Ninguém tem dúvidas: o PS apropriou-se das celebrações dos 50 anos do 25 de Abril. Como mostrou a nomeação de Pedro Adão e Silva para ministro da Cultura, o governo havia escolhido um “boy” socialista para presidir as celebrações do meio século da revolução portuguesa. Nada tenho contra PAS ser ministro, é uma ambição inteiramente legítima. Mas só há uma conclusão a retirar: a escolha do responsável pelas celebrações do 25 de Abril para ministro de um governo socialista significa a partidarização do aniversário do meio século da revolução.

O governo socialista poderia ter escolhido uma personagem independente, acima de ligações partidárias, empenhado na celebração de um feito nacional, dos portugueses, da sociedade civil, e não na transformação do 25 de Abril numa conquista do poder pelo PS. Mas o governo socialista não fez nada disso. Escolheu um dos seus. Na linha dos truques a que os socialistas nos habituaram, António Costa decidiu que PAS continuaria a ser o responsável pelas celebrações, apesar de também ser ministro. O seu “sucessor” estará sob a sua autoridade.

O governo vai celebrar o 25 de Abril como uma revolução que serviu sobretudo para fazer do PS o partido natural de poder em Portugal. Para os socialistas, a conclusão lógica da revolução é a “mexicanização” da política portuguesa com a consagração da hegemonia socialista. O 25 de Abril não foi feito para todos os portugueses, independentemente das suas preferências políticas e ideológicas. Foi feito para o PS mandar em Portugal. Os portugueses obviamente devem estar agradecidos pelo triunfo do socialismo.

Mas a “visão” do PS de Costa da revolução apaga um dos maiores feitos de Mário Soares. A recusa de celebrar o 25 de Novembro como uma data fundamental na construção da democracia pluralista e da liberdade política é um ataque à herança política de Soares. Mário Soares foi uma das personagens centrais do 25 de Novembro e da derrota da tentativa para estabelecer uma ditadura comunista em Portugal. Não há qualquer exagero em considerar Mário Soares como um dos “Pais” do 25 de Novembro.

Mas o PS de Costa tem que apagar o 25 de Novembro por causa da fantasia que derrubou o “muro” que separava os socialistas dos comunistas. Ora, Mário Soares foi um dos que ergueu esse muro, e ainda bem para a democracia portuguesa. Como mostra a guerra na Ucrânia, e a incapacidade do PCP de criticar a invasão brutal de Putin, o muro continua em pé, e bem alto. António Costa descreveu os massacres de Bucha como “actos bárbaros.“ Os aliados comunistas de Costa são incapazes de condenar a barbaridade. O PCP continua onde sempre esteve, ao lado dos ditadores. Se isso não separa partidos políticos, nada os separa.

Quem estava certo, Mário Soares a erguer um muro político com o PCP, ou António Costa a derrubá-lo? A resposta a esta questão coloca o 25 de Novembro no centro, ou fora, das celebrações da democracia portuguesa. É lamentável que Costa e PAS não queiram celebrar um dos maiores legados políticos de Mário Soares.

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