Catarina Martins, numa arruada no Porto, afirmou: “Ao contrário do André Ventura, eu nunca me escondi das pessoas nem me vou esconder. E o Bloco de Esquerda tem muito prazer em andar na rua na cidade do Porto livremente. E aqui, como estão todos a ver, anda-se em segurança, conversa-se com as pessoas e é assim que se aprende a resolver os problemas.”

É engraçado este comentário, pois faz parecer que um político para ser bom político deve ter a aprovação de 99,9% da população e a oposição nem vê-la. Quase como que um concurso de popularidade. Se um político tem perseguição, quer dizer que está a fazer um mau trabalho?

Ao contrário, o trabalho de um político tem a ver com representatividade. É natural e expectável que 99,9% da população não tenha as mesmas opiniões políticas. Então, votam em candidatos que os possam representar e velar pelos seus interesses nas decisões nacionais. Talvez um político represente 40% da população em quase todos os aspectos. Claro que em todos é impossível. Outro político representa as ideias de 20% da população. Esses políticos estão ao serviço da população que votou neles para defender os seus interesses quando se fazem as leis e se gere o dinheiro do Estado, enquanto estas pessoas estão ocupadas nas suas profissões variadas e não podem estar na Assembleia da República todo o dia.

Mesmo que um político represente só 2% da população, é um trabalho válido. Num governo democrático, em que todos têm voz e se quer esta representatividade, os assuntos são para ser discutidos e decididos civilizadamente, com diálogo. O PAN é contra as touradas e o Chega é a favor das touradas? Então o que se faz com as touradas? Expõem-se argumentos e vota-se, essencialmente. Não é a imposição da opinião única de um monarca, mas é o PAN a defender um lado e o Chega a defender o outro e resolve-se democraticamente. Numa sociedade com muita pluralidade de opiniões como aquela em que vivemos, é preciso ter em conta que há minorias a viver sob “a tutela” de quem os venceu a votos e que merecem respeito.

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É expectável que as pessoas que veem as suas ideias representadas pelo político X não gostem muito do político Y e vice-versa. E como as opiniões políticas são muito emotivas e tribais, este “não gosto de” pode-se traduzir em perseguição e até violência.

Às vezes ir para a política é correr perigo físico. Basta saber um pouco de história para perceber quantos regimes políticos são substituídos com sangue e que com um pouco mais de visibilidade parece que a cabeça fica a prémio. Hoje em dia, a maior parte das vezes não se corre perigo físico, mas corre-se o risco de perder a reputação, de perigo psicológico, de ser discriminado e sofrer represálias no trabalho.

Há uma razão pela qual as pessoas têm medo de apoiar publicamente um candidato, associar-se a um partido, dar a cara ou até de exprimir uma opinião política. Têm medo de se comprometer publicamente. De perder amigos. De perder mesmo o trabalho ou de ser maltratado.

Mas é muito importante que o façam. Ir para a política é como ir para a guerra. Antigamente matava-se a oposição, fazia-se um golpe de Estado, as coisas resolviam-se fisicamente. Agora é um jogo psicológico: mata-se a reputação do outro, diz-se mal da sua família. E pelo que se luta? Por essa representatividade nas decisões importantes que afetam as nossas vidas tão dramaticamente. E pela questão de sempre: a liberdade.

Se queres ter pequenas liberdades, tens que sofrer grandes sacrifícios. Tens que ir para a guerra. A liberdade não é algo que se ganha de uma vez por todas, mas uma luta constante. Os políticos que deveriam estar ao serviço e a representar quem votou neles têm a tendência de se agarrarem ao poder e ao prestígio em vez de se agarrarem à responsabilidade. Têm a tendência de se deixarem corromper. O governo tem a tendência de tomar muitas decisões pelas pessoas, tirando-lhes opções e tornando-se totalitário.

Diz Jordan Peterson, Professor de Psicologia na Universidade de Toronto e autor bestseller, num podcast, The Michael Knowles Show, a 18 de Setembro: “Os comentadores muito informados sobre estes Estados totalitários chegam a uma conclusão: um caminho muito directo e causal entre a proclividade do cidadão individual em falsificar a sua experiência, mentir por comissão e omissão, e a emergência destes Estados totalitários. A explicação que eles fazem não é económica nem política, mas sim psicológica e ética.” Peterson ficou famoso no Canadá por lutar pela liberdade de expressão e por se opor veementemente ao Estado na questão dos pronomes que podiam ou não ser utilizados.

Os Estados totalitários não acontecem de um dia para o outro, mas começam com pequenas limitações de liberdade de expressão e com medidas de controlo que se tornam progressivamente maiores. Para lutar contra esta tendência, mesmo quando as limitações são pequenas, é preciso sacrificar muito, nem que seja só a nível psicológico, da reputação, do trabalho, etc.

Ser político ou ser mais ativo politicamente é ir para a guerra e ninguém é particularmente feliz por fazê-lo. Geralmente, faz-se mais por sentido de responsabilidade, por arregaçar as mangas, porque alguém pediu “não ajudas?” e essa pessoa sentiu que o seu contributo poderia ser maior do que os riscos assumidos. Kayleigh McEnany, anterior secretária de imprensa da Casa Branca dos Estados Unidos, desafiou recentemente o seu pai nas redes sociais a concorrer a governador. Quando ele disse que não o queria fazer de maneira nenhuma, ela afirmou que existe um segredo na política para se saber quem irá fazer o melhor trabalho: é a pessoa que não quer esse trabalho.

Não há dúvidas: ser politicamente ativo, apoiar alguém ou manifestar opinião política não é como andar num carrossel na feira. Não é particularmente divertido e não é nada fácil. É ir para a guerra. Para ganhar a liberdade, em cada geração é preciso mesmo arriscar a vida. É mesmo assim. Parabéns aos guerreiros audazes que participaram nestas eleições.