O assunto em cima da mesa esta semana, e ao longo deste mês, acredito, será a adesão da Ucrânia à NATO. O modo como tal adesão será feita, as circunstâncias que a propiciarão e, passo fundamental, quando. Afinal, desde 2008, e com consequências nefastas para o país, a Ucrânia aguarda – Kaja Kallas, primeira-ministra da Estónia, foi clara: «nós não estamos em guerra porque pertencemos à NATO». Se a isto somarmos a adesão da Suécia e da Finlândia à NATO, ainda que não sejamos, e poucos de nós o serão, especialistas em relações internacionais, torna-se claro quem quer garantir a salvaguarda da soberania através do velho pacto transatlântico e quem ameaça essa soberania.

As sucessivas declarações de cada país sobre a adesão da Ucrânia à NATO dizem muito mais sobre a política externa e interna de cada país que as profere do que sobre o assunto em cima da mesa.

Alinham-se dois blocos: um propõe a adesão imediata da Ucrânia à NATO, na sua Cimeira anual, desta vez em Vilnius – e não será Vilnius por acaso; o outro adia essa adesão para quando um conjunto de circunstâncias se verificarem, entre elas o fim de uma guerra quente, se assim se pode dizer. Os primeiros acreditam que a paz, a segurança e a manutenção desta ordem mundial serão garantidas com a adesão imediata. Os segundos defendem que a Ucrânia deve ser apoiada militarmente durante o tempo que for necessário, mas sem adesão imediata para garantir que não há uma escalada mundial do conflito.

Tanto para uns quanto para outros, o artigo 5º do Tratado, «as partes concordam que um ataque armado contra uma ou várias delas na Europa ou na América do Norte será considerado um ataque a todas», é a chave do argumento. Essencialmente, quem defende a adesão imediata é quem tem fronteiras com a Rússia e/ou viveu sob o jugo, ou a influência, da União Soviética após a Segunda Grande Guerra e lembra ainda como foi o processo de libertação que o antecedeu e implementou. Não incluo em qualquer dos grupos os países em deriva populista e autocrática.

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Do muito que se pode dizer sobre esta guerra, detenho-me apenas nos seus elementos constantes no tempo e na acção, sendo o mais expressivo deles, Putin e o seu regime. Há mais de vinte anos que este homem e o seu governo são consistentes. As democracias, segundo o livro das acções putinistas, têm elementos fracos por onde podem e devem ser corrompidas pois o governo do mundo cabe aos fortes; tanto os grupos de esquerda quanto os de direita podem e devem ser manipulados para enfraquecimento das democracias e o favorecimento do regime putinista e dos seus aliados, os bullies da política; o tempo é o melhor aliado dos regimes não democráticos porque não estão sujeitos à legalidade do processo eleitoral, não dependem dos eleitores para garantir a manutenção do poder, assim, o tempo é um agente de erosão e desgaste; os media podem e devem ser manipulados para assegurar a manipulação da opinião pública e a manutenção do poder; qualquer acção pode ser travestida de interesse nacional, histórico, social, religioso, basta eleger adequadamente os bodes expiatórios e criar uma ficção congregadora. E o caso ucraniano, não é excepção. A Rússia de Putin fez um pacto com a Ucrânia, desrespeitou-o, reescreveu a história, minou o governo ucraniano, primeiro, apossou-se de território depois, ocupou-o, e finalmente invadiu o país. E fê-lo até Fevereiro de 2022 com a conivência dos seus parceiros comerciais: todos nós, no ocidente democrático e liberal.

Nós, para além das razões económicas, com a ideia de «fim da história», com o pretexto da ocidentalização e democratização da Rússia através das relações comerciais, não só o permitimos como facilitámos: a integração Russa no G7, sem que cumprisse os critérios, é exemplar. O modo como fechámos os olhos às advertências dos países Bálticos, e da Roménia e da Polónia sobre as intenções expansionistas da Rússia de Putin, bem como à sua interferência política através dos media e das redes sociais, com os ciberataques, e mesmo depois de 2014, responsabiliza-nos tanto quando esclarece o putinismo.

Putin, aliás, foi claríssimo logo em 2007, na Conferência de Segurança de Munique. Reiterou as suas próprias palavras em 2008, na Roménia, quando se referiu à Ucrânia como «um estado artificial». As consequências estão à vista, desde o fortalecimento dos populistas da Hungria, e da Polónia, desde 2015, na Europa cada vez mais polarizada, nos Estados Unidos divididos contra si mesmos, e de forma catastrófica na Ucrânia. Este é o preço da negligência.

Este mês é fundamental para a tomada de decisões sobre as quais o futuro assenta – por muitas razões e entre elas as eleições presidenciais dos Estados Unidos, no ano que vem.

Espero da NATO, em Vilnius, o convite para a Ucrânia se lhe juntar e indicações claras e exequíveis dos critérios a cumprir para, finalmente, a integrar.