pizarro não respondeu a estas questões, mesmo após várias insistências. Em vez disso, o o Ministério preferiu destacar duas medidas, inscritas no orçamento de estado para 2023, e que, diz, visam facilitar o acesso dos doentes aos medicamentos. No entanto, ainda nenhuma delas chegou ao terreno.

Uma diz respeito à distribuição de medicamentos em proximidade. O Ministério estima que esta medida poderá beneficiar entre 150 a 200 mil pessoas, “a quem será poupada uma deslocação mensal ao Hospital que, por vezes, implica percorrer centenas de quilómetros” para levantar a medicação para várias doenças, desde as oncológicas até às autoimunes. O ministério adianta que a medida está a ser “ativamente trabalhada pelas diferentes instituições envolvidas” mas não se compromete com um prazo para começar a ser aplicada.

A outra diz respeito à renovação da medicação crónica nas farmácias. A medida, que, tal como a primeira, ainda não entrou em vigor, está a ser “operacionalizada”, como adiantou a presidente da Associação Nacional de Farmácias. Uma vez no terreno, a tutela espera que possa”simplificar a vida de cerca de 150 mil doentes”, que atualmente têm de se deslocar aos centros de saúde para renovar a medicação crónica. O Ministério esclarece ainda que “será facilitada a comunicação entre o farmacêutico e o médico assistente, de modo a introduzir eventuais correções e a aperfeiçoar a reconciliação terapêutica”.

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