As autoridades judiciárias espanholas foram o mais duro que a lei permitia com os líderes catalães envolvidos nos episódios que levaram à crise separatista. Seis deles foram acusados pela Fiscalia General (o equivalente à Procuradoria Geral em Portugal) de rebelião, sedição e má gestão de dinheiros públicos, com uma moldura penal que pode ir até 30 anos – a mais pesada prevista pelo código legislativo para suspeitos de crimes desta natureza. Foram chamados a depor 14 indiciados, entre conselheiros do governo e membros da mesa do parlamento regional. A maioria ficou em prisão preventiva.

E Puigdemont? Fugiu e permaneceu em Bruxelas. Quis ser líder de um golpe de estado separatista e falhou em toda a linha. Por quatro razões. Primeiro, porque lançou um desafio monumental a Madrid e, até ver, perdeu a batalha. Ao principio, conseguiu os seus intentos porque, apesar do governo estar protegido pela legalidade e as regras do estado de direito, caiu no erro de usar força desproporcional contra a população (ou pelo menos assim pareceu, pelas imagens que correram mundo). Mas assim que isso deixou de acontecer – quando Marianao Rajoy deu um prazo à Generalitat para o esclarecimento da proclamação de independência e da sua imediata suspensão, o que marcou um volte-face na política de Madrid ­­–, Puigdemont perdeu a força. Mostrou que sem opositor aguerrido teria muita dificuldade em fazer política.

Em segundo lugar, porque no dia 28 de outubro, quando acabava o prazo para os esclarecimentos a Madrid (e ao mundo), mostrou estar refém dos partidos da coligação. Percebeu-se que Puigdemont terá tentado uma solução de compromisso com o governo central (preparava-se para convocar eleições antecipadas), mas que foi impedido por membros mais radicais do Juntos pelo Sim. É verdade que em coligações funcionais todos os membros, proporcionalmente, têm uma palavra a dizer. Mas as posições públicas, especialmente nestas circunstâncias, não têm força nem credibilidade na desunião. Especialmente quando se percebe que o partido que detém a maioria dos lugares no parlamento é controlado por partidos mais pequenos.

Em terceiro lugar, Puigdemont perdeu a rua e os eleitores catalães. As sondagens mais recentes mostram duas tendências: (1) uma percentagem significativa dos catalães que se declara a favor da independência não acredita que os métodos usados até aqui levem à secessão que ambicionam. E (2) os eleitores deixaram de acreditar na capacidade política do PDeCAT (o partido de Puigdemont). Cai a pique nas intenções de voto, especialmente para a ERC, os republicanos de tradição independentista.

Neste contexto – e este é o quarto ponto – Puigdemont tinha duas saídas possíveis: assumia as suas responsabilidades e comparecia em tribunal, o que até lhe podia granjear um estatuto de um certo martírio pela causa que defende, ou fugia para se preservar dos eventuais castigos da justiça espanhola. Optou pela segunda possibilidade. E assim caiu pelo seu próprio pé, sem glória, e sem ser empurrado por ninguém.

Agora, de Bruxelas, Puigdemont critica aquilo a que chama “repressão política” dos tribunais e diz que o estado espanhol atenta contra a democracia. Mas bem pode dizer o que quiser, que, pelas suas próprias escolhas e como as sondagens mostram, caiu em descrédito. Por muito que me desagrade a atitude de Puigdemont, Espanha e a Catalunha estão melhor sem ele. Ser líder seja daquilo que for, e mais ainda de um movimento separatista, não é para quem quer. É para quem está disposto a pagar o preço pelos seus atos.

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