O crescimento anémico da economia Portuguesa nas últimas duas décadas (1,2% em média desde janeiro de 1995, 1,8% em média se excluirmos a crise de 2011-2013) é atribuído pela maioria dos economistas a problemas estruturais que tornam as nossas empresas demasiado pequenas e sem escala que as permita serem competitivas no mercado internacional e os nossos trabalhadores pouco eficientes. E se os fundamentos para a crise recente são debatidos à exaustão entre os defensores de correntes económicas “rivais”, a análise sobre os problemas de fundo é relativamente consensual.

Os relatórios baseados em inquéritos a empresas sobre a competitividade da economia nacional, tal como o Global Competitiveness Report desenvolvido pelo World Economic Forum e o Doing Business do World Bank têm contado uma história em tudo semelhante: uma estagnação na competitividade da economia portuguesa na última década, marcada pela ineficiência da burocracia do Estado e da legislação fiscal, pela rigidez do mercado de trabalho e pela falta de capacidade de inovação, que se traduz, com a exceção do último ano, pela estagnação e até deterioração do ranking de Portugal nestes relatórios.

Esta realidade esbarra no entanto com a apreciação de várias organizações internacionais sobre as reformas que têm vindo a ser implementadas por Governos sucessivos em Portugal. A OCDE, que tem desenvolvido indicadores de regulamentação dos mercados homogéneos para vários países, aponta para uma evolução muito positiva no sentido da desregulamentação dos mercados de bens em Portugal. Segundo os dados mais recentes, numa classificação que vai de 0 a 4 e que representa uma ordem crescente de regulamentação, Portugal tinha 1,3 pontos em 2013, muito próximo da média da OCDE de 1,5. Os mesmos dados mostram que, depois da Polónia, Portugal foi o país que registou a melhoria mais significativa entre 1998 e 2013.

Na mesma ordem de ideias, o FMI e a Comissão Europeia têm escrito relatórios que retratam o esforço significativo que tem sido feito para reformar a economia nestes anos de crise, com mais ou menos sucesso.

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Como poderemos conciliar estes factos aparentemente antagónicos? A resposta encontra-se provavelmente numa combinação de fatores:

  • É possível que as reformas demorem tempo a surtir efeitos na economia, sobretudo no que diz respeito a algumas alterações tais como as do sistema educativo que têm tipicamente períodos longos de implementação. Ainda assim, a uma parte significativa das reformas, nomeadamente as que afetam diretamente os mercados tais como a redução da intervenção do Estado ou a simplificação da burocracia podem aumentar a eficiência da economia relativamente rapidamente.
  • As reformas realizadas poderão ter sido insuficientes para uma pequena economia integrada numa união económica e monetária em que o outros países avançaram tanto ou mais rapidamente do que nós, o que explicaria que Portugal se encontre sistematicamente na cauda da Europa nos indicadores de competitividade e atrás de muitos países em desenvolvimento. Isto implicaria que as reformas não são suficientes para nos tornar mais competitivos face aos nossos parceiros comerciais.
  • Alguns fatores específicos a Portugal poderão minar a eficiência das mudanças, tais como a existência de grupos/instituições que desvirtuam a natureza das reformas no momento da sua implementação.
  • A instabilidade de políticas económicas e sociais poderá ter tido um efeito negativo que contrapôs o efeito positivo das reformas realizadas. Segundo o último Global Competitiveness Report este fator é o quarto mais problemático em Portugal, à frente da corrupção ou da reduzida qualificação da mão-de-obra.

É neste enquadramento que surgiram em setembro duas notícias positivas no campo das reformas estruturais. Primeiro, um artigo Comissão Europeia refere que existem sinais de maior flexibilização da economia causados pelas recentes reformas estruturais, enfocando em particular a simplificação de procedimentos de licenciamento dos alojamentos turísticos, o pagamento de atrasados pelo Estado e o leilão de 4G LTE no sector das telecomunicações. Segundo, o Global Competitiveness Report de 2014-2015 mostra que Portugal subiu quinze posições no ranking global para o lugar número 36, devido sobretudo a melhorias na eficiência do mercado de bens e do mercado laboral.

Mas estas notícias necessitam de alguma análise crítica. No que diz respeito ao relatório da Comissão Europeia, a análise é limitada a apenas alguns mercados e as expectativas de ganhos para a economia são difíceis de estimar, tal como o reconhecem os próprios autores. Quanto ao Global Competitiveness Report, o salto coloca Portugal apenas na mesma posição que tinha antes de a crise estalar em 2007. No ranking global Portugal mantém-se na cauda da Europa.

Para melhorar a competitividade face aos nossos parceiros internacionais, é necessário continuar as reformas para a colocar o país pelo menos na mediana dos países europeus nos rankings internacionais. No entanto, a dificuldade em transpor as reformas realizadas nas duas últimas décadas em ganhos significativos para a população e para as empresas poderá conduzir a um cansaço das reformas, em que os políticos deixam de ter base eleitoral para alterar a estrutura da economia. Este cansaço já parece ter atingido as reformas de natureza orçamental. Resta saber se nos próximos anos existe margem para continuar a melhorar a competitividade da economia portuguesa através de melhorias à envolvente macroeconómica, sabendo que os nossos concorrentes internacionais não param de evoluir.

Inês Domingos é economista, fundadora e partner da Macrometria