Amor e sexo no século XXI
Se antes o convite era mais formal, depois caímos na obsessão do contacto físico imediato. Como resultado temos pessoas a sofrer porque sentem que fazem o que não querem, mas não sabem fazer diferente
É constrangedor e dá-me pena ver tantos destes concorrentes desesperados pela pressão que sofrem pois querem que tudo corra bem, mas não dão espaço ao outro, nem se conhecem a eles mesmos.
Para quem não conhece, “Casados à primeira vista” é o mais recente “reality show” da SIC. Em que consiste? Procura a sua cara metade e quer casar? Alguns especialistas, desde psicólogos a coaches de relações indicam-lhe o seu “match” perfeito e vai conhecer na cerimónia de casamento a pessoa com quem passará o resto dos seus dias. Depois do enlace, o casal segue diretamente para a lua de mel e será exposto a muitos desafios por parte da equipa de especialistas, bem como acompanhados pelos mesmos ao longo de várias semanas.
O programa despertou a minha atenção logo no primeiro momento, mas também achei obviamente um disparate. Como é possível casar-se com alguém que não conhecemos nem escolhemos? Mais tarde, reconheci que o programa não aparece por acaso. Para ter uma opinião, gosto de investigar e ouvir várias perspetivas e não me pareceu que fosse o “BBC Vida selvagem” que são a maioria dos reality shows. Eu e a minha mulher temos sido assíduos espectadores.
Não me revejo totalmente, também, no chorrilho de opiniões de “especialistas” que logo acorreram a deitar abaixo o programa. Concordo com eles em que o programa não faz sentido como forma real de se casar, outro assunto é que é impossível haver instrumentos de “matching” eficazes. Dos que conheço e da experiência de 3 anos e 50.000 pessoas que estão no site de online dating que giro, é muito possível o matching ser eficaz. E pergunto a estes senhores, o que dizem deste artigo científico que aponta que 1/3 dos casamentos nos EUA já começam online (e baseados em instrumentos de matching), há evidências de que estes casamentos são mais fortes e além disso que aumentam o casamento inter-racial.
Também sugeria que estes especialistas se pudessem atualizar, lendo também este artigo do The Economist. Senhores, estamos no século XXI. E por ser católico, não quer dizer que não aproveite o que tem de bom este meio e ajude muitos casais a realizar os seus sonhos.
O online dating e este programa têm, por isso, pontos de contacto. Então em que ponta é que se lhe pode pegar este programa? Há um contexto sociológico em que aparece:
Porque não funciona e a ideia do programa é desastrosa:
O namoro serve para isto: crescer consciente mas livremente, preparar-se para a relação, conhecer-se a si próprio e ao outro, dar o seu tempo aos demais e aos seus gostos pessoais. Só quem se conhece e se ama, pode amar, dar algo que recebeu e receber do outro. É constrangedor e dá-me pena ver tantos destes concorrentes desesperados pela pressão que sofrem pois querem que tudo corra bem, mas não dão espaço ao outro, nem se conhecem a eles mesmos. Falo da Eliana e do Hugo, por exemplo. Vê-se que transportam inseguranças graves e “enjaulam” literalmente o “cônjuge” com o seu controlo.
Em resumo, mesmo que existam condicionalismos sociológicos a ter em conta, esta é uma experiência a evitar por qualquer pessoa que queira encontrar a cara metade. Já o online dating, tem muitas virtudes, como demonstrei.
António Pimenta de Brito formou-se em Língua e Cultura Portuguesa (língua estrangeira) pela FL-UL e depois fez um MBA em gestão, no ISEG-UL e o 1º ano de PhD em Gestão no ISCTE-IUL. Tem trabalhado em empresas nos últimos 12 anos. Fez formação em Comunicação na Harvard Kennedy School e na European Dignity Watch, em Bruxelas. Recentemente tornou-se empreendedor e docente ao criar a primeira Pós-Graduação em Portugal em Gestão de Organizações Religiosas, no ISEG-UL e é atualmente corresponsável pelo site internacional em língua portuguesa, fundado na Áustria, www.datescatolicos.org, dá palestras e escreve sobre o tema das relações e casamento.
Se antes o convite era mais formal, depois caímos na obsessão do contacto físico imediato. Como resultado temos pessoas a sofrer porque sentem que fazem o que não querem, mas não sabem fazer diferente
O casamento não é apenas uma vivência de duas pessoas numa casa, onde partilham contas e tratam de crianças. Nessa lógica, substituíamos os cônjuges por irmãos ou simples cuidadores de crianças.
A prática cada vez mais comum de beijar os filhos na boca não será uma violência? Será que tal prática não vai prejudicar a sexualidade saudável que terão estas crianças em adultos?
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