Quem segue a campanha eleitoral tem a perceção de que Portugal está sozinho no mundo. Ainda não ouvimos uma palavra sobre o papel do nosso país além fronteiras. Na mesma tónica, as grandes questões europeias que dominam a agenda política em Bruxelas – como o debate sobre a taxonomia verde que classifica o gás natural e o nuclear como fontes energias sustentáveis – não fazem parte do nosso léxico eleitoral.

Fica a sensação de que os possíveis acordos de governabilidade são o único tema que interessa aos eleitores, e que os grandes problemas que o nosso país enfrenta são resolvidos com descidas ou subidas marginais do IRS ou do IRC.

Se alguns dos desafios globais, tal como a emergência climática, são discutidos, já a sua resolução parece que se vai encontrar dentro das nossas fronteiras. A Comissão Europeia reconhece que os objetivos de descarbonização da nossa economia são ambiciosos, para não dizer impossíveis de alcançar dentro dos prazos estabelecidos, e adotou uma política pragmática e realista para enfrentar este desafio. Pretende financiar, mediante certas condições e garantias, a energia nuclear de nova geração, para acelerar a transição para uma economia neutra em carbono. Entre Paris e Berlim não existe, neste momento, questão mais fraturante. Em Portugal esta questão não é discutida. Talvez por não termos tradição nuclear. No entanto, isso é desconhecer que alguma da energia que hoje consumimos em nossas casas é comprada no mercado ibérico da eletricidade (MIBEL) tendo, por isso, origem nuclear. Talvez também se desconheça que a subida recente do preço da eletricidade em Portugal é, em parte, diretamente atribuível à paragem de reatores nucleares em França. Se o nuclear não for financiado pela Europa – mesmo que a construção em Portugal de um reator não esteja na agenda – a falta dessa fonte de energia vai ter repercussões, tanto na independência energética da Europa, como no preço da eletricidade em Portugal.

Seguindo a mesma lógica, nos 30 debates realizados não houve uma única menção à crise na Ucrânia. Ora, um conflito entre a Ucrânia e a Rússia teria repercussões inimagináveis para toda a Europa e para o nosso país, incluindo um potencial envolvimento das nossas forças armadas no terreno. Talvez fosse um serviço à democracia saber como os diferentes líderes dos nossos partidos pretendem lidar com esta questão. Quais as suas posições quanto à criação de um exército Europeu? E já agora, como interpretam o papel da agência Europeia Frontex na crise dos refugiados na fronteira da Polónia.

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Ainda se pode entender – embora que não o aceitemos – o argumento de que estas são questões supranacionais e, como tal, a sua discussão a nível nacional é inútil. Como se Portugal não tivesse uma voz ativa dentro da NATO ou da União Europeia para poder influenciar esta política. No entanto, existe um tema da nossa ação externa que é lamentável não ocupar um lugar de destaque no programa dos diferentes partidos: a Lusofonia. Esta é a única “arma” real no mundo globalizado que temos para exercer influência por este mundo fora. No entanto, aparentemente não faz parte das grandes prioridades dos nossos partidos. É um não-tema da nossa sociedade politica.

Esperava-se mais escrutínio e debate sobre o Plano de Recuperação e Resiliência que tanto ocupou a agenda nas autárquicas. Em Espanha, já se distribuíram grande parte dos fundos Europeus com 100% do PRR Espanhol com destino definido e com os governos regionais a ameaçarem processar o governo central por discriminação no tratamento diferenciado das diferentes regiões autónomas. Por cá, o nosso governo prometeu que já teria todos os fundos contratualizados por esta altura mas ainda não chegou a essa meta, por muito perto que esteja. Nem esse debate – com origem além fronteiras – parece interessar nesta altura.

Esta semana foi eleita Roberta Metsola como nova presidente do Parlamento Europeu. Da família Europeia do PSD e do CDS, desconhecemos o que os seus líderes pensam do plano de Roberta Metsola para os próximos dois anos. Na realidade, com a exceção do debate entre a Catarina Martins e o Rui Tavares, a Europa esteve ausente dos nossos debates.

Quando uma parte cada vez mais relevante das leis adotadas pela nossa Assembleia da República, para a qual vamos a votos dia 30, é resultado da transposição de diretivas Europeias para o legislação nacional e não se discute (ou menciona) o sistema onde essas diretivas são criadas, corremos o risco de não ter o escrutínio da população portuguesa num conjunto de temas essenciais para o seu futuro.