Durante quase uma semana os franceses fizeram conferências de imprensa não para serem ouvidos pelos jornalistas ou pelos adeptos, mas por Deus, o destino, o acaso, quem quer que seja o responsável por tecer os fios das vidas humanas: “Nós aprendemos a lição. Não seremos sobranceiros. Respeitaremos o adversário. Os jogos ganham-se em campo”, etc, etc, etc. Depois da tragédia de Paris, em que o universo serviu-se de um tal Éder para ensinar uma lição a toda a gente, incluindo os portugueses, ninguém na equipa francesa queria voltar a passar por uma situação semelhante. Estavam dispostos a tudo, até a um acto público de contrição muito contrário ao espírito da “grandeur”.

Diz-se que quando Voltaire estava a morrer os padres pediram-lhe que renunciasse a Satanás, ao que o escritor e filósofo terá respondido: “Não é hora de fazer novos inimigos.” Voltaire toda a vida combateu o pensamento supersticioso. Porém, se os jogadores franceses aprenderam dele alguma lição foi a de evitar fazer novos inimigos em momentos inoportunos. Pelo sim, pelo não, antes que o destino lhes pregasse outra partida, içaram a bandeira branca e pediram tréguas ao karma.

O karma, sempre atento às acções humanas, presenteou-os liberalmente na primeira parte: um auto-golo e um penálti, vá, generoso. Num Mundial em que foi batido o recorde de auto-golos seria quase criminoso que na final não houvesse um. O feliz contemplado foi Mandzukic. Logo ali se soube que ele haveria de marcar um golo porque, diz o senso comum, quem marca auto-golo depois é compensado com um golo na baliza certa. Perisic empatou o jogo, mas como o que Deus dá, Deus tira, foi o mesmo Perisic que levou com a bola no braço depois de um canto. Alertado pelo VAR, Néstor Pitana correu para o ecrã e, depois de muita câmara lenta, veio em passo de corrida com a decisão inapelável. Griezmann, frio como o inverno siberiano, facturou. Ao intervalo, a França tinha feito um remate e dois golos, numa taxa de aproveitamento de 200%.

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