Rui Pedro Fonseca e Castro foi afastado das funções de magistrado no final de março. O Conselho Superior da Magistratura decidiu suspender o juiz depois de Fonseca e Castro ter interrompido uma sessão em tribunal, num caso urgente de violência doméstica, devido à recusa de o procurador e o funcionário judicial que estavam em tribunal se terem recusado a retirar as suas máscaras — como exigia o magistrado. A partir daí, o juiz protagonizou vários vídeos, divulgados nas redes sociais, em que contestava as regras em vigor para controlar a propagação do novo coronavírus. E, já no final do mês de maio, na página Habeas Corpus do Facebook, publicou um novo vídeo focado na questão do consentimento informado dos cidadãos vacinados contra a Covid-19.

Juiz anti-máscara suspenso pelo Conselho da Magistratura. “Vou ter mais tempo para ajudar a população a fazer valer os seus direitos”

Nesse testemunho — onde reflete sobre o “consentimento informado” e acaba por repetir uma série de informações já desmentidas por verificações feitas pelo Observador, entre as quais uma suposta alteração genética que as vacinas produzem no organismo do ser humano —, Fonseca e Castro aborda outro ponto: “É-lhes dito [a quem é inoculado com uma destas vacinas] que se mantenham abstinentes de relações sexuais por um período de 30 dias após a toma da injeção?”, questiona-se o juiz.

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É verdade que quem está a ser vacinado com a vacina da Pfizer deve manter-se abstinente? Não, pelo enquadramento que o magistrado utiliza. Vejamos: Fonseca e Castro refere-se a todas as pessoas que estão, neste momento, a ser vacinadas contra a Covid-19. Mas a referência à necessidade de garantir um determinado período de abstinência sexual surge no protocolo de ensaios da Pfizer, a farmacêutica visada na intervenção de Fonseca e Castro — portanto, ainda numa fase de testes e antes de a vacina ser disponibilizada de forma universal.

Fact Check. Pfizer informou que vacina traz risco de má formação nos bebés?

Desse ponto de vista, esse argumento, que começou a circular associado à ideia de que existiria um risco de malformação para os fetos, estaria errado. Desde logo, a Pfizer começou a ser administrada em Portugal no final de dezembro do ano passado e não há, até ao momento, qualquer registo de fetos com malformação por serem fruto de relações sexuais com homens vacinados com esta vacina.

Mas o próprio argumento de que os participantes no teste são obrigados a um período de abstinência (se tivesse sido essa a formulação do magistrado) careceria de contexto. No documento em questão, a farmacêutica refere-se, de facto, a um período de abstinência sexual. Numa fase de testes, e quando os efeitos da vacina para o organismo ainda estavam a ser estudados, a farmacêutica considerava prudente que não houvesse troca de fluídos entre um homem que tivesse participado nos ensaios e uma mulher em idade fértil.

Ao Observador, o médico farmacêutico Hélder Mota Filipe explica que, “por precaução, nas vacinas e noutros medicamentos é colocada esta condição” aos participantes em ensaios clínicos “de evitar a gravidez porque não dispomos ainda de toda informação” sobre o fármaco. “São mais os ensaios clínicos com esta condição do aqueles que não a impõem”, assegura o membro da Comissão Executiva Comissão de Ética para a Investigação Clínica (CEIC).

Em alternativa, a Pfizer referia também a possibilidade de os homens que participassem nos ensaios clínicos poderem manter a atividade sexual com mulheres em idade reprodutiva, desde que recorressem ao uso de preservativo — ou, ainda, a outros tipos de métodos contracetivos que garantissem a não fecundação dos óvulos. Por outro lado, aquilo que efetivamente se exigia como medida a cumprir era que os homens não doassem esperma nos 28 dias seguintes à inoculação.

Mas, sublinhe-se, estas condições colocavam-se na fase de ensaios. “Quando estamos nessa fase, é diferente. Agora, as vacinas estão aprovadas em respeito pelas condições do resumo das características do medicamento”, isto é, do documento que é disponibilizado aos profissionais de saúde (no caso da população geral, esses dados estão disponíveis no folheto informativo de cada fármaco). E em nenhum desses documentos é registado qualquer impedimento à atividade sexual das pessoas que recebam a vacina da Pfizer.

Conclusão

A referência aos 28 dias de abstinência sexual aplicava-se a quem participasse nos ensaios clínicos da Pfizer. Fonseca e Castro sugere que essa exigência se mantém e que se aplica num contexto em que a vacina já está a ser disponibilizada de uma forma universal. Não é verdade.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ENGANADOR

No sistema de classificação do Facebook este conteúdo é:

PARCIALMENTE FALSO: as alegações dos conteúdos são uma mistura de factos precisos e imprecisos ou a principal alegação é enganadora ou está incompleta.

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