No ano passado escrevemos sobre os fogos conforme artigo do Observador de 5 de setembro, Fogos que caminho teremos que trilhar?.

Aproximando-nos perigosamente da época crítica de fogos que já nos começam a assolar, entendemos ser oportuno voltar a trazer este tema para o qual nos parece que é necessária uma compreensão holística, sendo crucial estudar, analisar e propor intervenções com uma abordagem integral, pró-ativa e a longo prazo e não só curativa (“apagar fogos”).

Se por um lado o fogo faz parte dos ecossistemas mediterrânicos, existe hoje um enorme desequilíbrio destes, provocado pelas alterações sócio económicas e de intervenção e alteração da paisagem prévia, pela intervenção humana (monoculturas, abandono rural de pessoas e animais, o declínio no uso da biomassa e do aumento da carga combustível nos terrenos entre outros), o que destrói as suas barreiras naturais, já que a progressão do fogo é diferente consoante as espécies vegetais que assim ardem mais ou menos depressa. O fogo adapta-se e ao adaptar-se gasta energia.

Por isso a biodiversidade (herbáceas, arbustos, árvores albergam seres vivos que são cruciais para nós e para o planeta) dos ecossistemas ajuda a atrasar o fogo.

As práticas atuais que usamos na plantação e na agricultura e opções estratégicas político-económicas condicionam o risco de incêndio, elevando-o.

A título de exemplo, existem vários projetos turísticos e de instalação de painéis solares, ou de construção de albufeiras que estão a destruir milhares de hectares de montado.

Por outro lado, ao longo das décadas recentes verificou-se no nosso país um crescente fluxo migratório para o litoral/cidades e ao consequente abandono dos territórios do interior, rurais, e à perda do conhecimento dos territórios abandonados (ileteracia territorial) e da capacidade e preparação de prevenir (muitas ignições são de origem humana inadvertida) e lidar com o fogo pelas populações (ileteracia geral), como outrora (conhecimento empírico).

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Se é verdade que tem sido feito um esforço para colocar mais meios e recursos de combate aos incêndios no terreno e de coordenação (perspetiva curativa), tem sido descurado o planeamento, investimento e intervenção na vertente educacional, bem como do ordenamento do território, porque é importante mudar o mosaico da paisagem atual (perspetiva pró-ativa).

Como dissemos no nosso artigo anterior e mantemos, é também crucial conhecer o parcelário do país e ter a situação cadastral dos terrenos atualizada.

As alterações climáticas de que falamos hoje recorrentemente, e que já todos constatamos e começamos a viver diretamente, devem-se principalmente à interferência e ação humana de quebra dos ciclos circulares naturais, nomeadamente o da água (de acordo com o Pacto Ecológico Europeu deverão até 2030 ser descomissionadas várias barragens por forma a libertar a água e o curso dos rios livres e naturais e repor a biodiversidade interrompida por estas). Ora, os incêndios aumentam o CO2 no ar o que aumenta a temperatura do ar e como tal potenciam novamente incêndios, num ciclo vicioso, por isso muito mais e para além de os apagar, há que ter uma estratégia de prevenção e mitigação por forma a reduzir o número e dimensão destes.