Uma das características mais enraizadas da esquerda é a presunção de uma superioridade moral inatingível. Como se tivessem, muitos deles, sido banhados à nascença num caldeirão de água benta. Como se a bandeira «ética republicana» lhes fosse especialmente reservada, enquanto todos os outros são por ela ignorados.

Na esquerda estão os valores; na direita estão os interesses. Na esquerda estão as convicções; na direita está a hipocrisia. Na esquerda está o altruísmo; na direita está a egoísmo. É este o mantra: de um lado os bons princípios, do outro estão os maus.

Assim, sempre que se depara com um anjo caído, a esquerda precisa de fabricar um spin, uma qualquer justificação para manter os crédulos bem fidelizados. Desta vez, com a demissão de António Costa – num dia sem precedentes na democracia portuguesa, com buscas em São Bento –, não foi diferente. Quando os eventos de terça-feira se iam encaminhando para o desfecho que a declaração das 14h15 confirmou, comecei a imaginar como – e por que voz – o Partido Socialista ia beatificar António Costa.

Não precisei de esperar muito. Carlos César – o mais despudorado socialista dos últimos 20 anos – veio marcar o tom. Sem se rir, César prestou “homenagem à exemplaridade do gesto e ao grande sentido de responsabilidade evidenciado” por Costa. E mais, elogiou a demissão do PM como um ato de “defesa da integridade plena das instituições que lhe coube e cabe defender”.

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Estava dado o mote para que o PS viesse chorar um líder que saiu como “estadista”. Só que não! Não saiu como “estadista”: saiu amedrontado, acossado, ciente da culpa – política, no mínimo – que tem. Saiu com o «rabo entre as pernas». Ou nunca teria saído. Jamais teria saído.

O António Costa de hoje não é o mesmo António Costa que se habituou a gozar na cara das evidências e a dizer frases como “à justiça o que é da justiça” ou “habituem-se, vão ser quatro anos”. O António Costa de hoje encontrou finalmente a parede e sente-se incapaz de a empurrar. Foi o mesmo António Costa que diligentemente impediu a transmissão de uma reportagem televisa precisamente sobre o tema que o faria cair – o escândalo do lítio em Montalegre. Foi o mesmo António Costa que obstinadamente, para não fazer a vontade do Presidente da República, manteve João Galamba no governo. Foi o mesmo António Costa que precisou de Diogo Lacerda Machado para lhe desenvencilhar o teatro da renacionalização da TAP – outro mau episódio que custou uma fortuna aos portugueses. Foi o mesmo António Costa que nomeou Vítor Escária como chefe de gabinete, mesmo depois de conhecer o prejuízo reputacional que poderia provocar.

Portanto, não, Carlos César: António Costa não defendeu a integridade nem mostrou sentido de responsabilidade. António Costa saiu pelo postigo, porque nem pela porta pequena conseguiria passar.

Um segundo ponto que importa realçar é o percurso semelhante dos três últimos primeiros-ministros socialistas. Guterres afogou-se no pântano; Sócrates afogou-nos na bancarrota; Costa foi afogado pela cobiça da esquerda dos interesses, sempre com mais olhos do que barriga.

Este governo, ainda em funções, não ajudou o país, mas é inegável que deixa um forte contributo para o anedotário nacional. Demissões ao ritmo de um speed dating, indemnizações milionárias, bicicletas a partir montras de ministérios, comissões de inquérito combinadas, culminando na detenção do chefe de gabinete do primeiro-ministro.

Isto não foi um governo, foi um tesourinho deprimente. Foram oito anos a cavar buracos. Medidas de habitação ruinosas, política de salários degradante, problema da imigração descontrolado, escândalo da TAP por resolver, processo de nacionalização/privatização da EFACEC vergonhosa, hospitais encerrados, professores destratados. O leque de números negativos não tem fim: 4 milhões de pobres, um dos piores índices de mobilidade social e a 2.ª maior dívida na UE, 34% de economia paralela, carga fiscal recorde, quase 2 milhões de portugueses sem médico de família, entre outros péssimos números.

Ainda assim, por incrível que pareça, há uma luz ao fundo do túnel. Sim, há mesmo.

Se os portugueses estão lembrados, é nestes tempos de absoluto caos, desesperança e ruína moral que a direita se revela salvadora. A história mostra que só a direita, com a forte participação do CDS, tem a capacidade e a vontade de levantar Portugal.

Se Costa saiu por um postigo, cumpre agora ao espaço do centro-direita construir uma alternativa para a esperança no futuro regresse à vida dos portugueses. Para que a esperança num país finalmente melhor entre pela porta grande.