Outdoors gigantes com a frase Birds aren’t Real começaram a aparecer em grandes metrópoles dos EUA, como por exemplo na cidade de Los Angeles, anunciando um movimento cujo propósito visava a tomada de consciência das pessoas para o facto de que as aves já não seriam animais reais, como outrora foram, mas sim drones comandados pelo governo norte americano com o intuito de vigiar os cidadãos, sem o seu conhecimento, nem tão pouco consentimento.

O movimento, em inequívoca ascensão desde a sua criação em 2017, haveria de reunir, ao longo dos últimos anos, milhões de seguidores nas redes sociais. Muitas das publicações associadas ao movimento haveriam de vir a ser consideradas virais, dado o número exacerbado de visualizações e partilhas associadas. Milhões de pessoas, entre elas uma parcela muito significativa de jovens, haveriam de aderir ao movimento envolvendo-se na divulgação das ideias que estiveram na origem da sua criação, disseminando, quais acólitos, essas mesmas ideias pela restante população, esperando assim engrossar fileiras de apoiantes e crentes.

Da organização à participação em comícios, da forte presença no mundo das redes sociais à aposta no merchandising, Peter McIndoe, o fundador do movimento, tudo fez para que a crença nas ideias primordiais subjacentes ao mesmo fossem inquestionáveis, desafiando para isso todos os que punham em causa o dogma que lhe estava directamente associado.

No passado mês de Novembro, o movimento, num dos pontos altos da sua actividade, organizou um protesto à porta dos escritórios do Twitter exigindo que a empresa mudasse o icónico logótipo, por este retratar uma ave. Nesse protesto, a denominada Brigada das Aves, constituída por seguidores acérrimos do movimento, alertava, ruidosamente e com convicção imperturbável, para a teoria da conspiração associada a estes animais, cuja existência como seres vivos há muito tempo havia findado para dar lugar a um diabólico sistema de vigilância governamental omnipresente, bem ao jeito das histórias escritas por George Orwell.

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Tudo isto é absurdo, pensarão muitos, mas a verdade é que o movimento Birds aren’t Real poderia ter continuado a prosperar e aglomerar seguidores aos seus princípios e doutrina se o seu fundador não tivesse, numa entrevista recente, desmentido os pressupostos subjacentes ao movimento por si criado bem como a sua consequente veracidade.

Depois de quatro anos de pretenso activismo convicto, Peter McIndoe veio a público admitir que o movimento Birds aren’t Real foi totalmente ficcionado por si e que a sua perpetuação no tempo se deveu única e exclusivamente ao clima de desinformação que grassa e caracteriza os tempos em que vivemos. A sua intenção terá sido tentar combater o absurdo recorrendo ao absurdo, tentando destruir a desinformação com o recurso a essa mesma desinformação.

Depois da revelação surpreendente, o criador do movimento espera agora colaborar com todos aqueles que queiram fazer do mundo um lugar melhor e tenham o desejo de usar as ferramentas disponíveis na internet de forma adequada para esse propósito, combatendo de todos os meios e formas as pretensas notícias falsas e evitando que movimentos como este possam eclodir e singrar.

Apesar de serem compreensíveis os propósitos da patranha por si engendrada, parece ser cada vez mais sinuoso e difícil, seja qual for a estratégia passível de ser adoptada, resgatar as pessoas da tentadora crença no absurdo. Isto porque vivemos numa época em que uma franja muito significativa de pessoas subscreve cegamente uma compreensão do mundo que assenta exclusivamente na internet e nos conteúdos que são disponibilizados nas redes sociais, sendo que para além disso não existe para elas qualquer substrato de entendimento do mundo envolvente que mereça crédito sobreponível ou para o qual disponham de capacidade intelectual e tempo para investirem.