“Está decidido”, garante-se nas redes sociais. As vacinas de mRNA vão ser “adicionadas a alimentos, animais e leite”. Uma publicação no Facebook partilha a dita “agenda” para 2030, com o título “Coma uma salada e vacine-se“, e ainda dá outros dois exemplos sobre como alegadamente funcionaria esta nova tecnologia: “Coma uma vaca e vacine-se” ou “beba um leite e vacine-se”.

Fact Check Vacinas Alimentos

Publicação de Facebook que alega uma teoria de vacinação através de adicionar mRNA em alimentos

Depois da introdução é partilhado um vídeo com o seguinte título: “Vacinas de mRNA serão adicionadas a alimentos e animais.” É dobrado de inglês para português com recurso a uma aplicação e apresenta a tese de Aaron Kheriaty, psiquiatra e especialista em ética na medicina, que alerta para uma mudança do paradigma médico que daria o “nível de controlo sobre as liberdades das pessoas com que os ditadores do passado apenas sonharam”.

Vamos então por fases. Quem é Aaron Kheriaty? O psiquiatra dedica grande parte das suas redes sociais a publicações relativas à pandemia de Covid-19. Afixado está o tweet no qual promove o seu livro “The New Abnormal: The Rise of the Biomedical Security State”, ou, numa tradução livre “O Novo Anormal: A Ascensão Do Estado de Segurança Médica” e assinala um ano, desde que a Escola de Medicina da Universidade da Califórnia o demitiu por não cumprir com as regras relativas à vacinação contra a Covid-19.

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Além do historial crítico de Aaron Kheriarty contra as vacinas e as medidas restritivas contra a Covid-19 (que levaram até à sua demissão da Universidade da Califórnia) importa assinalar que o psiquiatra não pode ser considerado especialista em vacinação, uma vez que não tem nenhuma formação nesse campo e que não encontramos nenhum registo nas suas redes sociais ou nos seus trabalhos académicos sobre a vacinação contra a Covid-19 através de alimentos.

Então, o que dizem os especialistas? Miguel Castanho, professor e cientista do Instituto de Medicina Molecular de Lisboa admite, ao Observador , que ainda que a imunização possa ser feita por via oral, não pode ser feita através de alimentos. Particularmente quando o tema são as vacinas de mRNA, a teoria de vacinação através de alimentos “é totalmente falsa“. Por um lado, o RNA “é uma molécula frágil (daí exigir frio intenso para ser conservado) e não resiste à digestão nem é absorvido pelo corpo de forma intacta”. Além disso, também “os alimentos frescos que comemos têm o RNA próprio das suas células, tal como as proteínas ou gorduras” e, tal como o RNA é degradado na digestão e não é incorporado no nosso organismo, o “eventual RNA de uma vacina adicionado a alimentos é degradado e não produz qualquer efeito“.

A explicação de Miguel Castanho está alinhada com explicações recolhidas por outros fact checkers internacionais. Especialistas ouvidos pela Reuters concordam que o mRNA presente na comida não resistiria à digestão. Já especialistas ouvidos pela Associated Press garantem que não são usadas vacinas de mRNA na indústria pecuária dos Estados Unidos.

Conclusão

Não há nenhuma validade científica na teoria de que estão a ser adicionadas “vacinas mRNA a alimentos e animais” para continuar a vacinar a população contra os efeitos da Covid-19. O vídeo que está a ser partilhado nas redes sociais não apresenta fontes credíveis ou especializadas no assunto. E especialistas, como Miguel Castanho, explicam ao Observador que a publicação incorre em dois erros: não só o RNA “não resiste à digestão”, como mesmo se isso fosse possível, ele seria degradado e não produziria qualquer efeito no organismo humano.

Assim, de acordo com o sistema de classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

De acordo com o sistema de classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

NOTA: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook.

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