A questão dos impostos é um tema que merece cada vez mais ponderada análise no âmbito das suas isenções.

No caso do IMI, todos os proprietários pagam este imposto, salvo algumas excepções que passam pela isenção, quer permanente, quer temporária. Para beneficiar da isenção deste imposto, as regras encontram-se definidas no Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) pelo artigo 11.A.

A isenção permanente é atribuída a famílias com baixos rendimentos (menos de 15.295€) e imóveis com valor patrimonial abaixo dos 66.500€.

No que diz respeito à isenção temporária, esta destina-se aos novos proprietários, ou seja, àqueles que compraram habitação própria recentemente. Esta isenção aplica-se durante três anos, desde que sejam cumpridas duas condições: o VPT do imóvel ser igual ou inferior a 125.000€ e o rendimento coletável do agregado não exceder os 153.300€ por ano.

Porém, a lei atribui isenções ao abrigo do Estatuto de Benefício Fiscais a várias entidades:

  • partidos políticos

  • igreja católica

  • associações religiosas

  • estados estrangeiros

  • instituições de segurança social

  • sindicatos e associações profissionais

  • instituições particulares de solidariedade social

  • escolas privadas

  • associações desportivas e juvenis

  • associações não lucrativas e de utilidade pública

  • monumentos nacionais e prédios classificados como de interesse público ou municipal

  • entidades públicas empresariais responsáveis pela rede pública de escolas

  • abastecimento e saneamento de águas

De facto, encontramos uma extensa lista de isenções que pode causar alguma perplexidade ao cidadão comum.

Os impostos, sejam eles receita do poder central, seja do poder local, como é o caso do IMI, devem obedecer, ou pelo menos tentar essa aproximação, ao princípio da justiça social. Isto é: com toda a legitimidade perguntará um qualquer pequeno proprietário porque razão paga ele IMI sobre o seu património imobiliário, enquanto os partidos políticos e mesmo as igrejas ou estádios de futebol, com um vasto conjunto de imóveis, estão isentos.

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É esta justiça fiscal, que deve ser ponderada em cada isenção que se pretenda dar. O tema do IMI para os estádios de futebol vem à boleia da tão famosa questão das barragens.

Na sua maioria, os clubes de futebol estão isentos desde imposto na medida em que se encontram revestidos de utilidade pública, sendo que os seus estádios são propriedade imobiliária dos clubes, sendo considerados imóveis de interesse municipal.

Hoje, os clubes de futebol, possuindo uma estrutura financeira e comercial semelhante a uma qualquer outra actividade empresarial, têm activos que procuram valorizar no seu mercado.

A sua gestão é meramente a procura dos melhores resultados financeiros que dependem dos resultados desportivos obtidos. O futebol é, de facto, um negócio, gera milhões de receitas, embora nas contas recentemente apresentadas à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, os leões tenham sido os únicos a apresentar um saldo positivo com um lucro recorde de 47,5 milhões de euros.

Não há volta a dar. Repito: o futebol é um negócio como tantos outros.

Ora, parece que a Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP) está “preocupada com o impacto financeiro” que a eventual cobrança de IMI aos recintos desportivos possa acarretar para os clubes, mas o que a Liga Portuguesa não percebe, ou não quer perceber, é que os clubes de futebol são aquilo que são: verdadeiras empresas com o objectivo essencial de obter cada vez mais prestígio no mercado na valorização dos seus activos, alienando-os quando possível e de acordo com o mercado com o máximo valor possível de mais-valias, encaixando avultadas quantias de euros. Em suma, um negócio como outro qualquer.

Aos estádios de futebol, que estão na esfera jurídica e patrimonial de pessoas coletivas de direito privado e de utilidade pública, as câmaras municipais não cobram o imposto de IMI.

Qualquer clube de futebol, tal como qualquer entidade privada, trata dos seus activos procurando a sua valorização. As escolas de futebol, a título de exemplo, não são mais que uma “fábrica” que “emprega” pequenos rapazes que almejam alcançar o sonho de serem jogadores profissionais.

Os grandes clubes tratam de ver em cada um deles o seu potencial, tirando total proveito dos melhores. Isto não é mais que semear um activo para que ele dê grandes frutos no futuro.

Toda a máquina que hoje qualquer clube de futebol monta tem um objetivo claro que é fazer dinheiro, prestigiando e valorizando a sua marca para que com isso se consiga obter os melhores resultados financeiros, tal como fará uma qualquer entidade privada obrigada a pagar todos os impostos inerentes à sua actividade comercial.

É certo que os pequenos clubes de futebol sobrevivem de facto através de apoios dos seus municípios, sendo que grande parte dos estádios não são da sua propriedade, encontrando-se sobre tutela das câmaras municipais.

Sendo o IMI uma receita do poder local, tal como é o IMT, podemos colocar a questão sobre o valor que os municípios portugueses deixam de cobrar em sede deste imposto.

Passando a fazê-lo, talvez se conseguisse reduzir, por exemplo, o valor a pagar em IMT na aquisição da primeira habitação periódica e permanente e, simultaneamente, talvez pudesse existir uma maior comparticipação na devolução de IRS às famílias.

Se grande parte das receitas municipais provém do IMT, existirá então uma janela que se poderá abrir através da tributação do património dos grandes clubes de futebol que poderá fazer uma compensação financeira em IMI pela redução em IMT.

No fundo, falamos de uma situação em que, para uns, nada haverá a fazer senão pagar, e em que, para outros, há isenções que, devendo ser revistas, são hoje inexplicáveis do ponto de vista da justiça fiscal.

Se há alguém que defenda, por exemplo, a isenção de IMI e de outros impostos aos partidos políticos detentores de elevado património imobiliário, então que explique muito bem a sua racio aos cidadãos obrigados a pagar este imposto. Ninguém explica pela razão de não existir explicação lógica e possível.

Por certo, o calcanhar de Aquiles que subjaz ao tema ‘IMI nos estádios de futebol’ reside num único aspecto: no conceito de utilidade pública. E, sim, é sobre este conceito que levanto sérias dúvidas, na medida e na forma como hoje é gerido um Sport Lisboa e Benfica, um Sporting Clube de Portugal ou um Futebol Clube do Porto.

Terão todos eles as características e o verdadeiro espírito daquilo que se pode considerar uma entidade de direito privado e de utilidade pública?

Não tecendo considerados sobre a promiscuidade entre o mundo do futebol e o mundo da política, parece ser importante que se possa debater o tema, revendo conceitos que hoje encapotam de forma legal uma importante receita pública.

Ou há moralidade ou comem todos