O músico Caetano Veloso foi homenageado, pelo Estado português, com a medalha de Mérito Cultural, entregue esta semana pelo primeiro-ministro. No seu discurso, António Costa justificou a homenagem a partir de uma recordação de 1985, quando Caetano Veloso cantou um fado de Amália Rodrigues, momento que o primeiro-ministro descreveu como o “reencontro, o renascimento e a reabilitação do fado e de Amália aos olhos do público português” (uma vez que, desde a transição democrática, o fado havia ficado conotado com o regime do Estado Novo). Perdoem-me a frontalidade: a notícia deu-me a volta ao estômago. E, dois dias passados, constato como extraordinária — mas reveladora — a ausência de críticas ou protestos.
Em 1982, Caetano Veloso iniciou um relacionamento com uma menina de 13 anos (Paula Lavigne), com quem teve relações sexuais pela primeira vez na sua festa de 40º aniversário (são 27 anos de diferença de idade). A relação só foi tornada pública anos depois, em 1986, quando a rapariga já tinha 17 anos. Facto: em 1985, ano de referência do concerto em Lisboa que António Costa lembrou esta semana, Caetano Veloso mantinha uma relação amorosa e sexual com uma menor. De resto, não há qualquer dúvida sobre a relação ou os seus timings: Caetano Veloso e Paula Lavigne assumiram a relação, casaram-se (apesar de uma separação, hoje estão juntos) e foi a própria, em entrevista em 1998, quem partilhou os factos acima.
No Brasil, a relação de Caetano Veloso com uma menina de 13 anos foi sendo escrutinada repetidamente. Há quem argumente que, na década de 1980, ter relações sexuais com menores não era um crime previsto na lei brasileira, independentemente do consentimento (visto tratar-se de uma criança). Há quem considere que, não tendo havido queixa (nomeadamente dos pais), não haveria motivo para censurar a relação. Há quem defenda que se trata de uma bela história de amor. E há quem explore politicamente o caso, procurando diminuir o activismo político de Caetano Veloso (que apoiou Ciro e Lula) com acusações de pedofilia. Debates jurídicos e políticos à parte, só me interessam os factos: não há atenuantes, nem é minimamente aceitável que um homem de 40 anos tenha uma relação sexual com uma menina de 13 anos. À justiça o que é da justiça, sim, mas não é por não haver formalmente crime que devemos impedir-nos de um julgamento moral e ético.
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