João Miguel Tavares, com quem concordo mais vezes do que discordo, tornou clara a cisão na direita moderada, no seu artigo desta quarta-feira, no Público. Diz JMT: a direita 1 aceita o acordo com o Chega para ser governo. A direita 2 não aceita. JMT faz parte da direita 1. E tal como eu, embora por outras razões, considera que Montenegro deveria tornar clara a posição do PSD quanto a um acordo com o Chega. Eu faço parte da direita 2. Não aceito um acordo com o Chega. E explico.

Não tenho qualquer problema com André Ventura.

Tenho um problema com o Partido Socialista. O crescimento do Chega é directamente proporcional à paulatina destruição do nosso tecido económico e social, levada a cabo pelo Partido Socialista; pelo seu estatismo apropriador; pela sua infiltração da coisa pública; pela sua ascendência socrática, num aparelhismo desde então constante, feito dos mesmos homens de mão partidariamente promovidos, de adjuntos de adjuntos a secretários e ministros, e pela sua órbita de maridos, mulheres, familiares e amigos em colocações públicas e comunicantes portas privadas, ajustes e contratos.

Tenho um problema com o PSD de Rui Rio, o dirigente demissionário da oposição.

Tenho um problema com Marcelo Rebelo de Sousa, por quem tenho simpatia pessoal, pelo dano causado ao PSD, e ao país, com a sua aliança com o PS.

Da mesma forma que teria cabido ao centro esquerda ser o filtro da esquerda radical, e não foi, cabe ao centro direita ser o filtro da direita radical, seja ela apenas populista ou extrema. É aos moderados que cabe a responsabilidade do evitamento da polarização. E não é porque o PS enveredou pela senda oposta para ser governo que o PSD deve fazer o mesmo. O controlo do PSD deve ser interno ao invés de externo ou reactivo. As suas políticas devem decorrer da sua mundivisão.

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Claro que JMT tem razão quando diz que o PS é o maior perigo para Portugal. Vimos o que mais de vinte anos de governação fizeram ao país. Estamos em decadência e prestes a atingir o último lugar no grupo dos últimos – somos já pares da Roménia. Só isto, estruturadamente, é o suficiente para o combate político. Se àquilo somarmos a aniquilação da cultura pelo neo-marxismo cultural, a situação do SNS, do ensino, da CP, mais a perda da classe média e por fim a ausência de limites de que a TAP é, infelizmente, apenas o modelo, não há como não conduzir uma campanha vencedora.

Parece-me obrigatório saber que «não se dão argumentos ao inimigo», no caso, adversário político.

Uma aliança com o Chega é um argumento congregador das esquerdas. Vimo-lo nas presidenciais 1986. Após a vitória esmagadora de Freitas do Amaral na primeira volta, a esquerda, com a sua incontornável flexibilidade tacticista, encabeçada por Álvaro Cunhal, apelou ao voto em Mário Soares. Nas palavras inesquecíveis de Álvaro Cunhal: «vamos ter de engolir um sapo. Se for preciso, tapem a cara de Soares com uma mão e votem com a outra».

Dizer que era outro tempo, outras circunstâncias, eleições presidenciais e não legislativas, não altera um facto permanente: a flexibilidade tacticista da esquerda tem sido amplamente demonstrada, a geringonça foi a última prova desse amor táctico. E não haverá uma excepção nas próximas legislativas que se adivinham mais próximas do que presumíramos.

A direita democrata, liberal, aquela a que JMT chamou a direita 2, aquela a que pertenço, não se revê, neste caso, no discurso do «menor de dois males». Não é necessário. A escolha é entre um mal, a inevitável pobreza adornada de mentiras, e um esforçado bem, a construção de riqueza.

Em circunstância alguma as fibras democráticas podem ser comprometidas. São o nosso tecido civilizacional. Da mesma forma que não se combatem ladrões roubando, não se promove o Estado de Direito em rampas deslizantes.

A autora escreve segundo a antiga ortografia